Por Najla Passos
, na Carta Capital.
O coronel da Polícia Militar Mário Colares Pantoja, que comandou o
massacre de Eldorado dos Carajás, em 1996, deu início nesta segunda (7)
ao cumprimento da sua pena de 228 anos de prisão. A notícia é um alento
no quadro de impunidade que impera no campo brasileiro. Entre 1985 e
2011, 1.666 camponeses foram assassinados em conflitos de terra no país.
Porém, somente 92 casos foram julgados. Apenas 21 mandantes,
condenados. Destes, Pantoja é o segundo a ir para a cadeira.
Brasília - O coronel da Polícia
Militar (PM), Mário Colares Pantoja, que comandou o massacre de Eldorado
dos Carajás, há 16 anos, foi preso nesta segunda (7), no município de
Santa Izabel, no nordeste paraense, por determinação do Tribunal de
Justiça do Pará (TJ-PA). O massacre resultou na morte de 21 sem-terra e
deixou mais de 60 feridos. Pantoja já havia sido condenado a cumprir 228
anos de prisão pelos crimes, mas, por força de liminar expedida pelo
Supremo Tribunal Federal (STF), aguardava os julgamentos de uma sucessão
de recursos em liberdade.
O TJ-PA determinou também a prisão do
major José Maria Pereira de Oliveira, condenado a 158 de prisão pela
sua participou nos crimes. Porém, ele ainda não foi localizado. Apesar
da ação policial contra 1,5 mil sem-terra ter mobilizado mais de 150
policiais, no dia 17 de abril de 1996, os oficiais foram os únicos
responsabilizados. O governador à época, Almir Gabriel (PSDB), também
não sofreu qualquer tipo de punição.
Dados divulgados hoje pela
Comissão Pastoral da Terra (CPT) revelam que, entre 1985 e 2011, 1.666
camponeses foram assassinados em conflitos de terra no país. Porém,
somente 92 casos foram julgados. Apenas 21 mandantes, condenados. E, até
a prisão de Pantoja, só um estava preso: o fazendeiro Vitalmiro Bastos
de Moura, o Bida, mandante do assassinato da irmã Dorothy Stang,
ocorrido em fevereiro de 2005.
“A impunidade é enorme. Os
mandantes, quando chegam a ser julgados, conseguem continuar em
liberdade”, afirma Ivolete Wichinieski, da coordenação nacional da CPT.
De acordo com ela, a inoperância do judiciário em julgar casos
envolvendo assassinatos de camponeses só comprova seu caráter de classe.
“É impressionante como as liminares relativas às ações de despejo são
concedidas com agilidade, agravando ainda mais os conflitos no campo,
enquanto os julgamentos dos crimes praticados contra camponeses são
esquecidos”, compara.
Para o deputado Valmir Assunção (PT-BA),
oriundo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), esta é
uma grande vitória dos movimentos sociais que clamam por justiça e
denunciam a impunidade no campo. “Ver que os condenados pelo crime de
Eldorado dos Carajás, finalmente, vão cumprir sua pena é um alento e uma
esperança para que a justiça seja feita contra todos aqueles que
ceifaram a vida de trabalhadores neste País”, disse ele, por meio de sua
assessoria de imprensa.
O deputado, entretanto, relaciona o
verdadeiro fim da impunidade à efetivação da reforma agrária no país. “O
momento é de comemoração, mas isso não significa descanso. A reforma
agrária é uma dívida que nosso Estado tem para com os trabalhadores do
campo”, complementou, alertando para a necessidade da aprovação da
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438, batizada de PEC do Trabalho
Escravo, na pauta de votação da Câmara dos Deputados, esta semana.
A
PEC 438 prevê a expropriação das terras nas quais sejam encontrados
trabalhadores vivendo em condições análogas a de escravos, para fins de
reforma agrária. E, exatamente por modificar a correlação de forças que
impera no campo brasileiro, deve enfrentar muita resistência da bancada
ruralista que, apesar dos protestos de ambientalistas e movimentos
sociais, já saiu vitoriosa da votação do novo Código Florestal, na
semana passada.
“Além da campanha pela aprovação da PEC do
Trabalho Escravo, a CPT está trabalhando para que a presidenta Dilma
Rousseff vete a lei que cria o novo Código Florestal em sua
integralidade. Da forma como passou, essa lei só vai acirrar ainda mais
os conflitos no campo brasileiro, pois os camponeses, quilombolas e
índios já demonstraram sua disposição de resistir ao avanço do capital”,
informa a coordenadora da CPT.
Conforme Wichinieski, de 2010
para 2011, os conflitos no campo brasileiro aumentaram 15%. Passaram de
1.186, em 2010, para 1.363, no ano passado. Um número bem acima da média
registrada de 2002 até agora, que era de 1.034 conflitos por ano. O
número de assassinados recuou de 34 para 29. Mas o de ameaçados por
pistoleiros disparou: cresceu 177,6%, passando de 125, em 2010, para
347, em 2011.
“As comunidades tradicionais, principalmente da
Amazônia Legal, estão sofrendo o impacto do avanço do capital no campo:
agronegócio, projetos de mineração etc. Tanto que a maioria dos
conflitos se dá com o setor privado, que responde por 50,2% das
ocorrências”, esclarece ela.
Massacre
O Massacre de
Eldorado dos Carajás aconteceu em 17 de abril de 1996, durante uma
operação da PM para reprimir o tráfego da rodovia PA 150, no município
de Eldorado do Carajás, sudeste do Pará, onde 1,5 mil trabalhadores
ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) realizavam
um protesto.
Durante a ação, 19 foram assassinados. Na maioria
dos corpos, restaram os sinais evidentes de execuções. Outros dois
morreram a caminho do hospital. Mais de 60 pessoas ficaram feridas,
muitas delas com sequelas que levarão para o resto da vida.
Desde
o massacre, o MST protagoniza uma série de ações para cobrar o fim da
impunidade contra os responsáveis. O mês de abril entrou para o
calendário do movimento como temporada anual de jornada de lutas. É o
“Abril Vermelho”, responsável pelas marchas, ocupações, atos e protestos
que, tradicionalmente, envolvem todas as regiões do país.