domingo, abril 19, 2020

Jornalismo, enfermo, na “UTI”



Por Alex Fiúza, em seu blog

Como explicar essa “guerra de narrativas”, na imprensa brasileira, sobre a pandemia do Covid-19, com informações desencontradas e distorcidas, sem a devida comprovação e imparcialidade dos dados anunciados, em versões enviesadas e/ou desonestas das matérias publicadas, como se os órgãos de comunicação, ao invés do compromisso ético (e primordial) com o interesse público, fossem meros instrumentos partidarizados e/ou ideológicos, associados a interesses econômicos e políticos inconfessos, com o uso desavergonhado do vírus como “palanque político”?!  

Como explicar que uma carreata quilométrica no centro de São Paulo, contra as medidas do Governador João Dória – indubitavelmente o fato político mais relevante do sábado, 11 de abril –, não ganhasse manchete (sequer menção), no dia seguinte, em alguns dos principais jornais e canais de televisão do país (a exemplo da Folha de São Paulo e da Rede Globo) – ao passo que a ida do Presidente da República a uma padaria (ocorrência sem qualquer valor jornalístico significativo) auferia destaque, na mesma ocasião, em quase todos os noticiários desses órgãos?!  

Como explicar a divulgação deturpada, em vídeo, de prisão violenta de uma cidadã (que apenas caminhava na praça) por policiais, na cidade de Araraquara (SP), sob a narrativa deturpada de “descumprimento” (de sua parte) de determinação de “isolamento social” decretada pelo Prefeito da cidade, sem qualquer apuração de contraditório (depoimento da vítima) ou questionamento do ato da prisão em si – em tese, frontalmente contrário ao direito fundamental (e democrático) da liberdade de ir-e-vir, consagrado na Constituição Federal?!  

Como explicar a publicação de uma foto com centenas de covas enfileiradas num cemitério de São Paulo, em dimensões absolutamente desproporcionais às ocorrências locais dos óbitos da pandemia, com o único e aleivoso objetivo de impactar negativamente a sociedade com a imagem “plantada” e propagandear, internacionalmente, uma inverdade (fake News) forjada – servindo até de capa para o reconhecido jornal norte-americano The Washington Post?!  

Como explicar que, em plena entrevista ao vivo, durante telejornal da CNN, um reconhecido e reputado médico, com opinião divergente ao da emissora no que concerne aos protocolos pertinentes ao enfrentamento da pandemia do Covid-19, tenha sido bloqueado em seu depoimento sob a alegação de “problemas técnicos” (sic!); ou que um telefonema suspeito tenha interrompido, durante uma transmissão ao vivo, a divulgação, pelo apresentador Luiz Datena, de uma possível cura para o Covid-19 (à base de cloroquina), em seu programa diário na TV Bandeirantes ?!  

Como explicar o bloqueio sistemático (ou o menosprezo) à abordagem e divulgação do uso da hidroxicloroquina no tratamento do Covid-19 – não obstante os resultados clínicos positivos já comprovados em muitos hospitais do país e em nível internacional –, como se tal “pauta” fosse socialmente desprezível – ou viesse a “atrapalhar” as notórias e “funcionais” estratégias midiáticas de fertilização do “terrorismo pandêmico”?!  

Como explicar que uma das denúncias mais relevantes e reveladoras da Operação Lava Jato, a do ex-ministro Antônio Palocci – da mesma forma que aquela do ex-governador Sérgio Cabral – , não tenha(m) sido priorizada(s) nas manchetes da grande mídia, na proporcional e correta dimensão do fato, ou devidamente tematizada(s) – dada a sua importância política para o país – por alguns de seus principais analistas de plantão ?!  

Sim, como explicar tudo isso – e muito, muito mais – (!?), quando o “Código de Ética dos Jornalistas”, que fixa as principais diretrizes à atuação do profissional nas suas relações com a comunidade e com as fontes de informação, estabelece, dentre outros princípios e regras, que:  

– a divulgação da informação, precisa e correta, é dever dos meios de divulgação pública, independente da natureza de sua propriedade (Art. 2º.);  

– a informação divulgada pelos meios de comunicação pública se pautará pela real ocorrência dos fatos e terá por finalidade o interesse social e coletivo (Art. 3º.);  

– a obstrução direta ou indireta à livre divulgação da informação e a aplicação de censura ou autocensura são um delito contra a sociedade (Art. 5º.);  

– o compromisso fundamental do jornalista é com a verdade dos fatos, e seu trabalho se pauta pela precisa apuração dos acontecimentos e sua correta divulgação (Art. 7º.);  

– é dever do jornalista divulgar todos os fatos que sejam de interesse público (Art. 9º.);  

– o jornalista não pode submeter-se a diretrizes contrárias à divulgação correta da informação; [e] frustrar a manifestação de opiniões divergentes ou impedir o livre debate (Art. 10);  

– o jornalista deve evitar a divulgação dos fatos com interesse de favorecimento pessoal ou vantagens econômicas; ou de caráter mórbido e contrários aos valores humanos (Art. 13);  

– o jornalista deve ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, todas as pessoas objeto de acusações não comprovadas, feitas por terceiros e não suficientemente demostradas ou verificadas (Art. 14);  

– o jornalista deve permitir o direito de resposta às pessoas envolvidas ou mencionadas em sua matéria, quando ficar demonstrada a existência de equívocos ou incorreções (Art. 15);  

Etc. etc. etc.  

Lamentavelmente, os fatos estão a demonstrar que, no Brasil, o jornalismo, massivamente, rasgou, em definitivo, o “Código de Ética”. A (olvidada) “ética jornalística” parece que foi contaminada pela “pandemia da patifaria”, colocando em risco – de morte (!) – a única condição imunológica capaz de combater qualquer ataque “parasitário” ou “bacteriano” das costumeiras politicagens de ocasião, numa democracia: a credibilidade da informação – alicerçada na prática da isenção da narrativa e no testemunho fidedigno dos fatos.  

Sim, a transparência informativa e a honestidade profissional cederam lugar às omissões factuais, às deturpações interpretativas, quando não às mentiras deliberadas (fake News), num total e repugnante desserviço à sociedade.  

O noticiário sobre a pandemia do Covid-19 se transformou num “laboratório” por excelência para o exercício da hipocrisia e máxima ilustração de toda essa patifaria em série, cujo “roteiro” acabou por subsumir inúmeros jornalistas à condição de meros servos do furtivo patronato midiático, reduzidos ao desprezível papel de torcida infame por cadáveres em massa, sedentos por notícias mórbidas.  

Não, definitivamente isso não é jornalismo! É militância sórdida, imoral! – não importa se “de direita” ou “de esquerda”.  

Por tudo, o jornalismo brasileiro, hoje, está enfermo, ofegante, na “UTI”; de “pulmões” infectados pelo “vírus” do descrédito e do deslustre, à espera de “respiradores mecânicos” de última hora, já que o costumeiro “oxigênio” – usualmente canalizado por recursos públicos “previamente carimbados” – parece ter sido ultimamente interrompido, ameaçando de morte quem estava acostumado a “respirar” apenas artificialmente, vendendo “verdades”.

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