quarta-feira, abril 27, 2011

Tecnomelody, os Pubs e a Cultura Popular


 Aparelhagens e bandas de Tecnomelody lutam pelo reconhecimento como Patrimônio Cultural Paraense.
Por Diógenes Brandão

Esta é a segunda vez que trago prá cá minhas impressões sobre o Tecnomelody e suas conturbadas declaração dos defensores e inimigos do ritmo que se afirma cada vez mais com força no cenário local e nacional. A primeira postagem que fiz se deu quando Gaby Amarantos foi convidada para fazer parte da posse presidencial de Dilma em Brasília, no dia 1º de Janeiro deste ano, onde estive e tirei a foto (abaixo) da musa da galera.


Lendo alguns debates pautados na internet sobre a polêmico veto do governador Simão Jatene pela lei enviada pelo legislativo ao executivo para que o Tecnomelody seja reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado do Pará, resolvi meter o meu dedo sujo, neste lamaçal de hipocrisia.

Inexoravelmente, lembrei-me do Funk, do Carimbó e de outras manifestações da cultura popular que não contaram com análises de acadêmicos, nem tão pouco (precisa?) da rapaziada intelectualóide, reunida nos pub´s dos centros urbanos, a fim de divagarem sobre cultura e manifestações, tidas como fenômenos sociais por uns e baderna e barulheira por outros, gerando assim uma miscelânea de estereótipos e achismo que não tá no gibi.

Os Pubs de Belém e sua árdua tarefa de pensar a cultura popular pelas lentes de experts em goladas.

A semelhança entre os dois ritmos, que podemos dizer, distintos esteticamente em suas batistas e conteúdo das letras, mas com diferenças que não param por aí: ambos não são oriundos das culturas eurocentrista e ianque, por isso, indigesta por alguns setores da high-society paraoara e reverenciada por outra parcela, disposta a gastar em torno de R$ 5 mil à R$ 15 mil reais para equiparem seus veículos com estrutura de som e iluminação e ensurdecerem os desafortunados que cruzarem com estes mini trios elétricos por uma rua de Belém ou alguma praia ou praça do interior do Estado.

Cabe refrescar a memória dos mais jovens que a Dance Music também tem neste tipo de seguidor a mesma atitude, porém o ritmo não é questionado em sua racionalidade e conteúdo. Nas boates de Belém ou nas praias do litoral paraense, as batidas dos pick-ups trazem letras sem nexo (in English) e agitam os corpos em busca de diversão e esta segue para os mesmos mini-trio-elétricos, sem serem perturbados pelos cultos, quiçá analisados em teses blogueanas, no Facebook ou nos 140 dígitos do twitter.

Não vou me alongar falando da moda sertaneja que se alastrou feito a malária trazida por forasteiros para a Amazônia durante a abertura da transamazônica, nem do neo-forró e do neo-pagode, gêneros musicais que não recebem a locução de meu ouvidos. Quero focar nesta questão, que pra mim é agora mais importante: O que é patrimônio cultural imaterial, quem define? Quais os critérios? Os parlamentares estão preparados para defender, são legítimos para indicar, o governo, a academia possuem definições padronizadas? Estas sim, ao meu ver deveriam ser  indagações intelectuais para o debate salutar, sem paixões e produtivas para nossa identidade enquanto sociedade e sua relação transversal com os segmentos que a compõem.

Os ritmos combatidos por uma castra que goza de acesso à PC, faculdades e internet em casa, está pouco se importando se a fantástica mistura negra e indígena continue afastada, recruza à senzala, portanto, do ideal de cultura "superior".

Tal pensamento travestido de bom gosto e ordeiro oculta a miscigenação que  gerou os ritmos paraenses, estes que não são se quer conhecidos pela imensa horda de jovens acadêmicos e proponentes dos conteúdos transmitidos na mídia, o que é pior, pela associação de críticos em bares do Pará, servindo para estes, apenas como mero assessório retórico, quando querem rotularem-se como situados em “suas” raízes culturais, numa reinvenção da hipocrisia que impera sobre o Ver-o-Peso: o lugar mais homenageado por gente que nunca o frequenta como disse outro dia, o @lorodadoca.

Falar de cultura popular exige de seus emissores um respeito e estudo mais fundamentado. Não me basta ter nascido numa comunidade para proclamar-me conhecedor de todas as nuances que geram linguagens, signos e expressões dentro daquele tempo-espaço, sem correr o risco de negar-me ou afirmar algo, em detrimento de outros prismas, igualmente nativos deste lugar.

Fui criado e continuo na periferia de Belém, mas não vou dizer que já fui pichador eu, para justificar e fortalecer meu antagonismo à prática delituosa e condenar quem agora eu acho que suja e enfeia a cidade com esta manifestação só porque eu considero que é de mau gosto, feia, ilegal, e ponto final. Alguns dos melhores grafiteiros mundiais já foram pichadores e hoje tem como desdobramento de seu exercício e manifesto juvenil, o reconhecimento mundo a fora, como artistas contemporâneos.

Passei por vários modismos em minha adolescência, e por ter estudado meu primário todo em escolas particulares, posso dizer que reconheço um pouco o que determina o "bom gosto" dos filhos da pequena-burguesia com esta pobre visão colonial.

Se Sandy e Jr tivessem sido os inventores do tecnomelody, talvez o ritmo não reunisse tantos contrariados e o governador tivesse homologado o projeto transformando o ritmo em patrimônio e pronto (?), mas isso não basta para analisar com profundidade até que ponto a questão racial, social e o processo de afirmação de novos atores no mercado do entretenimento, interferem para o fomento de novos - e velhos - padrões comportamentais ditados pela indústria cultural e semeados no imaginário popular das massas pelos meios de comunicação.

Não é preciso ter frequentando a escola de Frankfurt para entender que o mercado dita conceitos, modela comportamentos e gera reinvenções estéticas com fins comerciais, se retroalimentando permanentemente da sinergia criativa dos grupos que inventam e reproduzem produtos midiáticos, originalmente pensados ou transformados nisto.

Para voltarmos a falar sério sobre esse lance de leis aprovadas na ALEPA e pelo governo de plantão, devemos saber que nesta semana, os deputados estaduais do Pará, em meio à um onda de denúncias de fraudes na casa, aprovaram requerimento de um de seus pares – um iluminado servo de deus - para que o “Louvor Norte” seja elevado à condição de patrimônio cultural paraense.

Cabe perguntar agora se o ti-ti-ti que rola no metiê pseudo-intelectual propagador deste debate, é mesmo sobre cultura, patrimônio, identidade ou pura e meramente gosto e perfil de música e/ou estilo de vida?

Ouço tecnomelody mesmo quando não sou obrigado a parar ou ficar próximo de algum lugar que este ritmo esteja sendo executado, já estive em festas onde ou toca-se o ritmo ou a festa fica sem público e acho que não tenho o direito de abafar a expressão e o exercício desta manifestação que  reflete os conteúdos nutridos por estes olhares sobre a realidade sociocultural de determinadas camadas da população, independente das classes sociais. A formação intelectual e cultural de cada um independe e ao mesmo tempo, paradoxalmente, está ligada a estas condições.

A hipocrisia provinciana gosta mesmo é de tecnodance e não admite.

Sou apoiador e entusiasta da campanha nacional que visa elevar o Carimbó como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro e ouço/leio muita gente que para bradar contra os demais, no púlpito do "intelecto-bar", diz que gosta do ritmo, mas nunca comprou um CD dos mestres que se mantêm vivos de tudo que é tipo de profissão, menos como músico. 
Mestre Verequete, ignorado por grande parte da juventude, deixou o legado da resistência da cultura popular através do carimbó, retratadado no Filme Verequete de Luiz Arnando Campos e Rogério Pereira.

Posso afirmar que a esmagadora maioria destas pessoas nunca foi para uma rodada de Carimbó, nem se quer, sabem dançar ou cantar o ritmo, no máximo, conhecem dois ou três refrãos de músicas do Pinduca, estas por serem veiculadas nas propagandas de TV, ignorando ilustres artistas paraenses como Mestre Lucindo, Cupijó, Verequete, Onete Gama e outros ainda vivos, graças ao seu labor em outras áreas, pois não tem o merecido reconhecimento.

Como se não bastasse, o Carimbó também era visto como um ato de rebeldia e manifestação dos bárbaros negros que começavam sua emancipação no final do século XVIII no Pará e o Funk ao fomentar crítica à omissão do Estado e denunciar os esquemas corruptos que se favorecem do crime como o judiciário e a política assim como a polícia, todos corruptíveis e mantenedores do status quo de miséria imposta por décadas aquele povo.

Assim como está acontecendo no Pará com o tecno-melody no Pará, o Rio de Janeiro se viu envolto a uma polêmica quando foi para aprovar o funk como patrimônio cultural. Setores da academia ecoaram em revistas, artigos de jornais e em programas de TV a reação das favelas cariocas ao sistema que lhe é imposto.

As letras do Funk predominantemente retratam a dura realidade à que vivem as comunidades dos morros cariocas e aqui o tecno-melody em suas letras traz um romantismo (piegas?) regado às interpretações de relacionamentos frustrados, platônicos ou mal resolvidos que misturado ao ritmo frenético e um estilo de dança incomum, fatalmente desagrada os olhares educados com outros gostos.

Por isso, ou não só por isso, ser crível que o funk, o tecnomelody, o Carimbó e os cultos afro-religiosos sejam venerados por esta rapaziada bem nutrida e notívaga que tergiverseia noite à dentro, seja nas faculdades, na web e nas tabernas de Belém é o mesmo que esperar que Karl Marx seja homenageado com uma estátua no epicentro de Wall Street.

À direita a Avenida Dalcídio Jurandir (nome na Placa) que perdeu o título que homenageava do ilustre escritor paraense, conhecido mundialmente, por um capricho da Assembléia de Deus para comemorar seu centenário de fundação.

Por fim, quero viver para participar de debates aqui em Belém que salientem a indignação e por consequência que haja alteração dos nomes de várias ruas de Belém que seguem como homenagens à militares assassinos, governantes corruptos e contraditoriamente ver personalidades como o escritor Dalcídio Jurandir terem a homenagem ao seu nome configurado como uma avenida recém-inaugurada e alguns meses depois serem usurpados do pequeno e importante gesto do governo do Estado em 2010, para render homenagens aos 100 aos da Assembléia de Deus no Pará, aprovado por (pasmem!) unanimidade na Câmara de Vereadores de Belém.

Onde está o debate sobre esse barulho ensurdecedor?

Siga-me no twitter. 
@Jimmynight.

terça-feira, abril 26, 2011

Um outro SINTEPP é possível

O blog da chapa CUT Socialista de Democrática, apresenta-se, através de uma de suas idealizadoras, Allana Souto, como uma alternativa petista para o debate interno da área da educação, com interface na área sindical e que mira, primeiramente, o debate e a mobilização dos setores petistas, que militam na educação, para depois a junção destes em prol de uma alternativa dos militantes da educação, sindicalizados ou não.

A forma como o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Estado do Pará - SINTEPP - vem sendo utilizado para cooptar educadores e estudantes para construir o PSOL, descontruíndo a história de luta do Partido dos Trabalhadores, suas experiências de gestão, bem como seus governos, parlamentares, lideranças, populares e sindicais, motivou o surgimento do grupo, que nasce orientado por militantes e dirigentes da DS - Democracia Socialista (grupo interno do PT, o qual é ligada a ex-governadora Ana Júlia), mas que planeja agregar outras tendências do Pará para disputar o segmento da educação, principal e prioritariamente, o SINTEPP, hoje hegemonizado pelo grupo que saiu do PT e fundou o PSOL.

 Leiam abaixo a última postagem do Blog Educadores-PA com o artigo da historiadora Allana Souto, que enviou o link para divulgação.

SINTEPP PARA QUEM?

Por Alanna Souto[1]
A definição de sindicato varia, de acordo com o tempo e as condições políticas, razão pela qual, para alguns estudiosos, o sindicato  é a coalizão permanente para a luta de classe e, para outros, é o órgão destinado a solucionar o problema social. Grosso modo, quando se pensa nesse tipo de organização, o que vem logo em nossas mentes: entidade que representa uma determinada categoria, que tem como uma das funções centrais representar os anseios e pluralidade política dessa categoria.
Contudo o Sindicato dos trabalhadores da Educação Pública do Pará (SINTEPP) comandado há mais ou menos 30 anos por um grupo político, que hoje se encontra no PSOL, já envelhecido em seu debate político e totalitário em sua forma de agir, vem ao longo desses anos fazendo uma política a qual representa única e exclusivamente seu próprio grupo, manobrando a comunidade de educadores e até mesmo alijando do processo membros da diretoria pertencentes á outras organizações políticas.
Atualmente o SINTEPP faz uma política condescendente com o governo do Estado, gerido por Simão Jatene (PSDB), pertencente a um dos grupos mais retrógrados do estado e do país, que sempre violentou a educação com sua perspectiva gerencialista e elitista de governar. Tal ação branda do sindicato pode ser vista quando deixa de cobrar com veemência a implementação do PCCR, que foi engavetado pelo atual governador e mesmo quando não reconhece os avanços educacionais de um governo popular, sob gestão do Partido dos Trabalhadores, que além da aprovação do PCCR na sua administração, investiu na formação e valorização do servidor público através da concessão de bolsas aos educadores da rede que estavam cursando mestrado e doutorado. Eram em torno de 129 bolsas (entre mestrado e doutorado) concedidas para o quadro, que passava ainda por uma seleção criteriosa. Hoje o governo tucano reduziu para a metade. Outra conquista democrática da gestão petista de Ana Júlia Carepa, foram as eleições diretas nas escolas, as quais foram suspensas pelo governador Simão Jatene. Pasmem! E qual a postura do SINTEPP ? Um estrondoso silêncio! É nesse sentido que podemos afirmar o quanto sindicato dos trabalhadores de educação pública do Pará, sob dirigencia do PSOL, tem feito linha auxiliar com a direita, por conseguinte com o governo dos tucanos.
É claro que o governo popular e democrático do PT teve inúmeros problemas na educação e dificuldades para saná-los, tendo inclusive que substituir o secretariado algumas vezes, justamente com objetivo da melhora e do avanço, todavia isso não anula todos os acertos, alguns já enumerados acima, no âmbito educacional, o qual o PSOL usando o SINTEPP tenta desgastá-lo por meio de métodos questionáveis e palavras caluniosas para denegrir a gestão petista em vez de cobrar politicamente com a mesma voracidade do governo tucano a continuidade dos projetos e ações da gestão anterior que são marcas de conquistas da categoria.
 Finalizamos este pequeno artigo levantando duas indagações provocativas para estimular o debate:
  1. Como o PSOL vem se mantendo no poder ao longo desses anos a frente do SINTEPP se atualmente a categoria não se identifica com seus representantes? Como já foi visto e proferido em muitas assembléias de educadores. Será ético o processo eleitoral? Há suspeitas de fraudes? 
  2. Por que o SINTEPP (ver o site da entidade), sob comando do PSOL, tem mais interesse em bater na gestão petista que no governo tucano, assumidamente direitista. Será algum acordo, visando às eleições municipais em 2012? Afinal o deputado estadual Edmilson Rodrigues do PSOL já se lançou candidato a prefeito de Belém e assim como os dirigentes “mores” do SINTEPP estão “pianinhos” quando se trata em exigir a implementação do PCCR: CALADOS, SURDOS E MUDOS.
Façamos a defesa e a luta pela retomada de um sindicato que, de fato, represente a categoria e toda sua pluralidade, adepta de uma liberdade de organização e expressão, guiada por preceitos de solidariedade, tanto no âmbito educacional quanto em outras áreas e categorias profissionais. Uma organização sindical de massa em nível máximo, de caráter classista, autônoma, ética e democrática.

[1] Atualmente doutoranda em História pela UFPR.

segunda-feira, abril 25, 2011

Gilberto Carvalho diz que, ao contrário dos partidos, movimentos sociais amadureceram

Por Luciana Lima e Ivanir José Bortoto na Carta Capital.


Brasília – Responsável por estabelecer a proximidade do governo de Dilma Rousseff com os movimentos sociais, o ministro Gilberto Carvalho, chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, disse que os movimentos sociais acabam compreendendo mais as demandas do país do que os próprios partidos políticos. Para o ministro, os movimentos amadureceram no Brasil nas últimas décadas e, ao contrário dos partidos políticos, investiram da formação de seus quadros. Carvalho defendeu a necessidade de uma reforma eleitoral no Brasil e apontou o voto em lista e o financiamento público de campanha como forma de mudar a atual realidade, que na sua avaliação induz à corrupção.
Confira mais um trecho da entrevista de Gilberto Carvalho à Agência Brasil.

Agência Brasil – O governo tem limitações para atender às demandas do movimento social por questões orçamentárias. Como administrar esse conflito?

Gilberto Carvalho – Essa tensão é inevitável. Eu brinco com eles dizendo que nós estamos sentados agora nesse lado da mesa, antes, estávamos no outro lado com eles, o que faz com que todos nós, oriundos do movimento social, esperemos de novo estar sentados do outro lado. Nosso destino é voltar para os movimentos sociais. Nosso papel aqui é tentar forçar a barra ao máximo dentro das limitações orçamentárias e institucionais para atender a essas demandas. Quando se faz o Orçamento, é preciso levar em conta esses aspectos. Aí é que está o jogo de governar, que é passar em grande parte pela sua filosofia, e por aquilo que se estabelece como prioridade.

ABr – E qual é a prioridade do governo?

Carvalho – Quando a presidenta escolhe como prioridade a superação da miséria, ela está dando um indicativo de que parte importante do Orçamento irá para esse destino. Isso, do ponto de vista ético, para nós todos que temos uma história política, é muito confortável. É também muito estimulante participar de um governo que estabelece essa prioridade. Há que se pensar em reproduzir, em espelhar no Orçamento essa opção. É claro que o Orçamento não é infinito e há gastos correntes que não se pode deixar de pagar. Mas tem que se reservar de fato um quinhão importante para isso. Isso não significa que vamos atender a todas as demandas, mas significa que muitas das demandas podem ser atendidas e, com isso, estabelecer pelo menos um compromisso, uma percepção da parte do movimento de que o governo tem a famosa vontade política de contribuir.

ABr – O senhor já observou essa compreensão?

Carvalho – O movimento amadureceu muito. Eu fiquei emocionado esses dias quando o pessoal da Fetraf [Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar] veio trazer uma pauta para a gente, o discurso da Elisângela [Elisângela Araújo, presidenta da Fetraf], companheira que hoje representa a Fetraf, que é um dos movimentos do campo de maior expressão. É um discurso que deixa emocionado de ver a maturidade. Eles não vieram reivindicar apenas terra, conforto nos assentamentos. São pautas muito mais amplas que dizem respeito, por exemplo, ao direito da mulher, à questão da criança, dizem respeito fortemente à questão ambiental. Enfim, a cidadania foi apropriada em grande parte, de forma muito intensa pelo movimento social. Isso é o resultado desse novo processo que a gente vive no Brasil, de amadurecimento dos movimentos. Acho isso muito bom. Isso facilita o diálogo. Eles passam a compreender também melhor.

ABr – Em que outros momentos o senhor conseguiu enxergar esse amadurecimento?

Carvalho - A conversa que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) teve com a presidenta foi extraordinária. Eles vieram discutir como podem ajudar no programa de alfabetização e no programa de reflorestamento do país, coisa que há 20 anos a gente, que é de movimento [social], sabe que não era assim.

ABr- O senhor diria que os movimentos se tornaram, por excelência, fóruns importantes de discussão dos mais variados assuntos ligados à cidadania?

Carvalho – Os movimentos fizeram uma coisa que os partidos não fazem. Eles qualificaram e seguem qualificando seus quadros. O MST tem uma escola que já funciona há muito tempo. Eles tomaram esse cuidado. A própria militância é um grande ensino. O velho método do bom Paulo Freire diz que se reflete a prática. Cada luta que se trava, se amadurece na cabeça. Os movimentos se tornaram verdadeiras escolas de cidadania. Ao se falar hoje em consciência ambiental, por exemplo, podemos considerar que, se Juscelino fosse construir Brasília hoje, não construiria, porque o pessoal não iria deixar passar máquina nesse Cerrado. É um amadurecimento benéfico do conjunto da sociedade.

ABr – O senhor comparou os movimentos sociais com os partidos. Fale um pouco mais sobre isso.

Carvalho – O que eu acho em relação aos partidos é que eles não cuidaram da formação de seus quadros da mesma forma que os movimentos fizeram. Isso é grave, mais do que grave, é gravíssimo. 

Nós temos uma estrutura política e eleitoral que é quase uma indução à perda de teor ideológico e político. Ela é uma indução, eu diria, até à corrupção, se nós falarmos da eleição. Qualquer cidadão hoje para ser candidato precisa de recursos para ser eleito. Onde é que ele busca esses recursos? Eu fui candidato em 1986 e ganhava três salários mínimos. Naquele tempo, a gente mantinha esquema de que dá para ser candidato com festinha, com lista entre amigos, com bingo, deitava e rolava de se trabalhar nessas coisas e se conseguia. Hoje, não, a campanha ficou cara. Eu fico pensando que às vezes se joga a pessoa nesse meio sem que haja uma preparação.

ABr – Era diferente em outros tempos?

Carvalho
– Eu tenho a impressão de que o enfrentamento à ditadura e aos governos neoliberais nos deram teor ideológico e nos fizeram mais resistentes a essas chamadas, entre aspas, tentações. Acho muito perigoso pegar um jovem hoje e colocá-lo em um partido, sem que haja uma preparação, o risco de ser cooptado por essa mentalidade é enorme. Não adianta a gente, hipocritamente, ficar condenando uma pessoa dessa, se a gente não a preparou.

ABr – O senhor acha, então. que os movimentos conseguem compreender melhor as demandas do país que os partidos?

Carvalho – Não quero fazer aqui uma dicotomia simplista. Tem muita gente nos partidos que tem essa visão generosa. Graças a Deus, temos ótimas referências. Mas, em termos de tendência, é exatamente isso. Os militantes dos movimentos são levados a uma visão mais generosa, porque é uma visão mais coletiva nos movimentos. Não se é induzido a uma carreira mais pessoal. A questão do poder não é visualizada de uma maneira tão pessoal. Nesse sentido, sim, dá para dizer que hoje os movimentos são laboratórios de gente de maior generosidade, de maior ação cidadã, no sentido mais amplo, do que nos partidos. Dadas as regras atuais.

ABr – O que é preciso fazer para mudar isso?

Carvalho – Pode ser diferente. Se, por exemplo, na reforma política a gente fizer um processo de eleição por lista e com financiamento público, vai se fazer uma indução ao contrário, uma indução ao coletivo. O sujeito, para ser candidato, terá que ter militância em partidos sérios. Em partidos picaretas, haverá pessoas que vão comprar lugar na lista também, não vamos ser anjos aqui, mas pelo menos, permite aos partidos que são sérios trabalhar internamente de tal maneira que o sujeito, para ter o lugar dele na lista, vai ter que trabalhar na militância, vai ter que ter base. Na regra atual, cada vez mais, se vai induzindo para serem eleitos os que têm mais alcance de mobilização financeira, o que é muito grave.

ABr – O senhor acredita que o financiamento público de campanha seria o antídoto contra práticas como o caixa 2?

Carvalho – É o antídoto. Não vamos ser ingênuos, pois sempre pode se ter abuso, mas pode também se ter uma fiscalização muito mais fácil. Primeiro, a pessoa não vai fazer campanha para ele e sim para a chapa dele. Isso já muda completamente a lógica. Se o teu partido tiver mais votos, você terá mais chances de ser eleito, portanto você vai fazer campanha pelo seu partido e o financiamento será coletivo também e não individualizado. Eu acho isso muito importante para dar um choque na atual mentalidade.

*Publicado originalmente na Agência Brasil.

Oficina de Prática de Cinema

sábado, abril 23, 2011

Dalcídio Jurandir e o descaso político para com a memória da literatura amazônica


No Blog Holofote Virtual de Luciana Medeiros


Avenida Dalcídio Jurandir
Há dois anos  coordenadores da Assembléia de Deus vem tentando obter homenagem estampada em via pública pelo centário da instituição a ser  festejado no  mês de junho. Como se pode ler neste link aqui, eles tinham duas alternativas a propor ao poder público.  Num atentado à memória da cultura paraense, venceu a pior.

A primeira ideia foi propor a abertura de uma "rua passando por dentro do terreno do Templo Central, ligando a avenida Governador José Malcher à rua João Balbi, no centro de Belém". A segunda era iniciar "articulação para a mudança do nome da avenida Dalcídio Jurandir, às proximidades da avenida Independência, para avenida Centenário". A segunda opção pelo visto foi a mais fácil de ser conquistada.
No dia 08 de abril, o escritor e jornalista Alfredo Garcia deu o alerta em seu blog Página Nua. Os vereadores, “em acordo conchavado”, decidiram trocar o nome da Avenida Dalcídio Jurandir (extensão da Av. Independência que vai da Rodovia Augusto Montenegro até a Av. Júlio Cesar), que homenageia o grande romancista brasileiro nascido em Ponta de Pedras, no Marajó, para Avenida Centenário da Assembleia de Deus.

Painel sua homenagem no Fórum de Letras da Unama, em 2010
“Justifica-se, naturalmente, a decisão dos senhores vereadores por dois fatos: a) Total desconhecimento de quem foi Dalcídio Jurandir, de sua importância para a história cultural e política do Pará; b) Desejo de agradar aos nobres integrantes da Assembleia de Deus, no que vai um nada louvável toque eleitoreiro na votação”. O texto completo você pode ler no blog do escrito, acesse aqui.

No dia 20 de abril, o poeta e contista Paulo Nunes, graduado em Letras (UFPA), mestre em Letras: Lingüística e Teoria Literária (UFPA) e doutor em Letras (PUC-MG), que atua nos temas:  Dalcídio  Jurandir, ciclo do extremo norte, Amazônia, aquonarrativa e literatura brasileira de expressão amazônica e literaturas africanas de língua portuguesa, também se manifestou sobre o assunto e comentou, em carta publicada no Jornal O Liberal (Caderno Cidades, seção Jornal do Leitor, pg. 8), a “decisão” parlamentar.

Vale ressaltar aqui outros atos desatentos para com a memória do escritor. No mês de março, pelo twitter, o cineasta Darcel Andrade, que tem trabalhos na região marajoara, informou que a casa que fora habitada pelo escritor em Cachoeira do Arari, sendo inclusive um ponto turístico marcante da cidade, ao lado do Museu do Marajó, em total estado de abandono começou a ruir.

Casa que pertenceu ao escritor, em Cachoeira do Arari
E assim foi. A parte da frente já está no chão e falta muito pouco até que ela desapareça para sempre. Em 2009, quando o escritor foi patrono da Feira Panamazônica do Livro, o governo do estado tinha iniciado um processo, via Secretaria de Cultura do Estado, de desapropriação da casa para ser transformada em Espaço – Museu Dalcídio Jurandir, mas por questão de valores  e outros fatores discutidos com a família do escritor, nada mais foi feito ou resolvido.

Pela importancia de sua obra, o seu nome dado à avenida, é mais que merecida. O centenário da Assembleia de Deus, que será comemorado em junho, não perderá brilho algum caso seja revista esta atutude, já que os coordenadores da festa deste centenário tinham outra alternativa para obter homenagem pública. Leia abaixo o artigo de Paulo Nunes, publicado no jornal O Liberal.

Vereadores e a triste Belém

O escritor
Dizem por aí: "cada povo tem o governo que merece". Não quero entrar no mérito desta questão. Mas desejo, cidadão que cumpre com suas obrigações (que não são poucas), protestar contra os desmandos dessa nossa terra empoleirada na pobreza, lixo, escuridão e miséria. E os políticos têm responsabilidade grande nesse processo. Eles se valem da anestesia geral e saltitam seus projetinhos pequenos e que nos deixam com os piores índices de desenvolvimento humano do país.

O despreparo e a escassez de bons propósitos fazem com que a gente ouça por aí que os políticos não pensam no bem comum, mas em seus objetivos mesquinhos, que esbarram na falta de ética e na ganância. Não exageremos. Há exceções. Mas há um problema tão sério quanto os que correm em boca pequena: a falta de compromisso de alguns políticos com a memória e a cultura do povo, este que teve como ancestrais os cabanos. Que barganhas levam os legis]ladores a leis tão estapafúrdias, a projetos estúrdios?

Os senhores vereadores de Belém - ó, quão mísera cidade! - acabam de decretar suas anorexias mentais. Em nome da demagogia, os representantes do povo alvejaram votos de numerosa fatia dos evangélicos (a Assembleia de Deus, diga-se, merece todas as homenagens pelo seu centenário, graças ao culto a Deus e ao bem que promove à humanidade) ao trocar o nome da avenida "Dalcídio Jurandir", um dos mais importantes escritores da América Latina, por "Centenário da Assembleia de Deus".

Livros escritos por Dalcídio
Queriam homenagear nossos irmãos cristãos? Por que não o fazem com criação de uma biblioteca pública, ecumênica e multirreligiosa, que seria plantada, por exemplo, no centro da esquecida Terra Firme? Já pensaram os senhores edis em trocar marginalidade e violência por "livros - tradicionais e eletrônicos - à mancheia" e investimentos sociais? E na entrada todos leríamos "Biblioteca Ecumênica Centenário da Assembleia de Deus", placa com os nomes dos autores e executores do projeto?

Dalcídio Jurandir, que era comunista convicto e ateu, era, entretanto, um dos mais respeitadores aos cultos religiosos, de qualquer cor e motivação. Se a religião é para o bem, pois que se faca dela algo que desaliene e ao mesmo tempo exalte a dignidade humana, pensava o escritor, conforme me disse, certa vez, seu filho, José Roberto Pereira.

Paulo Nunes
Belém-Pará

A Malhação de Judas - PSDB/PMDB na ALEPA

Analisando os nomes dos últimos presidentes da Assembléia legislativa do Pará, nos depararemos com o revezamente do PSDB e PMDB, aliados que juntos poderiam muito bem serem o rapaz aí, malhado pelos traços do mestre J.Bosco.



http://jboscocartuns.blogspot.com/

sexta-feira, abril 22, 2011

Todos os Capítulos e Depoimentos da Novela Amor e Revolução

Para quem não pode assistir ou perdeu algum capítulo, trago os links da Novela "Amor e Revolução" do SBT, que disponibilizados em seu site.

Trouxe para cá, para facilitar o acesso desta obra ficcional, porém importantíssima para esta e as futuras gerações poderem começar a compreender melhor o que significou os anos de chumpo trazidos pela ditadura militar no Brasil.



ALEPA agora é caso de polícia e de CPI




quinta-feira, abril 21, 2011

15 anos de impunidade do Massacre de Eldorado dos Carajás


Da Folha de São Paulo



Júlia Pereira da Silva, sobrevivente do massacre, em Belém
Foto: Tarso Sarraf/Folhapress


 

MINHA HISTÓRIA JÚLIA PEREIRA DA SILVA, 64

Não tiro o massacre da cabeça.


[Em Eldorado do Carajás, no Pará, policiais] soltaram bombas e todo mundo saiu correndo Aí senti aquele baque: pá! A bala já tinha entrado no meu pescoço. Fiquei tonta, mas continuei a puxá-lo [o marido] Hoje, quando vejo um policial, me dá ódio. Fica um trauma



RESUMO

Júlia Pereira da Silva, 64, levou um tiro no pescoço durante o massacre de Eldorado do Carajás, há 15 anos, e perdeu o marido. Francisco Divino da Silva não está na lista dos 19 sem-terra que morreram na rodovia PA-150, na curva do "S". Morreu meses depois, em Belém, no dia em que seria operado para tratar os ferimentos a bala.

FELIPE LUCHETE
DE BELÉM

Fiquei viúva sete vezes. Uns morreram de doença, um de acidente de carro, outro brigou na rua. O último marido foi o Francisco, que morreu por causa do massacre. Ele tinha 52 anos, a gente estava junto havia 12 e tinha uma filha adotiva de 9.

A gente morava em Curionópolis, perto de Carajás. Quando o pessoal do MST chegou procurando gente para fazer parte do movimento, fizemos o cadastro. Pagávamos aluguel e queríamos uma terrinha para morar.

Em 1996, fomos para a fazenda Macaxeira. Éramos mais de 5.000 pessoas, e as casas eram barraquinhas cobertas de palha. Eu assistia a todas as reuniões do MST.
Um dia, o movimento decidiu ir para Marabá e depois para Belém, pedir assentamento da fazenda.

Antes do massacre, tive o mesmo sonho três dias seguidos. Eu e meu marido atravessávamos de barco um igarapé. De um lado era água, do outro, só sangue.

Por isso eu disse que não queria viajar. Ele falou que eu precisava ir, porque tinha que me cadastrar para conseguir um pedaço de terra.

Fomos todos caminhando. Foi a primeira manifestação de que participei com o movimento. Chegamos na curva do "S" e montamos barracas. O coronel Pantoja disse que ia mandar ônibus para levar a gente para Belém.

BOMBAS E FACÕES

Começaram a chegar vários ônibus, até a rodovia ficar toda tomada, para não ter por onde passar. De lá, desceu um monte de policiais. Eles soltaram bombas e todo mundo saiu correndo.

Depois, começaram a atirar para todo lado, só tinha neguinho caindo. Uns quatro sem-terra tentaram ir para cima dos policiais, com facões e pedaços de madeira.

Mandei minha filha correr para o meio do mato. Meu marido tinha ido para longe de mim e, quando vi, ele tinha levado dois tiros.

Eu saí doida, gritando. Ele foi baleado na cabeça e na nuca, rodou e caiu. Na hora em que fui pegá-lo, levei muita pancada de cassetete, mas saí arrastando o Francisco para fora da estrada.

Aí senti aquele baque: pá! A bala já tinha entrado no meu pescoço. Fiquei tonta, mas continuei a puxá-lo para não deixar que acabassem de matá-lo. Pedi socorro, enquanto o sangue escorria.

Saí gritando por minha filha. Ela correu para o mato, com medo, dizendo que não era eu, era minha alma.

Me ajudaram a levar o Francisco para uma casa. Lá, dei banho e lavei a cabeça dele com água morna e sal.

No mesmo dia -fraca, ainda sangrando-, consegui carona para levá-lo ao hospital de
Curionópolis. De lá, ele foi para Marabá.

O Francisco ficou internado um tempo, até que o hospital falou que tinha que ir para Belém, não ia ter jeito.

Arranjei dinheiro para pegar ônibus até Belém e deixei minha menina na casa da minha irmã. Vim com meu marido deitado nas minhas pernas, ainda consciente.

Ele foi para a Santa Casa e morreu no dia da operação. Era aniversário dele.

Depois disso, fui operada no pescoço, mas ainda sinto uma dor que fica queimando.

Quando voltei para a cidade, minha filha não estava mais na casa da minha irmã. Minha sobrinha tinha colocado a criança para se prostituir e se juntar com um cara.

A menina ficou com esse homem e depois engravidou. Desde então, já teve oito filhos, de três pais.

Há uns sete meses, fui para Belém, porque nosso advogado pediu a presença dos sobreviventes. Dois dias depois que voltei para a 17 de Abril, que era a fazenda Macaxeira, o namorado da minha filha levou nove vagabundos para a minha casa.

Eles queriam matar um dos meus netos, porque tinham rixa com ele, e falaram: "Vamos levar tudo o que ela tem". Achavam que eu tinha recebido indenização do massacre, mas não.

Nesse dia, resolvi ir para Tucuruí. Lá moram seis filhos meus, de outros casamentos. Vivo com dois netinhos. Recebo pensão de R$ 304 e Bolsa Família de R$ 40 para um neto.

Não tiro o massacre da cabeça. Ele acabou comigo. Eu era bem forte, não magricela assim. Meu marido era muito bom, não faltava nada.

Hoje, quando vejo policial, me dá ódio. Sei que não são todos assim, mas eles me lembram aqueles do massacre. Fica um trauma.

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