Karol Cavalcante: Nós mulheres ainda representamos 70 % da população pobre do mundo. |
Por Karol Cavalcante*
Muitos foram os avanços conquistados pelas mulheres. Na última década, cresceu o número de mulheres no mercado de trabalho, no parlamento, nas atividades científicas. Este crescimento reflete a luta e organização das mulheres na sociedade. Embora tenhamos avançado bastante, as dificuldades ainda são latentes e se refletem no mundo do trabalho e na vida das mulheres.
Desde 2002 vivemos um novo momento na política e na vida das mulheres brasileiras. Com a eleição de Lula e Dilma um conjunto de políticas públicas foram implementadas com o objetivo de combater as desigualdades históricas entre homens e mulheres. Conquistamos o primeiro órgão federal de políticas públicas, Conferências, Plano Nacional de Políticas para as mulheres, a Lei Maria da Penha principal mecanismo de combate a violência contra as mulheres, a regulamentação em Lei do trabalho doméstico, entre outras conquistas.
Avançamos bastante, mas não podemos nos levar pelo discurso triunfalista de que homens e mulheres já vivem em situação de igualdade na sociedade. Somos apenas 8,7% do congresso nacional, mesmo representando 52% do eleitorado. Em relação ao mercado de trabalho brasileiro, homens recebem salários 30% maiores do que as mulheres (Fonte: Observatório de gênero no Brasil). Cumprimos uma carga horária de trabalho exaustiva e muitas vezes somos as únicas responsáveis pelo trabalho doméstico. Nós mulheres ainda representamos 70 % da população pobre do mundo.
Embora tenhamos avançado bastante no que concerne as políticas públicas, avançamos pouco no que se refere aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Ainda temos uma legislação do século passado que criminaliza o aborto fazendo com que anualmente milhares de mulheres, principalmente as mais pobres, recorram a esse método de forma clandestina, em péssimas condições, colocando em risco suas vidas.
É papel de um governo progressista se propor a discutir e alterar os marcos legais existentes no Brasil sobre a temática. É necessário compreender o legado de opressão que impede que mulheres tenham de fato o direito de decidir sobre o seu corpo. Devemos seguir o exemplo dos nossos irmãos Uruguaios e descriminalizar o aborto no Brasil. No Uruguai o número de abortos passou de 33 mil por ano para apenas 4 mil. Segundo os dados oficiais do governo Uruguaio entre dezembro de 2012 e maio de 2013 não foi registrado nenhuma morte materna por consequência de aborto. Junto a descriminalização o governo uruguaio implementou um conjunto de politicas públicas de planejamento familiar e atendimento integral de saúde reprodutiva da mulher.
O ambiente conservador, liderado por parlamentares fundamentalistas e religiosos tem tornado o tema do aborto um assunto cada vez mais difícil de ser debatido no Brasil. Embora os conservadores não queiram debater não há como negar que o aborto existe e é praticado por milhares de mulheres. Dados do Ministério da saúde de 2013 estimam que ocorra mais de um milhão de abortos provocados todos os anos. O abortamento é a quinta causa de mortalidade materna no país. Entre 2007 e 2012 um total de 963. 291 mulheres foram internadas no SUS por aborto e suas complicações. O custo desse atendimento foi de 180 milhões aos cofres públicos brasileiro. Sobre o perfil das mulheres que recorrem a esse método 81% já possui filhos e 64% estão casadas, isto sugeri que o aborto é usado como instrumento de planejamento familiar quando os métodos contraceptivos falham. Quanto a religião 65% declaram ser católicas, 25% protestantes ou evangélicas e 5% seguem outras religiões. Os dados comprovam que apesar da proibição legal ao aborto ele existe e vítima anualmente milhares de mulheres, em sua maioria pobres e negras (Pesquisa nacional de aborto/ UNB). A Legalização do aborto e sua descriminalização são pautas fundamentais para o avanço de políticas públicas que caminhem rumo a garantia da autonomia das mulheres.
O Partido dos Trabalhadores, desde 1991, defende em seu programa politico a legalização do aborto. Sofremos vários reveses na pauta nos últimos anos, fruto das contradições e dos limites que se apresentam a um partido que se torna governo. Mas nós mulheres petistas não podemos abrir mão desse enorme desafio de debater este tema tão atual que atinge a vida cotidiana das mulheres brasileiras e que deve ser tratado como uma questão de saúde pública.
Que neste 08 de Março possamos mais uma vez ir as ruas lutar para que o aborto legal seja um direito das mulheres e dever do estado. Que possamos lutar por mais dignidade, autonomia e cidadania. Enfim, que possamos caminhar para uma sociedade verdadeiramente igualitária, justa, solidária e libertária.
*Karol Cavalcante é Socióloga, Especialista em Gestão de Municípios pelo NUMA/UFPA. Feminista e ativista digital. Atualmente é Secretária-Geral do PT do Pará.
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