terça-feira, janeiro 05, 2021

Sobre a compra de vacinas contra COVID-19 por clínicas privadas


Por Marcelo Freixo

A angústia de todos nós para começarmos logo a VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19 está levando muita gente a defender a imunização através de clínicas privadas como solução. Vou explicar aqui por que isso é errado e vai atrasar ainda mais nosso retorno à normalidade.

Para que funcionem, campanhas de vacinação tem que partir de estratégias de imunização coletiva, com base em critérios científicos e de interesse público. Imunizar primeiro uma minoria que tem dinheiro para pagar caro pela vacina não pode ser a regra. 

A prioridade tem que ser os profissionais de saúde, responsáveis pelo combate à doença; idosos, pessoas com comorbidades, indígenas e quilombolas, que correm mais risco de morrer caso fiquem doentes, e os trabalhadores que lidam diretamente com a população em seu cotidiano. 

Assim vamos reduzir a quantidade de internações, aliviar a pressão nos hospitais e diminuir a taxa de letalidade, o que permitirá que retomemos cirurgias e exames eletivos, em boa parte represados por causa da pandemia, além de dar segurança à retomada das atividades. 

Um jovem adulto sem nenhum fator de risco que tem dinheiro para pagar caro pela vacina não pode ser imunizado antes de um idoso ou de um profissional de saúde. Além de ser imoral, isso prejudicará o combate eficaz à Covid-19.

Adquirir vacinas não é como comprar bananas na feira. A oferta é limitada, a competição entre os países é feroz e o preço para quem quiser pagar será altíssimo, impedindo o uso em massa como exige o interesse público. 

O Brasil tem a 2ª maior concentração de renda do mundo (ONU): o 1% mais rico detém quase 1/3 de toda a riqueza. Isso significa que a esmagadora maioria dos brasileiros, incluindo os do grupos de risco, não poderá arcar com o alto custo da vacina e continuará desprotegida. 

Isso tem graves consequências. Como explicou a epidemiologista e professora Ethel Maciel, quando uma pequena fração da população se vacina e a maioria segue exposta, se o vírus sofrer uma mutação e fazer com que todo o esforço seja desperdiçado.

Além disso, essa minoria com condições de pagar pela vacina poderá seguir carregando o vírus nas mãos, roupas e sapatos, por exemplo, colocando em risco a maioria da população que não tem dinheiro para se imunizar. 

Diante da oferta escassa, cada vacina destinada a quem pode pagar é uma vacina a menos para profissionais de saúde e grupos de risco. A prioridade tem que ser o sistema público em acordo com o plano nacional, como têm feito países que atuam de forma responsável na pandemia.

Essas 5 milhões de doses são obviamente muito bem-vindas, mas tem de ser direcionadas ao SUS para complementar a estratégia nacional com as vacinas da Fiocruz/Astrazeneca e Butantã/Coronavac, reforçando as 3 primeiras etapas do plano de imunização.

O SUS é referência mundial em campanhas de vacinação em massa. Em 2010, foram vacinados 27 milhões por mês na pandemia de H1N1. Nosso papel é seguir pressionando o governo e brigar por mais vacinas, pela distribuição gratuita e pela prioridade dos grupos de risco. 

Só venceremos de fato a Covid-19 se seguirmos uma estratégia coletiva de imunização que coloque o interesse público em primeiro lugar. Defender a venda de vacinas a preços altíssimos que beneficia somente quem pode pagar não vai nos tirar do buraco.

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