sábado, maio 23, 2009

As cestas básicas fictícias de O Liberal

"Quantas vezes você mentiu hoje? (...) Para a psicóloga Oneglia Nazareth, a mitomania é uma tendência mórbida que desfigura o processo de comunicação, pois atinge tanto o emissor quanto o receptor da mentira'. (...) Para outra psicóloga, Cinthia Labratti, 'a mitomania é uma das características visíveis de quem sofre por não conseguir lidar com a sociedade'. (...) Segundo as especialistas, é possível perceber quando estamos diante de um mitômano devido às inconsistências do seu discurso." (...) Os maiores mentirosos revelados pela pesquisa de Jellison são pessoas com maior número de contatos sociais: vendedores, auxiliares de consultórios médicos, advogados, psicólogos e jornalistas. (grifo meu)"
Os trechos acima fazem parte de uma matéria publicada em O Liberal, edição de 19/04/2009, com o título "Hábito de contar mentiras é doença?".
Quase um mês depois a repórter esteve na superintendência regional do Incra de Belém à procura de informações sobre as ações da autarquia fundiária no Estado do Pará, no contexto de uma pauta sobre ações do governo federal, segundo explicou à assessoria de comunicação do órgão. Durante uma semana ela solicitou e obteve as informações desejadas. A matéria foi publicada no domingo (17/05), com o título "Incra doa 18,3 mil cestas para o MST"., sem a assinatura da repórter.
Causou mal-estar e indignação entre os servidores do Incra.
A matéria, no conjunto da edição de domingo, manifesta em toda a sua plenitude as concepções ideológicas e as correlações de forças existentes no contexto em que o Incra atua. É um primor de concisão das técnicas manipulatórias utilizadas pelos jornalões, amplamente analisadas pelos jornalistas Perseu Abramo e Aloysio Biondi em "Padrões de manipulação na grande imprensa" (Fundação Perseu Abramo; 2003) e Arbex Jr em "Jornalismo Canalha" (Casa Amarela; 2003), dentre outros.
A chamada de capa anunciava o tom da matéria - "Incra torra 44 milhões em comida para o MST - Instituto entregará este ano 220 mil cestas em áreas ocupadas ilegalmente no Pará". Na página 7 de Atualidades veio o título, em seis colunas, seguido do "olho", que dizia "Acampados - Dinheiro público é utilizado para pagar alimentação dos invasores".
O tratamento editorial dado à matéria deixa claro os objetivos do jornal: criminalizar os movimentos sociais rurais, principalmente o MST ( O Grande Satã), e de deslegitimar as políticas sociais do governo federal voltadas para o meio rural. A formulação tendenciosa do título, colocando o MST como único beneficiário de uma ação governamental, relacionada à contraposição dos termos "dinheiro público" e "invasores" do subtítulo indicam isso. E quem editou sabe perfeitamente que a maioria das pessoas lêem (ou vêem) principalmente os titulos e os "ollhos" da matéria.
E para os que não entenderam direito a posição do jornal (e a dos seus aliados) sobre os sem-terra, a página 4 do caderno PODER (!) põe por terra toda dúvida. Nela se encontra a sacrossanta voz do "agronegócio" paraense, o presidente da Faepa, Carlos Xavier. "Empresário condena invasões e saques", dizem no título, de seis colunas, Xavier e o editor de domingo de O Liberal. O olho arremata: "Campo minado - Dirigente da Faepa cobra cumprimento da lei para conter os sem-terra" (por que será que fizeram esse joguinho de palavras?).
No corpo da matéria, assinada por Keila Ferreira, o empresário analisa que alguns movimentos sociais não tem nada de social, que "querem impor uma composição ideológica para todos nós e, sobretudo, com desvios de recursos da sociedade de forma assustadora (grifos meu)".
Segundo ele, os sem-terra saqueiam, invadem, matam, roubam, arrassam com o desenvolvimento, atrapalham o desenvolvimento e chegam mesmo a ameaçar a força da imprensa. Ao final do texto descobrimos que é justamente por causa que os sem-terra fazem tudo isso que seus colegas de infortúnio da Associação Comercial do Pará vão lhe dar o prêmio de melhor empresário do ano.
Não entenderam ainda? Então voltemos à matéria da página 7 que, repito, não veio assinada pela Aycha Nunes. Ela começa assim: "O Pará recebeu durante o mês de abril R$ 3.735.732,96 em forma de cestos de alimentos. (...) 18.399 cestas básicas (distribuídas pelo Incra)". Segue-se uma ressalva, "A comida, no entanto, não alimentou nenhuma das 1.740 famílias que estão desabrigadas por causa das enchentes no Estado". Mais adiante vem um raciocínio matemático para se chegar à quantia exata desse desperdício anual, de R$ 44.828.795,52, posto que não serviu a nenhuma causa humanitária (o texto não afirma isso, no entanto...). A exatidão é para não deixar nenhuma dúvida quanto aos cálculos, respaldados por dados de pesquisa de uma entidade na qual se pode confiar: o Dieese.
Quem vai duvidar de tudo isso? Se os supostos dados foram repassados pelas assessorias e até o superintendente diz (com direito a foto de 4 colunas) que "Incra reafirma que mesmo os invasores têm direito de receber alimentos", (título secundário em seis colunas); e não só alimentos, mas todo um conjunto de ações para que continuem a atormentar os agroempresários. Dentre eles, servindo de exemplo (maniqueista) uma alma caridosa, de nome Ney Rocha, que "resolveu doar parte de suas terras", um benfeitor da reforma agrária, como tantos outros agroempresários (é uma nomenclatura nova...).
Onde estão as distorções? Está no valor de cada cesta e na suposta mensalidade de distribuição das mesmas, além de declarações retiradas de seu contexto. As cestas não são distribuidas mensalmente pelo Incra e nem têm o mesmo valor daquela calculada pelo Dieese.
O texto que segue, com esclarecimentos da superintendência regional do Incra no Pará (SR-01) sobre o que foi publicado, e enviado pela Ascom ao jornal, dá outras explicações que creio desnecessário repetir aqui.
Restou o silêncio de O Liberal sobre os esclarecimentos prestados, até o presente momento.
Daí volto ao início deste texto: - Quantas vezes você mentiu hoje?
Creio que ainda há tempo para debatermos sobre isso...
Herbert Marcus / Jornalista, Assessor de Comunicação da Superintendência Regional do Incra em Belém
PS: Durante a entrevista com o superintendente, a repórter Aycha Nunes indagou o porquê de utilizarmos a palavra ocupação em vez de invasão.
Queria complementar aqui a explicação dada pelo gestor da SR-01. Nós, os jornalistas que atuam nas assessorias de comunicação do Incra, entendemos que se trata, sim, de uma disputa ideológica no campo minado e de areias movediças das palavras, que é o campo semântico. Em cada uma delas há um campo de significados que expressam concepções diferentes quanto AOS OBJETIVOS E METODOS DAS REIVINDICAÇÕES dos movimento sociais, e das relações envolvendo as diferentes partes.
Para nós, ocupação tem a ver com legitimidade histórica dos movimentos populares em geral. Remete a dar trabalho; conquista de direitos através da organização e mobilização social. Invasão é o que faz, por exemplo, os EUA no Iraque, e o que já fizeram por muitos países afora. Uma apropriação pela força armada, ilegal, ilegítima e imoral. Invasão está relacionada a isso.
Um exemplo de disputa em que a filosofia perdeu a guerra é a palavra radical, que vem do latim radicare, raiz. Quem era radical "pegava" as coisas do mundo pela raiz, pelas causas. Isso se tornou tão subversivo e perigoso que tal sujeito foi transformado em extremista. Quando dizem que o MST ou o Islã é radical, querem dizer extremista. E assim ficou...
Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA
Superintendência Regional do Pará – SR (01)
Assessoria de Comunicação Social
Sobre matéria publicada na edição de domingo, 17/05, pagina 7 de O Liberal, sob o título "Incra doa 18,3 mil cestas para o MST", a superintendência regional do Incra em Belém esclarece que:
A repórter Aycha Nunes, de O Liberal, apresentou-se à Assessoria de Comunicação desta autarquia com uma pauta sobre ações do governo federal no estado do Pará, que incluía as ações do órgão fundiário.
Ao longo de uma semana, ela obteve dos assessores de comunicação das três superintendências regionais do Incra no Pará todas as informações solicitadas, inclusive em material impresso e digital com dados precisos sobre as ações do Incra Belém no período 2003-2008.
Em entrevista exclusiva com o superintendente, Elielson Silva, ela teve ampla liberdade para tirar todas as dúvidas sobre os critérios e normas legais adotados pelo órgão para pôr em prática tais ações.
Mas, apesar de todas as informações repassadas à repórter, a matéria publicada no domingo, de forma confusa, distorceu os dados apresentados e tirou do contexto as declarações do superintendente. A distorção começa pela manchete da matéria, que põe o MST como único beneficiário do programa Fome Zero, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (MDS) e executado pelo Incra em sua área de atuação. O maniqueísmo fica evidente - pretendeu-se criminalizar os movimentos sociais e tirar toda a legitimidade de uma política social, que visa, de fato, ajudar famílias que vivem em insegurança alimentar.
Em nenhum momento foi dito à repórter que o Incra distribui "mensalmente" cestas básicas às famílias acampadas. Não procede assim, a multiplicação feita pela reportagem para se chegar a "um investimento (anual) de R$ 44.828.795,52". Até porque a cesta básica, a mesma que vem sendo distribuída pelo governo federal aos desabrigados pelas enchentes no Pará, sai ao custo de R$ 45,00, bem abaixo dos R$ 203,04 calculados pelo Dieese.
O número apresentado à repórter, de 18.399, que consta no banco de dados da Ouvidoria Agrária Nacional, corresponde ao número de famílias cadastradas no programa Fome Zero através das Ouvidorias regionais do Incra, no período 2008/2009, e não ao de distribuição mensal de cestas básicas.
Tampouco os sem-terra são beneficiados pelas ações do Incra, de forma simultânea, como o texto parece sugerir. O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) tem como público-alvo jovens e adultos trabalhadores rurais; os que não estão inclusos na relação de beneficiários da reforma agrária acessam somente a alfabetização, enquanto os assentados têm direito aos cursos de nível fundamental, médio, técnico e até superior oferecidos pelo Pronera . Já o Programa de Documentação da Mulher Trabalhadora Rural, mais conhecido como mutirão da documentação, tem como público prioritário as mulheres do campo, que, segundo dados do IBGE, são as que mais padecem da sub-documentação.
Os mutirões, a exemplo do que o Incra/MDA vêm fazendo no Baixo-Tocantins e região do Marajó, atendendo comunidades ribeirinhas, são realizados em parceria com a Polícia Civil, Ministério do Trabalho, INSS, cartórios e prefeituras municipais. O objetivo principal é garantir os direitos básicos para a formação de um cidadão, através da emissão da documentação pessoal. E como não poderia deixar de ser, os mutirões também atendem os familiares dessas mulheres, que assumem cada vez mais o lugar de chefe de família, sejam elas e eles ocupantes ou detentores de alguma posse fundiária. Afinal, mesmo os sem-terra têm direito ao acesso à cidadania.
Talvez a inexperiência da repórter, aliada ao tratamento editorial dado à matéria, esteja na origem das confusões do trabalho jornalístico feito durante toda uma semana. Em todos os contatos mantidos ela não citou o caso do Sr. Ney Rocha. Se o tivesse feito, ficaria sabendo que a Ouvidoria Agrária do Incra, no cumprimento de seu dever institucional, intermediou o conflito entre o Sr. Rocha e as famílias que ocuparam a terra da qual ele se diz proprietário.
A intermediação incluiu a participação em reuniões realizadas na Vara Agrária de Castanhal, para se chegar a uma solução pacífica do problema. A partir da liminar de reintegração de posse, toda ajuda às famílias foi suspensa. Outro motivo foi a constatação de que a área, por ser pequena e situada em terras públicas do Estado, não corresponde aos critérios de desapropriação para fins de reforma agrária. Critérios, além de outros, explicados detalhadamente à repórter quando da entrevista concedida pelo superintendente.
Assim como o Incra não pode controlar a opinião do Sr. Ney e a do jornal, também não pode permitir que lideranças de movimentos sociais utilizem o nome da instituição. Se a Sra. Helena Gomes declarou que os ocupantes da área "recebiam do Incra tudo que precisavam", ela faltou com a verdade. Assim como o Sr. Ney, ao afirmar que "mesmo após a ordem judicial, os sem-terra continuaram recebendo apoio do Incra".
As ações do Incra seguem as orientações políticas de um Poder Executivo legitimamente constituído; estão balizadas nos preceitos constitucionais e sujeitas ao controle dos outros Poderes.
O Incra reafirma que continuará a cumprir a missão para a qual foi criado – a de promover a distribuição de terras com base na função social da propriedade; contribuir para a melhoria da qualidade de vida no meio rural e o desenvolvimento sustentável do país.
Belém, 19 de maio de 2009
Superintendência Regional do Incra no Estado do Pará (SR-01)

segunda-feira, maio 11, 2009

Lula Pivô da Despedida do Mino Carta?

O respeitável jornalista Mino Carta, despendido-se do seu Blog e dando um tempo da Carta Capital. Teria sido Lula foi o pivô?

Despedida

Quando escolhi o Brasil como lugar definitivo da minha vida, optei também pelo jornalismo. Existe uma indissolúvel conexão entre as duas atitudes. E explico. Até o golpe de 1964, fui jornalista com séria dedicação profissional. De alguma forma mercenário, no entanto.

Diga-se que, depois da renúncia de Jânio Quadros, em agosto de 1961, quando a pressão militar só permitiu a posse de João Goulart, sucessor constitucional, ao forçar a adoção do parlamentarismo, eu ficara de sobreaviso. Mas o golpe se deu também sobre a minha alma e motivou minhas escolhas definitivas.

Entendi que fosse meu dever praticar o jornalismo em um país submetido à ditadura imposta pela classe dominante com a inestimável ajuda dos seus gendarmes, e que se uma única, escassa linha da minha escrita sobrasse para o futuro, teria conseguido conferir um mínimo de importância à minha profissão. Faço questão de sublinhar que não agia desta maneira pelo Brasil, e sim por mim mesmo.

Quarenta e cinco anos depois, vivo uma quadra de extremo desalento, em contraposição às grandes esperanças alimentadas durante a ditadura. Logo frustradas pela rejeição da emenda das eleições diretas após uma campanha a favor que honra o povo brasileiro. Fez-se, pelo contrário, a conciliação das elites, nos exatos moldes previamente desenhados pelo general Golbery do Couto e Silva. A aposta do Merlin do Planalto estava certa e vale até hoje.

Fez-se a conciliação para eleger Fernando Collor e para derrubá-lo. E novamente para eleger Fernando Henrique Cardoso em 1994 e 1998. A Carta aos Brasileiros assinada por Lula foi uma tentativa de aparar arestas antes do pleito de 2002, aparentemente mal-sucedida, por ter convencido um número bastante diminuto de privilegiados. A conciliação veio depois da posse, a despeito do ódio de classe que até o momento cega a mídia.

A mim, que estou de olhos escancarados, a Carta convenceu por considerá-la sincera. Naquela época, não cansei de definir Lula como um conciliador desde os tempos da liderança sindical. No governo, contudo, ele foi muito além das minhas expectativas. Ou, por outra: deu para me decepcionar progressivamente.

O balanço de seis anos de Lula no poder não é animador, no meu entendimento. A política econômica privilegiou os mais ricos e deu aos mais pobres uma esmola. Há quem diga: já é alguma coisa. Respondo: é pouco, é uma migalha a cair da mesa de um banquete farto além da conta. O desequilíbrio é monstruoso. Na política ambiental abriu a porta aos transgênicos, cuidou mal da Amazônia, dispensou Marina Silva, admirável figura, para entregar o posto a um senhorzinho tão esvoaçante quanto seus coletes.

A política social pela enésima vez sequer esboçou um plano de reforma agrária e enfraqueceu os sindicatos. E quanto ao poder político? O Congresso acaba de eleger para a presidência do Senado José Sarney, senhor feudal do estado mais atrasado da Federação, estrategista da derrubada da emenda das diretas-já e mesmo assim, graças ao humor negro dos fados, presidente da República por cinco anos.

Outro que foi para o trono, no caso da Câmara, é Michel Temer, um ex-progressista capaz de optar vigorosamente pelo fisiologismo. Reconstitui-se o “centrão” velho de guerra, uma das obras-primas da conciliação tradicional. Enquanto isso, o Brasil ainda divide com Serra Leoa e Nigéria a primazia mundial da má distribuição de renda, exporta commodities, 55 mil brasileiros morrem assassinados todo ano, 5% ganham de 800 reais pra cima. E 2009 promete ser bem pior que pretendiam os economistas do governo.

Houve, e há, justificadíssima grita quanto às privatizações processadas no governo FHC. E que dizer do BNDES que empresta aos bilionários para armar a BrOi, a qual (é uma modesta previsão) acabará nas mãos de ouro de Carlos Slim? E que dizer da compra pelo governo de 49% das ações do Banco Votorantim à beira da falência?

Em um ponto houve melhoras sensíveis, na política exterior. E aí vem o caso Battisti. Até este serve ao propósito da conciliação, a despeito das críticas bem fundamentadas da mídia.

O ministro Tarso Genro disse em Belém que a favor da extradição de Battisti se alinham os defensores da anistia aos torturadores da ditadura, “com exceção de Mino Carta”. Agradeço a referência, observo, porém, que o ministro cai em clamorosa contradição. Não foi ele quem, em rompante que beira a sátira volteriana, sugeriu à Itália baixar uma lei da anistia igual àquela assinada no Brasil pelo ditador de plantão?

Talvez o ministro não saiba que enquanto no Brasil vigorou o Terror de Estado, na Itália houve uma gravíssima e fracassada tentativa terrorista de desestabilizar um Estado democrático de Direito estabelecido desde o fim do fascismo.

Se eu digo que o Festival de Besteira assola o País desde a época de Stanislaw Ponte Preta, e que se o ministro merece o Oscar do Febeapá, ao menos o professor Dalmo Dallari faz jus a uma citação, recebo as mensagens ferozes e as agressivas admoestações de centenas de patriotas. Pois não é bobagem (sou condescendente) dizer que na Itália dos anos 70 estava no poder um governo de extrema-direita, ou que se Battisti for extraditado, de volta ao seu país corre até risco de vida? Ou afirmar que Mestre e Milão, norte da península, são muito distantes, quando entre as duas cidades há menos de 200 quilômetros? Sem contar que, como me levam a observar vários frequentadores do meu blog, Battisti foi o autor do homicídio de Mestre e apenas o idealizador daquele de Milão.

Está claro que o ministro Tarso não erra ao dizer que a mídia nativa está sempre a agredir o governo de Lula, e contra esta forma desvairada de preconceito CartaCapital tem se manifestado com frequência. Ocorre que, ao referir-se à extradição negada a mídia está certa, antes de mais nada em função dos motivos alegados, a exibir ao mundo ignorância, falta de sensibilidade diplomática e irresponsabilidade política, ao afrontar um estado democrático amigo.

De todo modo, Battisti transcende sua personalidade de “assassino em estado puro”, segundo um grande magistrado como o italiano Armando Spataro, para se prestar a uma operação que visa compactar o PT e empolgar um certo gênero de patriotas canarinhos.

Isto tudo me leva a uma conclusão desoladora, embora saiba de muitíssimos leitores generosos e fiéis: minha crença no jornalismo faliu. Em matéria de furo n’água, produzi a Fossa de Mindanao, iludi-me demais, mea culpa
Donde tomo as seguintes decisões: despeço-me deste blog e, por ora, calo-me emCartaCapital.

Creio que a revista ainda precise de minha longa experiência profissional, completa 60 anos no fim de 2009. Eu confiei muito em Lula, por quem alimento amizade e afeto. Entendo que o Brasil perde com ele uma oportunidade única e insisto em um ponto já levantado neste espaço: o próximo presidente da República não será um ex-metalúrgico com quem o povo identifica-se automaticamente. Conforme demonstra aliás o índice de aprovação do presidente, cada vez mais dilatado.

Vai sobrar-me tempo para escrever um livro sobre o Brasil. Talvez não ache editor, pouco importa, vou escrevê-lo de qualquer forma, quem sabe venha a ser premiado pela publicação póstuma.

Há 121 anos atrás...

A Federação Internacional de Cineclubes (FICC), organização de defesa e desenvolvimento do cinema como meio cultural, presente em 75 países, é também a associação mais adequada para a organização do público receptor dos bens culturais audiovisuais.Consciente das profundas mudanças no campo audiovisual, que geram uma desumanização total da comunicação, a Federação Internacional de Cineclubes, a partir de seu congresso realizado em Tabor (República Tcheca), aprovou por unanimidade uma

Carta dos Direitos do Público

  1. Toda pessoa tem direito a receber todas as informações e comunicações audiovisuais. Para tanto deve possuir os meios para expressar-se e tornar públicos seus próprios juízos e opiniões. Não pode haver humanização sem uma verdadeira comunicação.
  2. O direito à arte, ao enriquecimento cultural e à capacidade de comunicação, fontes de toda transformação cultural e social, são direitos inalienáveis. Constituem a garantia de uma verdadeira compreensão entre os povos, a única via para evitar a guerra. 
  3. A formação do público é a condição fundamental, inclusive para os autores, para a criação de obras de qualidade. Só ela permite a expressão do indivíduo e da comunidade social. 
  4. Os direitos do público correspondem às aspirações e possibilidades de um desenvolvimento geral das faculdades criativas. As novas tecnologias devem ser utilizadas com este fim e não para a alienação dos espectadores. 
  5. Os espectadores têm o direito de organizar-se de maneira autônoma para a defesa de seus interesses. Com o fim de alcançar este objetivo, e de sensibilizar o maior número de pessoas para as novas formas de expressão audiovisual, as associações de espectadores devem poder dispor de estruturas e meios postos à sua disposição pelas instituições públicas. 
  6. As associações de espectadores têm direito de estar associadas à gestão e de participar na nomeação de responsáveis pelos organismos públicos de produção e distribuição de espetáculos, assim como dos meios de informação públicos. 
  7. Público, autores e obras não podem ser utilizados, sem seu consentimento, para fins políticos, comerciais ou outros. Em casos de instrumentalização ou abuso, as organizações de espectadores terão direito de exigir retificações públicas e indenizações. 
  8. O público tem direito a uma informação correta. Por isso, repele qualquer tipo de censura ou manipulação, e se organizará para fazer respeitar, em todos os meios de comunicação, a pluralidade de opiniões como expressão do respeito aos interesses do público e a seu enriquecimento cultural. 
  9. Diante da universalização da difusão informativa e do espetáculo, as organizações do público se unirão e trabalharão conjuntamente no plano internacional. 
  10. As associações de espectadores reivindicam a organização de pesquisas sobre as necessidades e evolução cultural do público. No sentido contrário, opõem-se aos estudos com objetivos mercantis, tais como pesquisas de índices de audiência e aceitação. 
Tabor, 18 de setembro de 1987

Que se dane o Norte/ Nordeste!

Recebi esta mensagem - com o mesmo título - por e-mail e aqui socializo para refletirmos.
O agravamento da situação de vulnerabilidade social vivenciado por milhares de famílias negras, por conta das chuvas que vêm castigando, sobretudo a região Norte/ Nordeste, não tem causado nenhuma comoção social. Incrível, que recentemente a nação mobilizou-se, a Imprensa fez campanha juntamente com multinacionais e instituições religiosas, motivadas pelo mesmo acontecimento quando o alvo foi Santa Catarina.
Mas, agora que a tragédia atinge o povo do norte e do nordeste, no máximo, se houve falar que a meteorologia prevê continuidade de intensas chuvas; verificam-se ponderações intelectuais acerca do impacto da ação humana na natureza, e as alterações climáticas conseqüentes.
O povo morrendo em desabamentos, famílias limitadas educacionalmente para acionar seus próprios direitos, outras, aptas a receber o irrisório valor de 150R$ de auxilio moradia disponibilizado pelos governos, centenas sendo afetadas por leptospirose em pleno temporal, enquanto Temporão, nosso ministro, potencializa maior atenção à gripe suína. Ainda do lado de lá, nossos senadores preferem discutir interesses previdenciários que afetam a categoria.
As chuvas são bem-vindas, contudo tem muita irmã e irmão desaparecendo sob o argumento exclusivo do efeito das enchentes. Ademais, a Defesa Civil atesta mais de 114.519 pessoas atingidas pelas chuvas no Maranhão; mais de 34 mil famílias no Amazonas; na Bahia, inúmeros municípios já decretaram situação de alerta/emergência.
Pelo visto, a chuva serve como a ‘divisora de água’ no debate político Pan Africanista. Porque se constata uma desatenção regional, tanto por parte da sociedade política como por parte da civil às regiões onde há prevalência de gente preta.
Eu fico a me questionar, como será possível vislumbrarmos outro modelo civilizatório baseado na unidade, solidariedade, igualdade e crença ideológica cujo alicerce objetive a superação das barreiras geográficas?
Bem, aqui na Bahia o Fórum de Juventude Negra, longe de uma postura assistencialista e de (des) responsabilizaçã o do Estado enquanto regulador das questões sociais começou a construir uma Campanha em solidariedade as pessoas desabrigadas, pois, mais que nunca, tais indivíduos estão tocados pelo efeito devastador do racismo ambiental e inoperância do Estado Brasileiro.
PS - Quem desejar participar desta Campanha pode colaborar, indicando artistas que se disponha de forma gratuita a entreter politicamente no evento que está em construção e visa arrecadar donativos.
Carla Akotirene - 071 8108/6339 * 8854/3034
Coordenação do Fórum Nacional de Juventude Negra/Ba
Articulação Brasileira de Jovens Feministas
Campanha Reaja ou Será Mort@

quinta-feira, maio 07, 2009

Priante: PMDB já rompeu com Ana Júlia

Com o mesmo título no Blog do Espaço Aberto.
O ex-deputado José Priante (na foto), presidente do Diretório Municipal do PMDB de Belém, defendeu claramente, em entrevista concedida ao blog por telefone, no início da noite de ontem (6), que o partido não apenas deve romper como já deveria ter rompido com o governo Ana Júlia (PT).
“O PMDB deve sair do governo Ana Júlia. Aliás, o partido já deveria ter saído e agora está perdendo uma grande oportunidade de deixar o governo. O momento é agora. É mais ético, mais digno, mais sensato sairmos do governo do que permanecermos nele e ficarmos reclamando”, disse Priante, que no momento se encontra em São Paulo (SP).
O ex-deputado externa uma insatisfação que é clara em vários– para não dizer em todos – os segmentos do partido, se é que o PMDB do Pará, dirigido com mão de ferro por seu presidente regional, o deputado Jader Barbalho, tem algum segmento que não esteja afinado com a direção da legenda.
A irritação que domina os peemedebistas em toda a estrutura partidária, vertical e horizontalmente, deve-se ao notório, progressivo e, ao que parece, irreversível esvaziamento do peso político que o PMDB detinha no governo Ana Júlia nos dois primeiros anos.
“Só temos empregos”
“O que nós ainda temos hoje no governo Ana Júlia? Temos empregos”, diz Priante, ironia à flor da língua. “Cargos, nós não temos mais. Eu falo por mim, mas acho que todo mundo, todos os peemedebistas, inclusive os que têm empregos no governo Ana Júlia, deveriam fazer como o Lívio e deixar o governo”, reforçou o presidente municipal do PMDB.
O Lívio mencionado por Priante é Lívio Assis, que já se afastou da diretoria-geral do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), conforme comunicou através de carta ao deputado Jader Barbalho.
Além de Lívio, todos os diretores do Ofir Loyola – a partir de seu presidente, o médico João de Deus -, indicados pelo PMDB, igualmente decidiram renunciar aos cargos, revoltados com o teor das conclusões de auditoria feita pela Auditoria Geral do Estado (AGE) que apontou vários problemas no hospital.
Priante avalia que a extensão desse esvaziamento político é suficiente para justificar que o PMDB adote uma posição compatível com a representatividade político-eleitoral que ostenta no cenário político do Pará. Se o PMDB virou um peso morto para o governo Ana Júlia, então é sinal de que o partido é dispensável e precisa procurar seu rumo, avalia Priante.
- E que rumos o PMDB, uma vez fora do governo, deverá buscar? – perguntou o repórter.
Priante riu do outro lado da linha. Riu, mas respondeu:
- O PMDB deveria deixar o governo e discutir o que pretende para 2010. Precisamos discutir se o partido, por exemplo, vai disputar o governo do Estado com candidato próprio ou não. Precisamos discutir alianças. E nessa discussão devemos considerar todos os partidos. Nenhum partido deve ser excluído dessas possibilidades. Mas acho, reafirmo, que é muito mais ético discutirmos isso fora do governo Ana Júlia. Quem sabe, se nós sairmos o PMDB será mais valorizado”, avalia o ex-deputado.
Priante, que disputou a eleição municipal do ano passado pelo PMDB e passou ao segundo turno na disputa com Duciomar Costa (PTB), que se elegeu prefeito de Belém, deu indicações de que a parceria entre PMDB-PT tornou-se apenas formal, aparente. E não é de agora.
“Veja o Duciomar. Na eleição do ano passado, ele estava eleitoralmente morto, mas acabou se reelegendo com a ajuda da Ana Júlia”, disse Priante, reafirmando seu ressentimento com o fato de o governo do Estado ter apoiado o prefeito petebista, muito embora o PT tenha fechado o candidato peemedebista no segundo turno.
Jader: sem compromisso com Ana Júlia
Antes de falar com Priante, o repórter conversou, também por telefone, com mais dois peemedebistas, ambos sem mandato eletivo, mas bastante afinados com a direção partidária.
Os dois pediram para não ser identificados, mas em essência externaram as mesmas críticas feitas por Priante ao governo Ana Júlia. “O partido, hoje, não tem mais nada no governo. Já abriu mão do Ofir Loyola, do Detran, da Santa Casa... Falta-nos apenas entregar a Cosanpa, a Secretaria de Obras e a Secretaria de Saúde. Mas essas duas secretarias também não valem mais nada. Na Secretaria de Obras, por exemplo, o orçamento é ridículo. Só temos dinheiro para construir microssistemas”, disse um dos peemedebistas.
Eles admitiram que, com o desembarque progressivo do PMDB do governo, é muito provável que a governadora Ana Júlia enfrentará seriíssimos problemas na Assembléia Legislativa. “Eles [os petistas] sabem que ficará ingovernável se o PMDB não se mantiver na base aliada. Mas é evidente que na prática essa aliança não mais existe. E na prática o Jader não tem mais compromisso político com o governo Ana Júlia. Na prática, é isso”, completou o outro peemedebista.

CPI da Saúde tem um Minerva

O Vereador Henrique Soares (PMDB) integrante da Comissão de Justiça da CMB, acaba de dizer no programa Alerta Geral, que seu voto - de minerva - à favor ou contra a CPI da Saúde, dependerá de seu partido pois é ele que este representa.
Deveria ter dito isso à população, antes de se reeleger, o nacional que já pulou do ex-PFL ao PSDB e agora alojado no PMDB, lança essa máxima de desprezo ao compromisso com os 4.895 cidadões/eleitores, que o mantiveram na casa da noca de Belém, como diz o poster do Quinta.
A grave situação da saúde em Belém, é tida como tranquila pela base aliada e o fisiologismo do PMDB não dá garantias de que tão cedo deixaremos de presenciar mortes por falta de atendimento e a precariedade no atendimento na capital.
Dudu, o prefeito assassino, surfa no cume da arrogância coloca seus cães de guarda para barrarem a possível CPI, entre eles o presidente fantoche Casrlos Augusto, mas teme e dissimula tranquilidade, como se alguma coi$a houve$$e feito para $ilenciar, quem por obrigação deveria fiscalizar e legislar à favor do povo.
Com execção dos Vereadores Otávio Pinheiro (PT) e Fernando Dourado (DEM), a Comissão de Justiça que é formada por cinco vereadores, dos quais, dois da falange aliada do prefeito falsário, votaram contra o encaminhamento do processo que pode abrir a CPI por dentro da comissão, o que foi determinado por decisão do Juiz Antônio Carlos Castelo Branco, mandando desarquivar o pedido de CPI da saúde na Câmara Municipal de Belém e encaminhá-lo à Comissão de Justiça.

terça-feira, maio 05, 2009

Glorioso São Sebastião de Cachoeira do Arari chega à Belém

Pelo 8º ano consecutivo, a irmandade do Glorioso São Sebastião de Cachoeira do Arari chega à Belém trazendo a imagem peregrina do santo do Marajó. A programação que se estenderá até o dia 10 de Junho, iniciou-se neste domingo (03/05) e pretende que a comitiva visite mais de 100 famílias, além de diversos órgãos públicos, personalidades empresariais, políticos e populares que aguardam pelo santo para prestarem suas homenagens.

Se depender do empenho da Irmandade que foi formada para dar suporte à programação que mistura religiosidade, devoção, a prática de esportes tradicionais e festa, e que parte do município de Cachoeira do Arari rumo à Belém, a recepção de permanência do santo será repleta de comoção e homenagens. Este ano, está sendo viabilizado através do Secretário de Esporte e Lazer, Albertinho Leão, que é devoto do santo, a recepção do santo pela maior autoridade política do nosso Estado, a governadora Ana Júlia Carepa.

Além das residências familiares, a imagem do Glorioso São Sebastião de Cachoeira do Arari, visitará diversos órgãos públicos entre eles: SEEL, SECULT, Fundação Cultural Tancredo Neves, IAP e IPHAN, órgão responsável pelo levantamento do inventário cultural que visa alçar a festa do santo como patrimônio Imaterial Brasileiro. Para tal, uma pesquisa realizada desde 2004, registra através de relatos, filmagens e fotografias tudo que envolve a tradicional festividade.

 A Festa

Todo mês de Janeiro é realizada a festa do Glorioso São Sebastião de Cachoeira do Arari, uma das mais importantes festividades do calendário cultural paraense. Com mais de um século de tradição. A festa, além de diversos turistas e personalidades, mobiliza os vaqueiros marajoaras para receberem as bênçãos das primeiras chuvas trazidas por São Sebastião, após o verão intenso que castiga os campos e por conseqüência a agropecuária, a principal atividade econômica do Marajó.

 

A Festividade do Glorioso São Sebastião em Cachoeira do Arari começa no dia 10 e se estende até o dia 20 de Janeiro, porém, desde o mês de maio do ano anterior a imagem do santo já inicia sua peregrinação visitando as residências dos cachoeirenses que moram em Belém.

 

A Peregrinação

 

Em junho a imagem retorna para o município de Cachoeira do Arari através de barco e na chegada banda de música e muitos fogos para ai então iniciar a peregrinação pelas propriedades rurais de Cachoeira.

 

No dia 15 de novembro saem os carros da cidade, conduzindo os homens e mulheres para cortar os paus na mata que depois servirão como mastros em outro ritual da festividade, sendo um total de três: o dos homens, o das mulheres e o das crianças. Estes mastros são preparados pelos respectivos padrinhos, que mudam de um ano para outro.

 

Somente no dia 09 de janeiro é que é rezada a última ladainha na fazenda Espírito Santo, para no dia 10 à tarde, ao som da banda de música, a imagem do Santo deixar a propriedade para ir ao encontro dos mastros que, trazidos pela população, após percorrer as ruas da cidade, reiniciam mais uma caminhada, desta vez até a praça da frente da cidade, onde em meio à multidão são hasteados com o auxilio de cordas e escoras. O mastro mais alto, o dos homens, chega a medir até10 metros de comprimento. Eles permanecem hasteados pelos 10 dias da festividade.

 

Esporte Marajoara é um dos destaques

 

Várias competições esportivas fazem parte da festa, como a Prova de Resistência de Cavalos, onde se destacam os da raça marajoara. Esta competição é organizada pelo Clube do Cavalo, uma associação de criadores que promove e incentiva esse tipo de esporte na região. A prova que reúne em média 40 animais sai da vila de Retiro Grande num percurso de quase trinta quilômetros até a entrada da cidade de Cachoeira do Arari. Luta marajoara, prova da argolinha e uma corrida de velocidade de cavalos completam as competições e, à noite, acontece a tradicional festa do vaqueiro espalhada por vários pontos da cidade ao som de muita lambada, carimbó, brega melody e merengue.

 

Diz a tradição que ninguém presente na festa pode ficar limpo e deve, obrigatoriamente, ser lambuzado com a lama sagrada das primeiras chuvas do ano trazidas pelo Glorioso São Sebastião. Os moradores locais praticam a luta marajoara durante todo o percurso, derrubando uns aos outros no chão para serem lambuzados. A bebida típica da festa é o leite-de-onça, um preparado a base de leite de búfala.

 

Patrimônio Imaterial

A UNESCO define como Patrimônio Cultural Imaterial "as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas - junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural."

O Patrimônio Imaterial é transmitido de geração em geração e constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana.

Os requisitos para obtenção do registro de Patrimônio Cultural Imaterial estão previsto no Decreto n° 3551/2000, regulamentado pela Resolução n°001/2006.

Encontro

Dia 31 de Maio haverá um encontro de confraternização da Colônia Marajoara em Belém, que será realizada na ARCO – Associação recreativa dos Correios, às 12h.

Maiores Informações e convites tratar pelo 3241-8634 com Ademar Feio.

quinta-feira, abril 30, 2009

Aos que não tem História

Escrevo este texto sem nenhum ressentimento, mas com profunda tristeza, primeiro porque, de imediato, penso mesmo que nem deveria fazê-lo, desgastar o meu pensamento com reflexões sobre temáticas como esta, que me causam mais que náusea e contra as quais sempre me manifesto, sejam em tentativas formais filosofias por escrito, sejam em imprecações verbais, entretanto, menos pela tristeza - pois que esta também nos ensina -, e muito mais pelo pensamento, digo pela preservação do verdadeiro e corajoso pensamento, não posso me permitir apenas a observar o estado das coisas, sem que eu me indigne.
Há um massacre físico e ao mesmo tempo intelectual contra a Amazônia, há seres humanos que renegam a própria História, mas, se por um lado, eles deixam de ser o que são, já que perdem de vista as suas reais perspectivas de construção de identidades, por outro lado, nem por isso a História deixará de ser o que é com a sua inexorável tempestade a destruir estes vales desalmados do conhecimento.
Este massacre contra a Amazônia, portanto, se escreve nas linhas e entrelinhas acadêmicas e mediáticas e são fortalecidas, pois que financiadas, por um ciclo industrial cultural que corrobora para uma tentativa histórica de aniquilar todo e qualquer pensamento, toda e qualquer forma de resistência amazônida.
Nós, amazônidas, sabemos muito bem o quanto é sacrificante afirmar e preservar as nossas tradições contra discursos e práticas pressupostamente híbridos, mas que, por trás das máscaras desta contemporaneidade, utilizam-se das publicidades e dos apoios empresariais e governamentais para piratear e institucionalizar – silenciar – as produções artísticas e culturais das comunidades periféricas. Algumas vezes esta nossa ousadia é mesmo paga com a própria vida.
Não vou defender aqui nenhuma política de cotas para a arte amazônida – para que não me chamem de preconceituoso e bairrista, entretanto, chamo a atenção para uma histórica discriminação contra todas as formas de manifestação artística e cultural que não tencionam e (algumas) se recusam a aderir às tendências preconizadas pelo espírito contemporâneo.
Lamentavelmente, portanto, é na Amazônia onde podemos identificar tais fenômenos com maior clareza. Há neste lado do país uma vasta produção imagética que não é respeitada como documento audiovisual pelos que deveriam formular opiniões. Falo de jornalistas e de produtores de mídia, a maioria dos quais articulados a espaços institucionais e empresariais, necessariamente, ao serviço de políticas e linhas que se recusam a reconhecer e a dar valor ao que é produzido na Amazônia, motivo pelo qual eu cheguei a manifestar por escrito o meu incômodo pelo fato de uma empresa do rio de Janeiro estar a organizar os cineclubes do Maranhão, do mesmo modo que critiquei, por exemplo, que um americano tenha conquistado o grande prêmio do AmazôniaDoc com o apelativo tema da Irma Dorothy.
Com todo respeito a quem quer que seja de fazer/filmar o que quer que seja onde quer que seja, nós, amazônidas – e escreverei este trocadilho com todos os riscos e conseqüências daí advindas – não precisamos de heróis americanos (e nem de cariocas e mesmo paulistas).
Independentemente do interesse que tem o tema e da forma de abordagem do mesmo, há que ser evidenciado que nós amazônidas temos uma tradição de produção de imagens sobre este e outros temas, entretanto, estas imagens não adquirem o status de cinema, de documentário, de audiovisual ou de qualquer que seja o conceito definido de forma convencional por esta comercial indústria cinematográfica, que aceita este filme americano, com todas as chances de promoção pela indústria cultural nacional, com direito a comentários e resenhas críticas em cadernos culturais, num grande esquema de produção global (sem trocadilhos), coisa jamais facilitada para os realizadores amazônidas, que, por sua vez, na contramão da história oficial, vem escrevendo a HISTÓRIA desta terra, a partir de mitos e arquétipos enraizados nas realidades das populações locais,a partir da perspectiva e dos conhecimentos populares destes mesmos povos, que têm eles próprios que ter o direito de construírem as suas identidades artísticas, sob quaisquer formas em que estas sejam manifestadas.
Se os cariocas tem direito de organizar Cineclube no Maranhão e se os americanos têm direito de produzir filma na Amazônia, penso ser demasiado justo que os amazônidas tenham também direitos de produzir/preservar as suas imagens, os seus filmes, os seus cinemas, as suas produções imagéticas, indispensáveis aos processos dinâmicos de construções e de afirmação de seus conhecimentos, saberes, magias e artes.
PS: A VALE vem produzindo anúncios no DIÁRIO DO PARÁ – um dos balcões-de-negócios disfarçados de jornal tal qual é O LIBERAL. E nestas publicidades, há uma tentativa descarada de associar a imagem destas duas empresas ao apoio à cultura popular, a exemplo de todas as empresas e instituições que se apropriam dos signos da arte e da cultura popular, sem que as comunidades produtoras desta arte e desta cultura recebam o que quer que seja em troca desta manipulação e usurpação.
© Francisco Weyl Carpinteiro de Poesia e de Cinema

segunda-feira, abril 27, 2009

Aplicação Liberal

A Queda
À Dra. Mary Cohen, Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/PA. Senhora Presidente, Li o artigo do advogado Paulo Barradas, que se auto-intitula vice-presidente dessa Comissão de Direitos Humanos, publicado no jornal “O Liberal” do dia 25 de abril do presente ano, denominado “o Pará em clima de guerrilha”, abordando o clima tenso envolvendo o MST e proprietários rurais no Pará, deixando claro que estavam “de um lado, o MST – que existe com o único objetivo de cometer o crime do art. 161, inciso II do Código Penal (esbulho possessório) – e, do outro, os proprietários rurais que pagam impostos, produzem riquezas, fazem circular impostos, produzem, fazem circular produtos e criam empregos”. Enfim, de um lado os bandidos, de outro, os mocinhos.
No desenvolvimento do artigo, o advogado continua com seu pensamento contrário ao movimento dos trabalhadores, inclusive fazendo sérias acusações contra o mesmo tipificadas como crimes, o qual pode ser responsabilizado por isso.
Segue com outros argumentos - reacionários e conservadores - criminalizando o MST, taxando o Estado do Pará de omisso e, claro, exaltando os grandes proprietários de terra.
Senhora presidente, não vou perder meu tempo contradizendo esse cidadão – já que encaminharei um contraponto ao próprio jornal, inclusive ressalvando o respeito aos verdadeiros produtores deste Estado, no qual se enquadram alguns proprietários de terras.
Por oportuno, ressalto que ele – o advogado - pode, e deve, expor seus pensamentos, mesmo que não concordemos com eles. Contudo, dou-me o direito de não conviver na mesma Comissão de Direitos Humanos com esse profissional, que prega o oposto do que se propõe - ou deveria - uma Comissão desta natureza, ou seja, efetivação da reforma agrária, justiça social e defesa da função social da propriedade.
Diante disso, solicito que essa Comissão de Direitos Humanos tome todas as providências para afastar o advogado Paulo Barradas da mesma. Caso isso não ocorra, inclusive por questões regimentais, até o dia 1º de maio, considere-me excluído irremediavelmente desta respeitável Comissão, tão bem honrada com a sua presidência. Atenciosamente, Walmir Brelaz
Membro da CDH-OAB/PA
O coice....
Querido Walmir, Somente agora, 1h15minutos do dia 27 de abril, vi sua mensagem. Acabei de chegar da DRCO, onde, juntamente com o Marco Apolo (SDDH), estava acompanhando os 18 trabalhadores do MAB – Movimento dos Atingidos pelas Barragens e da Associação dos pescadores, que chegaram presos em Belém após uma operação comandada pela polícia estadual e o Ministério Público do Estado, na sede da Eletronorte, no Município de Tucurui.
Primeiramente, quero lhe dizer que fiquei surpresa com o fato de o colega Paulo Barradas estar escrevendo como se vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos - CDH da OAB fosse, não só porque o cargo é ocupado por você, conforme pode verificar no sitio oficial da OAB, como, também, porque sequer integra a comissão.
Registro que o Barradas é um colega por quem tenho carinho, até porque fomos contemporâneos no Curso de Direito. Todavia, temos posições ideológicas diferentes. Penso que, diante dos objetivos da comissão e do compromisso de defesa dos direitos humanos, falta-lhe o necessário perfil para integrar tal colegiado, sobretudo no formato atual, que, desde 2003, a partir do segundo mandato do advogado Ophir Junior, passou a trabalhar para resgatar a importância da comissão concebida em 1984, na gestão do presidente Ophir Cavalcante, sob o comando do advogado José Carlos Castro, mestre e amigo dileto, prosseguindo agora sob a gestão da advogada Angela Sales, que tem se destacado por uma gestão democrática e compartilhada na defesa da dignidade da pessoa humana.
Com relação ao artigo, confesso que ainda não o li, mas desde já deixo claro que a CDH respeita a opinião dos colegas que divergem da política de direitos humanos adotada, quer pela Seccional do Pará, quer pela CDH Nacional, esta, sob o comando do advogado Cezar Brito, grande defensor das causas populares, mas não poderá admitir a utilização do seu nome para veicular idéias contrárias à política de defesa da vida e da dignidade.
Quanto ao trabalho da comissão, quero registrar que tê-lo na comissão é uma honra, pois sei que a defesa dos direitos humanos tem pessoas certas, como você, o Batista, a Celina, a Rose, a Valena e tantos outros, para quem é uma opção de vida, muito mais do que uma opção política.Tenho certeza de que vamos prosseguir juntos, para a honra da OAB/PA, instituição promotora e defensora dos direitos humanos.Espero ter esclarecido o episódio, pedindo a você que continue a somar conosco.
Fraternalmente, Mary Cohen
Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PA.

sexta-feira, abril 24, 2009

Lei Rouanet: a cultura como marketing e negócio

Dafne Melo da Redação da Carta Capital “A pobreza do imaginário definido por uma arte que não tem perspectiva crítica condena as relações sociais à impossibilidade de cidadania”, alerta Marco Antônio Rodrigues, diretor e autor teatral e um dos fundadores do grupo Folias d'Arte, de São Paulo. Para ele, é exatamente esse o cenário cultural do Brasil de hoje, em grande parte, acredita, é decorrente da manutenção do modelo de financiamento da Lei Rouanet, sancionada em 1991.  Em entrevista ao Brasil de Fato, Rodrigues critica o paradoxo da Lei "que desmentiu a velha ladainha de que somos um país com muitos problemas sociais mais urgentes do que a promoção cultural. Taí pra todo mundo ver: um bilhão de reais são reservados anualmente à renúncia fiscal. Seria muito dinheiro, se bem aplicado, daria pra fazer uma revolução gigantesca". Confira a entrevista abaixo:  Brasil de Fato - A Lei Rouanet foi sancionada em 1991, durante a gestão Collor. Qual era o objetivo daqueles que a implementaram? Marco Antônio Rodrigues - A lei Rouanet é filha de uma outra lei de incentivo implementada no Governo [José] Sarney por ninguém mais ninguém menos que Celso Furtado, então ministro da Cultura daquele governo. A memória que tenho da Lei Sarney é que, embora se apoiasse no mesmo falso princípio de que é possível mobilizar o empresariado nacional para algum objetivo nobre que não seja a obsessiva perseguição do lucro, ela era mais democrática.  Era possível, por exemplo, participar de um projeto cultural com serviços, com produtos, enfim, não ficava reduzida a destinação de recursos financeiros. Também não eram necessários lucros astronômicos para que o incentivo fiscal tivesse qualquer efeito, de forma a interessar pequenos empresários na aplicação da Lei. Pensava-se, que num eventual processo de aperfeiçoamento, a Lei poderia ter efeitos comunitários, fazendo com que, por exemplo, o comércio local participasse da "produção" de um espetáculo, cedendo materiais, apoio e até dinheiro, podendo abater do pagamento de seus impostos. Bem, talvez a memória me traia e eu esteja tendo um delírio polianesco.  Qual era o objetivo do Celso Furtado ao elaborar a lei? Acredito que o Celso Furtado, percebendo a dificuldade que teria para conseguir mais recursos orçamentários diretos para a Cultura, optou, à época, por uma estratégia indireta e de longo prazo. Acreditava, que com o tempo, se criaria um ambiente de exuberante produção artística, que acabaria por pressionar um quadro em que não houvesse saída política para a manutenção vergonhosa de uma participação tão ínfima da cultura na vida nacional. Quadro que aliás permanece, a despeito destas supostas boas intenções (interpretação minha) do mestre Celso Furtado.  Como foi a mudança com o governo Collor? Collor, como sabem todos, entrou rasgando. Aliás, os primeiros órgãos a serem destruídos foram aqueles da cultura: a Fundação Nacional de Artes Cênicas, a Funarte, enfim, terra arrasada. Acabou com o cinema nacional. E como era o rei da moralidade, atingiu de cara a Lei Sarney, inventando no seu lugar a Lei Rouanet, que entrega ao empresariado os destinos da produção artística e da cultura nacional. Acabou com a Lei Sarney dizendo que havia muitas distorções na sua aplicação, com gente se locupletando com os recursos da renúncia fiscal. O discurso pegou fácil, como qualquer discurso pretensamente moralista, policialesco e de retórica revisionista pega desde sempre, à direita e à esquerda.  O escopo da Lei Rouanet é o seguinte: só podem se beneficiar dela as empresas que pagam imposto de renda pelo regime de lucro real. Ou seja, os grandes lucros. Estão excluídas as empresas que pagam imposto por lucro presumido ou lucro arbitrado, ou seja, de lucros menores. Também se excluem benefícios sobre operações de capital, vendas de empresas, impostos sobre heranças. Apenas o lucro real: grandes corporações, bancos e etc.  É claro que os artistas que têm poder de acessar estes recursos são também os mais conhecidos, com projetos sem qualquer perspectiva crítica. Ou seja: matou vários coelhos com uma porrada só: agradou as estrelas, que até hoje se mobilizam para manter intocados os seus privilégios, agradou a empresa que o levou à presidência da república, a famigerada Rede Globo e outras mídias em geral, agradou as grandes empresas e seus diretores de marketing que têm mais poder na formulação de políticas de fomentos às artes do que o próprio presidente da república.  Para não falar dos ministros da cultura que, desde aí, são apenas fantoches na manutenção desta política pública de cunho fascista, privatizante e altamente alienada. Por último, fomentou a organização das grandes fundações, tipo Roberto Marinho e Itaú, que sendo as maiores captadoras, legitimam uma operação política que transfere recursos públicos de um bolso para o mesmo bolso, camuflados por uma aparência de preocupação cívica e cultural. Goebbels vira no túmulo de inveja.     Na sua opinião, quais são as maiores problemas que esse modelo de financiamento traz? A maior distorção é que este modelo atravessou os governos ditos democráticos de Fernando Henrique Cardoso e Lula sem nenhum retoque. No atual governo houve algumas tentativas pontuais de maquiagem da lei, que foram imediatamente soterradas pela resposta imediata das organizações Globo.  Celso Frateschi, ex-presidente da Funarte, caiu, na minha opinião porque sinceramente tentou fazer com que a Lei fosse, digamos, submetida a controle público. Uma reportagem no Jornal O Globo sugerindo prevaricação foi o suficiente para que o ambiente em que trabalhava ficasse infernal levando-o à renúncia.  Ou seja, a maior distorção é que da direita mais canina à esquerda mais radical (se é que isto ainda pode se aplicar como adjetivo) a visão sobre cultura é a mais provinciana, estúpida e leviana que se pudesse imaginar. É um beco quase sem saída porque a compreensão da sociedade, ou das forças sociais mais progressistas é exatamente igual: para elas, cultura e produção artística é uma matéria cosmética que deve ser tratada da forma mais subalterna possível.    É possível, por meio dessa reforma na lei, melhorar seu funcionamento, ou ela tem um problema de fundo e deve ser extinta? Na minha opinião, a única forma de ser realmente funcional é que metade do bilhão de recursos destinados ao incentivo fiscal por ano, constituam um fundo público regido por editais com participação, em seu julgamento, dos setores organizados da sociedade civil. Segundo, que o empresário arque com parte dos recursos, não como funciona agora, onde o recurso utilizado é exclusivamente público. Terceiro, que os recursos captados pelos que se beneficiam deste estelionato legalizado sejam submetidos a controle público: ou seja, qual a relevância do projeto para a sociedade? Tem qualidades artísticas? Necessita realmente do dinheiro público ou não passa de uma jogada mercadológica espúria, como a primeira temporada do Cirque du Soleil no Brasil que captou nove milhões de reais pela Lei e vendeu seus ingressos a razão de duzentos reais? Quarto, que o dinheiro captado pague um pedágio de pelo menos vinte por cento ao Fundo Público que será destinado a projetos que não têm instrumentos para captação, como constituição de bibliotecas públicas, apoio a novos artistas, investimento em projetos de pesquisa de linguagem e etc.   Além dos empresários, quais outros segmentos da sociedade se beneficiam desse modelo de incentivo fiscal? A cultura é a forma que as pessoas vivem, se relacionam e se manifestam. E mais do que isso, é o sonho coletivo. A produção artística é a forma concreta com que a cultura se manifesta. A pobreza do imaginário definido por uma arte que não tem perspectiva crítica condena as relações sociais à impossibilidade de cidadania. A quem isto interessa: a manutenção de um programa econômico e político que se baseia justamente nisto: na ignorância, na exclusão, na competição mais violenta como forma de exercício de poder.   Por fim, qual seria um modelo alternativo de política pública e financiamento para a área cultural? Há inúmeros exemplos em todo o mundo, de países inclusive conservadores em seu exercício democrático: financiamento público movido pelos interesses genuínos de desenvolvimento da população. Orçamento público. O paradoxo da Lei Rouanet é que ela desmentiu a velha ladainha de que somos um país com muitos problemas sociais mais urgentes do que a promoção cultural. Taí pra todo mundo ver: um bilhão de reais são reservados anualmente à renúncia fiscal. Seria muito dinheiro, se bem aplicado, daria pra fazer uma revolução gigantesca. Da forma que é, destinando recursos públicos pra quem deles não precisa atende precisamente aos interesses de uma política cultural fascista e excludente. Quem é: Marco Antônio Rodrigues é diretor e autor teatral e um dos fundadores do grupo Folias d'Arte, que existe a 11 anos. É também professor do Teatro-escola Célia Helena, e funcionário da Fundação Nacional das Artes (Funarte), desde 1987, como profissional de artes cênicas. 

Lei Rouanet: a cultura como marketing e negócio

Dafne Melo da Redação da Carta Capital “A pobreza do imaginário definido por uma arte que não tem perspectiva crítica condena as relações sociais à impossibilidade de cidadania”, alerta Marco Antônio Rodrigues, diretor e autor teatral e um dos fundadores do grupo Folias d'Arte, de São Paulo. Para ele, é exatamente esse o cenário cultural do Brasil de hoje, em grande parte, acredita, é decorrente da manutenção do modelo de financiamento da Lei Rouanet, sancionada em 1991.  Em entrevista ao Brasil de Fato, Rodrigues critica o paradoxo da Lei "que desmentiu a velha ladainha de que somos um país com muitos problemas sociais mais urgentes do que a promoção cultural. Taí pra todo mundo ver: um bilhão de reais são reservados anualmente à renúncia fiscal. Seria muito dinheiro, se bem aplicado, daria pra fazer uma revolução gigantesca". Confira a entrevista abaixo:  Brasil de Fato - A Lei Rouanet foi sancionada em 1991, durante a gestão Collor. Qual era o objetivo daqueles que a implementaram? Marco Antônio Rodrigues - A lei Rouanet é filha de uma outra lei de incentivo implementada no Governo [José] Sarney por ninguém mais ninguém menos que Celso Furtado, então ministro da Cultura daquele governo. A memória que tenho da Lei Sarney é que, embora se apoiasse no mesmo falso princípio de que é possível mobilizar o empresariado nacional para algum objetivo nobre que não seja a obsessiva perseguição do lucro, ela era mais democrática.  Era possível, por exemplo, participar de um projeto cultural com serviços, com produtos, enfim, não ficava reduzida a destinação de recursos financeiros. Também não eram necessários lucros astronômicos para que o incentivo fiscal tivesse qualquer efeito, de forma a interessar pequenos empresários na aplicação da Lei. Pensava-se, que num eventual processo de aperfeiçoamento, a Lei poderia ter efeitos comunitários, fazendo com que, por exemplo, o comércio local participasse da "produção" de um espetáculo, cedendo materiais, apoio e até dinheiro, podendo abater do pagamento de seus impostos. Bem, talvez a memória me traia e eu esteja tendo um delírio polianesco.  Qual era o objetivo do Celso Furtado ao elaborar a lei? Acredito que o Celso Furtado, percebendo a dificuldade que teria para conseguir mais recursos orçamentários diretos para a Cultura, optou, à época, por uma estratégia indireta e de longo prazo. Acreditava, que com o tempo, se criaria um ambiente de exuberante produção artística, que acabaria por pressionar um quadro em que não houvesse saída política para a manutenção vergonhosa de uma participação tão ínfima da cultura na vida nacional. Quadro que aliás permanece, a despeito destas supostas boas intenções (interpretação minha) do mestre Celso Furtado.  Como foi a mudança com o governo Collor? Collor, como sabem todos, entrou rasgando. Aliás, os primeiros órgãos a serem destruídos foram aqueles da cultura: a Fundação Nacional de Artes Cênicas, a Funarte, enfim, terra arrasada. Acabou com o cinema nacional. E como era o rei da moralidade, atingiu de cara a Lei Sarney, inventando no seu lugar a Lei Rouanet, que entrega ao empresariado os destinos da produção artística e da cultura nacional. Acabou com a Lei Sarney dizendo que havia muitas distorções na sua aplicação, com gente se locupletando com os recursos da renúncia fiscal. O discurso pegou fácil, como qualquer discurso pretensamente moralista, policialesco e de retórica revisionista pega desde sempre, à direita e à esquerda.  O escopo da Lei Rouanet é o seguinte: só podem se beneficiar dela as empresas que pagam imposto de renda pelo regime de lucro real. Ou seja, os grandes lucros. Estão excluídas as empresas que pagam imposto por lucro presumido ou lucro arbitrado, ou seja, de lucros menores. Também se excluem benefícios sobre operações de capital, vendas de empresas, impostos sobre heranças. Apenas o lucro real: grandes corporações, bancos e etc.  É claro que os artistas que têm poder de acessar estes recursos são também os mais conhecidos, com projetos sem qualquer perspectiva crítica. Ou seja: matou vários coelhos com uma porrada só: agradou as estrelas, que até hoje se mobilizam para manter intocados os seus privilégios, agradou a empresa que o levou à presidência da república, a famigerada Rede Globo e outras mídias em geral, agradou as grandes empresas e seus diretores de marketing que têm mais poder na formulação de políticas de fomentos às artes do que o próprio presidente da república.  Para não falar dos ministros da cultura que, desde aí, são apenas fantoches na manutenção desta política pública de cunho fascista, privatizante e altamente alienada. Por último, fomentou a organização das grandes fundações, tipo Roberto Marinho e Itaú, que sendo as maiores captadoras, legitimam uma operação política que transfere recursos públicos de um bolso para o mesmo bolso, camuflados por uma aparência de preocupação cívica e cultural. Goebbels vira no túmulo de inveja.     Na sua opinião, quais são as maiores problemas que esse modelo de financiamento traz? A maior distorção é que este modelo atravessou os governos ditos democráticos de Fernando Henrique Cardoso e Lula sem nenhum retoque. No atual governo houve algumas tentativas pontuais de maquiagem da lei, que foram imediatamente soterradas pela resposta imediata das organizações Globo.  Celso Frateschi, ex-presidente da Funarte, caiu, na minha opinião porque sinceramente tentou fazer com que a Lei fosse, digamos, submetida a controle público. Uma reportagem no Jornal O Globo sugerindo prevaricação foi o suficiente para que o ambiente em que trabalhava ficasse infernal levando-o à renúncia.  Ou seja, a maior distorção é que da direita mais canina à esquerda mais radical (se é que isto ainda pode se aplicar como adjetivo) a visão sobre cultura é a mais provinciana, estúpida e leviana que se pudesse imaginar. É um beco quase sem saída porque a compreensão da sociedade, ou das forças sociais mais progressistas é exatamente igual: para elas, cultura e produção artística é uma matéria cosmética que deve ser tratada da forma mais subalterna possível.    É possível, por meio dessa reforma na lei, melhorar seu funcionamento, ou ela tem um problema de fundo e deve ser extinta? Na minha opinião, a única forma de ser realmente funcional é que metade do bilhão de recursos destinados ao incentivo fiscal por ano, constituam um fundo público regido por editais com participação, em seu julgamento, dos setores organizados da sociedade civil. Segundo, que o empresário arque com parte dos recursos, não como funciona agora, onde o recurso utilizado é exclusivamente público. Terceiro, que os recursos captados pelos que se beneficiam deste estelionato legalizado sejam submetidos a controle público: ou seja, qual a relevância do projeto para a sociedade? Tem qualidades artísticas? Necessita realmente do dinheiro público ou não passa de uma jogada mercadológica espúria, como a primeira temporada do Cirque du Soleil no Brasil que captou nove milhões de reais pela Lei e vendeu seus ingressos a razão de duzentos reais? Quarto, que o dinheiro captado pague um pedágio de pelo menos vinte por cento ao Fundo Público que será destinado a projetos que não têm instrumentos para captação, como constituição de bibliotecas públicas, apoio a novos artistas, investimento em projetos de pesquisa de linguagem e etc.   Além dos empresários, quais outros segmentos da sociedade se beneficiam desse modelo de incentivo fiscal? A cultura é a forma que as pessoas vivem, se relacionam e se manifestam. E mais do que isso, é o sonho coletivo. A produção artística é a forma concreta com que a cultura se manifesta. A pobreza do imaginário definido por uma arte que não tem perspectiva crítica condena as relações sociais à impossibilidade de cidadania. A quem isto interessa: a manutenção de um programa econômico e político que se baseia justamente nisto: na ignorância, na exclusão, na competição mais violenta como forma de exercício de poder.   Por fim, qual seria um modelo alternativo de política pública e financiamento para a área cultural? Há inúmeros exemplos em todo o mundo, de países inclusive conservadores em seu exercício democrático: financiamento público movido pelos interesses genuínos de desenvolvimento da população. Orçamento público. O paradoxo da Lei Rouanet é que ela desmentiu a velha ladainha de que somos um país com muitos problemas sociais mais urgentes do que a promoção cultural. Taí pra todo mundo ver: um bilhão de reais são reservados anualmente à renúncia fiscal. Seria muito dinheiro, se bem aplicado, daria pra fazer uma revolução gigantesca. Da forma que é, destinando recursos públicos pra quem deles não precisa atende precisamente aos interesses de uma política cultural fascista e excludente. Quem é: Marco Antônio Rodrigues é diretor e autor teatral e um dos fundadores do grupo Folias d'Arte, que existe a 11 anos. É também professor do Teatro-escola Célia Helena, e funcionário da Fundação Nacional das Artes (Funarte), desde 1987, como profissional de artes cênicas. 

Crise: Edmilson Rodrigues perde seu braço esquerdo no PSOL

Luiz Araújo deixou o PT para fundar o PSOL, onde viveu até então organizando a corrente interna "Primavera Socialista" e supostame...