Por Edyr Augusto Proença, em Crônicas da Cidade Morena 3
Gente, a Verinha chegou.
Foi aquele zunzum na mesa. A Verinha realmente era uma pomada. Muito chata. Paraense, morando no Rio de Janeiro, era conhecida, exatamente, por sua aversão a tudo o que se referia a Belém.
“Minha filha, se eu tive o acidente de ter nascido naquela cidade, já me recuperei!”. Rapidamente adquiriu sotaque carioca e apresentava seus amigos paraenses à sua turma, como se de um outro planeta ao qual, certamente, ela não pertencia. Se alguém, sem querer, ligava para desejar bom Círio, ela se encrespava: “Credo! Aquela multidão andando junta, suando, fedendo e depois indo se encharcar naquelas comidas, olha, que Nossa Senhora de Nazaré me perdoe, mas até ela é cafona!”. A Verinha era de lascar! E agora, tinha chegado.
Forçada por alguns problemas legais, relativos a uma herança, veio pensando em passar o mais breve tempo possível na cidade. E estava com um péssimo humor!
“Gentem, Gentem, o que é essa cidade, meu Deus! Um calor desgraçado, quando abre a porta do avião já entra esse bafo quente! Sem ar condicionado não é possível viver por aqui! E a estrada do aeroporto! Aquela pobreza toda! Ainda chego no hotel e vem o maitre me perguntar se não queria aproveitar, no restaurante, a Noite Paraense, à base de comidas típicas! E ainda me dizendo: venha, senhora, aposto que está com saudade de uma maniçoba! Credo! Meu senhor, me erre por favor, viu? Eu só estou aqui por obrigações legais! Escuta, vocês aqui ainda tomam aquele guaraná Garoto? Não, estou brincando, mas esses refrigerantes normais vocês têm, não?”
Bem, já havia quem estivesse sendo contido para não agredir a Verinha.
Mas quem a conhece, já sabe.
“Gente, o que é esse camelódromo na Presidente Vargas? Olha que no Rio a gente até que tem isso, mas todo dia tem batida, eles saem correndo, não têm sossego. Aqui, eles já tomaram conta da rua. Ontem, quiseram me levar para passear na noite paraense. Aí nós vamos chegando, eu percebo que saímos da rua asfaltada, entramos em uma viela com barracos, eu já pensando que era no morro, com traficantes e tudo e me dizem que é local vip. Vip de quê? Um monte de tábuas podres, cheiro de peixe podre, tipo, como é que vocês chamam? piti.. pitiú!
Olha, dá licença, viu?
Aí eu peço para me levarem até um local onde possa jantar e me dizem que aquela altura, de madrugada, só o Roxy?
E esse calor que não passa, hein? Insuportável. In-su-por-tá-vel! Ah, aposto que alguém aqui vai dizer “égua”! Não vai? Agora me diz, tem coisa mais paraense, do que dizer “égua”?
Em julho, ainda vão pra Mosqueiro? Ah, não? Agora é Salinas. É, eu sei. Não lembrava.” Preventivamente, alguém levou a Verinha de volta para o hotel, antes que fosse linchada.
Mas quando, no dia após ela ter voltado para o Rio, deu naquela coluna a foto da Verinha atracada a uma cuia de tacacá na avenida Nazaré, todos se sentiram vingados.
Ao fotógrafo, devidamente instruído a segui-la, até descobrir um podre, no momento do flagrante, disse apenas: égua de ti, xiri!
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