domingo, novembro 06, 2011

Separatismo de estados esconde debate sobre desenvolvimento

Na Carta Capital


Criação de estados é caminho fácil para resolver problemas particulares de elites políticas e econômicas paroquiais sem atacar problemas estruturais. Mesa redonda em Belém mostra como proposta de repartir Pará em três seria exemplo perfeito de aliançaem proveito próprio e de ameaça às causas populares.
 

BELÉM - Treze projetos de redivisão do país tramitam hoje no Congresso. Caso fossem aprovados, o Brasil teria dez estados novos e despesa extra de R$ 13 bilhões por ano. Para os participantes da mesa redonda “Divisão do Pará: o que está em jogo?”, promovida pelo Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém (PA), na última sexta-feira (4), este tipo de discussão contribui para esconder debate realmente necessário, sobre modelo de desenvolvimento.

“Se a população aprovar os desmembramentos do Pará, Carajás já nascerá como o estado mais violento do país e Tapajós será o mais pobre”, afirmou o economista Gilberto Marques, na Universidade Federal do Pará (UFPA), que participou do debate.

Segundo ele, 53% dos homicídios do Pará ocorrem na região de Marabá, enquanto a região de Santarém, apesar de possuir 58% das terras paraenses, concentra apenas 11% do Produto Interno Bruto (PIB) do estado.

A divisão também poderia levar ao surgimento de lideranças locais sem compromisso com causas populares. Um exemplo disso seria o desmembramento de Tocantins a partir de Goiás, o que criou para o aparecimento de lideranças como a senadora Kátia Abreu (PSD), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

“O controle político que as elites locais constroem a partir dos novos municípios e estados têm significado retrocesso para o povo”, exemplificou o antropólogo e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE), Roberto Araújo.

O professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal do Pará (UFPA) Aloísio Nunes lembra que novos estados demandam novas lideranças políticas. “E quem elege os políticos não é o povo, mas as empresas que financiam as campanhas deles. São essas forças econômicas que decidem, inclusive, quem pode ou não se candidatar”, disse.

Fator Vale do Rio Doce

No pretenso estado de Carajás, é fácil avaliar quem associará poder político e econômico. Apesar da forte presença do agronegócio na região, quem domina o poder econômico é a Companhia Vale do Rio Doce, ex-estatal brasileira privatizada durante o governo Fernando Henrique Cardoso. A empresa, que tem cerca de 40% de capital estrangeiro, é que dita o ritmo do desenvolvimento da região.

Na pauta da exportação, os produtos básicos são presença majoritária, o que põe em xeque o discurso de industrialização do Pará. Até 2005, o volume exportado de produtos básicos e industrializados se equiparava. “Hoje, os básicos já somam três vezes mais”, denuncia o professor do Gilberto Marques.

A indústria mineral representa 66% das exportações do Pará. O maior volume (73%) proveniente da região de Carajás, seguida pela região de Belém (22%) e, na lanterna, Tapajós (11%). Mais da metade das exportações é ferro extraído pela Vale, que é a responsável por 59,26% do total das exportações paraenses.

“A criação do estado de Carajás é a materialização do agronegócio e do império da mineração, tendo a Vale como carro-chefe”, acrescentou o sociólogo Raimundo Gomes, ligado ao Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular (Cepasp) de Marabá.

Segundo ele, a companhia já domina a maior parte do território: controla o subsolo, parte do solo, ocupa terras públicas e avança na desterritorialização dos camponeses, gerando violência e miséria para a população.

*A repórter viajou a Belém a convite do Museu Paraense Emílio Goeldi, que pagou as despesas com transporte e hospedagem.

Leia Mais: A um mês de plebiscito inédito, divisão do Pará gera controvérsias.

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