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terça-feira, julho 04, 2017

Violência no campo segue mapa de expansão do agronegócio, diz dirigente do MST

Por Lílian Campelo para a Brasil de Fato

Ulisses Manaças, dirigente nacional do MST no Pará, acompanha as investigações da morte de dez sem-terra ocorridas em Pau D'Arco em maio. Lílian Campelo/Brasil de Fato.

Violência no campo segue mapa de expansão do agronegócio, diz dirigente do MST

Para Ulisses Manaças, o golpe que o país vive sob o comando de Michel Temer fortalece latifundiários e grileiros

A violência no campo brasileiro se intensificou nos últimos meses. 

Para Ulisses Manaças, dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Pará, a explicação está na expansão do agronegócio e na “instabilidade política” que o país vive após o golpe da base aliada de Michel Temer (PMDB). Ele avalia que esse contexto fortaleceu grileiros e latifundiários, acirrando os conflitos fundiários.

O Pará é o estado com maior número de mortes em conflitos no campo, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT). No mês de maio foram registradas 18 mortes na região. O número inclui as dez mortes de trabalhadores rurais ocorridas em Pau D’Arco. 

A chacina foi a maior dos últimos 20 anos, fica atrás apenas de Massacre de Eldorado dos Carajás, quando 21 sem-terra foram assassinados em 1996. Nos dois casos, os acusados são policiais militar. 

Em entrevista ao Brasil de Fato, Manaças fala sobre a atual conjuntura de violência no campo e argumenta que a democratização do acesso à terra é a única medida para solucionar o caos fundiário e a violência no campo.  

Brasil de Fato: Qual a sua análise sobre essa escalada de violência dos últimos meses, não só no Pará, mas em outras partes do país?

Ulisses Manaças: A análise que a gente tem feito é que essa explosão de violência nos últimos meses demonstra uma espacialização de onde o poder do capital do agronegócio avança. Ele traz no seu lastro um conjunto de violações de direitos humanos. Basta ver o caso dos Gamela [indígenas] no interior do Maranhão, onde mais de 20 indígenas ficaram feridos. Era uma disputa territorial. Se você pegar o caso de Colniza, no Mato Grosso, também a disputa fundiária é o elemento central. O caso do massacre de Pau D'Arco também demonstra uma disputa territorial e um conjunto de outras violações que acontecem com os indígenas e os camponeses no interior da Amazônia. Demonstram também o avanço da fronteira agrícola promovido pelo grande capital, pelo agronegócio, patrocinado pelo Estado brasileiro. No nosso entendimento, essa é a grande força que arrasta os conflitos no campo no Brasil. 

Outro elemento importante é a situação de instabilidade política que o Brasil vive com este governo golpista [de Michel Temer]. Então esse governo corrupto, que não tem moral diante das instituições públicas, deixa o país desgovernado. Essa situação de instabilidade no campo da política deu força para latifundiários, grileiros de terras e empresas multinacionais cometerem um conjunto de crimes e violações por conta da ausência de um poder efetivo do Estado no Brasil no atual cenário.

Brasil de Fato: O Pará é apontado como o estado que lidera esse ranking de violência. Por que esse estado apresenta índices tão alarmantes?

Ulisses Manaças: São vários elementos, primeiro que quando a CPT [Comissão Pastoral da Terra] começa a fazer a contabilização dos conflitos e dos casos de violência no campo é na década de 1980. Nesse período você teve a abertura democrática, mas, ao mesmo tempo, você vivia sob a Ditadura Militar, que patrocinou para as grandes multinacionais o acesso aos territórios da Amazônia brasileira.

O Pará é campeão porque é o estado da Amazônia brasileira com vultosos recursos naturais em aberto: ouro, minerais, madeira, água em abundância e tem o melhor acesso da região Amazônica. Se você pegar na década de 1950 foi aberta a [rodovia] Belém - Brasília, na década de 1960 e 1970 a Transamazônica [BR230] e a Santarém - Cuiabá [BR-163], então onde passaram as estradas na região Amazônica dando acesso ao grande latifúndio para chegar nos territórios e nos recursos naturais aumentou também o conjunto de conflitos e violações no campo. 

O Pará, da Amazônia, é o estado que tem o melhor acesso, portanto, é a fronteira agrícola a ser explorada pelo grande capital. A Amazônia está nessa situação de campeão nacional de violência porque a fronteira agrícola do Brasil se arrasta para essa região. Outros biomas do Brasil, como o cerrado, pampas, mata Atlântica, foram completamente destruídos pelo agronegócio.

Brasil de Fato: Que medidas o Estado deveria adotar para evitar esses conflitos?

Ulisses Manaças: A reforma agrária é a principal medida para solucionar os conflitos do campo. Também seria importante equipar o sistema de segurança pública de forma que a inteligência haja muito antes que a força. A criminalização das lutas e dos movimentos sociais promovidos pelo Estado, para nós, é uma demarcação clara de que o Estado tem partido e tem suas preferências nessa disputa. O Estado precisa ser imparcial e se colocar a serviço daqueles que são os menos favorecidos. 

Outra medida necessária nessa situação é você democratizar amplamente o acesso à terra e às políticas públicas. As populações da Amazônia e do Pará sempre viveram, historicamente, à margem de qualquer política pública, os ribeirinhos vivem aqui há centenas de anos e nunca tiveram a acesso às políticas públicas. É preciso democratizar o acesso à terra e também às políticas públicas para resolver o conflito que está na raiz dessa disputa territorial. 

Edição: Camila Maciel

Professor vence primeira batalha contra a Vale

Queixa-crime foi julgada improcedente e justiça absolveu o denunciado pela VALE.


Após pouco mais de um ano, o professor universitário Evandro Costa de Medeiros venceu uma das batalhas judiciais contra a mineradora Vale e foi absolvido da acusação de “fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite”, conforme artigo 345 do Código Penal, que tem como pena detenção de 15 dias a um mês ou multa.

A sentença foi exarada em maio pela juíza Adriana Divina da Costa Tristão, da 1ª Vara do Juizado Especial Cível e Criminal de Marabá, e divulgada hoje (4) no Diário Oficial do Tribunal de Justiça do Estado do Pará. O processo é referente a um ato público realizado na entrada do Bairro Araguaia, onde passa a Estrada de Ferro Carajás (EFC), em 20 de novembro de 2015, por professores, estudantes e moradores da região. Apenas o professor foi denunciado.

De acordo com a sentença, a Vale alega que Evandro Medeiros, do corpo docente da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), liderou invasão e interdição da EFC, sob o pretexto de promover ato de solidariedade ao povo de Mariana, em Minas Gerais. No dia 5 de novembro de 2015, ocorreu o pior acidente da mineração brasileira no município, em decorrência do rompimento de uma barragem da mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela BHP Billiton.

A juíza avaliou, por meio das provas, que a intenção do agente ativo era de manifestação e não de defesa de interesse, pelas próprias mãos, ainda que para tanto o denunciado tenha contado com auxílio de outras pessoas (alunos, outros professores e atingidos). “O fato de ir às ruas e manifestar nas linhas férreas, em apoio às vítimas do desastre de Mariana, não configura pretenso de satisfazer interesse que poderia ser resolvido judicialmente, mormente porque não representante daquelas vítimas”.

Avaliou, ainda, por meio dos depoimentos e documentos juntados aos autos, que o ato não foi feito apenas por uma pessoa, mas por várias, o que “dificulta a individualização da conduta e indivisibilidade da ação privada “. Para a juíza, a conduta pode até configurar outro tipo de crime, mas não o apontado pela mineradora.

A magistrada acrescenta que a manifestação não durou muito tempo e que não há provas efetivas de que tenha atrasado o transporte de cargas e/ou passageiros feito pela Vale e, muito menos, que o ato seria capaz de interferir na atuação da Vale S/A ou da Samarco frente a um possível processo judicial. Por fim, a juíza afirma entender que os atos praticados pelo autor não se enquadram na definição legal do crime imputado, julgando improcedente a acusação e absolvendo o professor.

“Alívio”

Procurado pelo Correio de Carajás, Evandro Medeiros comemorou a decisão. “Que bom que a Justiça prevaleceu, mais que um alívio bate um sentimento de que ainda é possível acreditar que as instituições não estão todas corrompidas e há a possibilidade de prevalecer a Justiça neste país”.

Destacou ter passado momentos difíceis em 2016, enquanto respondia ao processo. “Me criou um ano cheio de tensões, não por medo de ser condenado ou ser preso, disso não me cabe o medo, mas tensão pelo sentimento de indignação e de revolta, de injustiça. Essa indignação só aumentava a cada notícia de um novo crime ou violação de direito da Vale cometido contra as pessoas da região e a cada notícia nacional sobre Mariana e como a empresa vinha sendo beneficiada por órgãos públicos. Foi um ano de revolta muito grande e de expectativa em saber o que iria acontecer".

O professor diz esperar que a decisão sirva também para pautar novas decisões em favor da população e daqueles que “são criminalizados e processados continuamente pela Vale”, além de servir de exemplo para a população local e para aqueles que lutam por direitos. “Para mostrar que não podem baixar a cabeça jamais, não podem se vender, se acovardar, se entregar e nem ter medo dessa empresa e da violência praticada de maneira simbólica contra as pessoas”, diz, acrescentando que o “esforço da Vale nesse caso” foi para “criar um processo de criminalização das pessoas que lutam por direitos”.

Evandro Medeiros também é cineasta e no ano em que foi processado vinha realizando um documentário, junto da companheira Alexandra Duarte, junto aos atingidos pela EFC no Bairro Araguaia. Em decorrência da mesma manifestação, ele foi indiciado também criminalmente pela Polícia Civil em dois artigos do Código Penal: 260 (impedir ou perturbar serviço de estrada de ferro) e 286 (incitar, publicamente, a prática de crime), cujo processo ainda está em andamento. As penas dos crimes, caso somadas em concurso material, podem chegar a mais de cinco anos e meio de privação da liberdade.

Mineradora

Procurada a assessoria de comunicação da Vale, esta afirmou que a mineradora tomou ciência da sentença absolutória e informou que, no prazo legal, adotará as providências cabíveis para a reforma da decisão. (Luciana Marschall)

quinta-feira, março 02, 2017

Pesca na Amazônia: Preservar para não acabar



Os acordos comunitários de pesca foi o nome dado a um projeto de lei do ex-deputado federal Miriquinho Batista (PT-PA) e que hoje encontra-se parado na Comissão de Meio Ambiente e Justiça da Câmara Federal, se transformado em lei,  iria regulamentar essa técnica cabocla e empírica de Manejo Comunitário de Pesca, que além da sua principal finalidade de preservação ambiental pela recuperação dos mananciais de pesca e suas espécieis, está também a formação de uma consciência por um extrativismo sustentável.

Precisamos urgentemente valorizar essa metodologia denominado de Acordos de Pesca - Manejo comunitários de pesca. 

Assim como a maioria das armadilhas amazônidas, com a finalidade de captura de pescados, entre elas, algumas predatórias, surgiu do caboclo pescador desta região, a necessidade e o interesse pela manutenção das espécies de peixes em estado de esgotamento, tendo como maior propósito a preservação da vida, com um olhar distante e imaginário na preservação  da continuidade desta atividade milenar que  passa de pai para filhos e assim sobrevive sustentando milhares de familiares destes profissionais denominados de pescadores artesanais.

Nada mais importante neste momento de que se fazer uma reflexão pela necessidade da regulamentação deste modelo de sustentação ambiental, tendo como exemplo este momento da abertura da pesca na Baía  do Tocantins, especificamente nas confluência dos municípios de Limoeiro do Ajuru e Cametá.

quinta-feira, fevereiro 23, 2017

Prefeito de Muaná, Murilo Guimarães assume a presidência da AMAM e reúne diversos deputados, prefeitos e lideranças populares

Lideranças políticas, religiosas, empresariais e populares prestigiaram a posse da nova diretoria da AMAM. Foto: Joabher Bentes/ASCOM.

Por Diógenes Brandão

Os prefeitos de Cachoeira do Arari, Jaime Barbosa e de Bagre, Nilson Farias, foram eleitos secretário e tesoureiro, para um mandato de dois (02) anos.

A solenidade de posse do novo presidente e da diretoria da Associação dos Municípios do Marajó - AMAM, foi prestigiada por diversas lideranças políticas do estado, entre elas, o deputado federal Lúcio Vale (PR); o  presidente da Assembleia Legislativa do Pará, deputado estadual Márcio Miranda (DEM); o líder do governo e deputado estadual Eliel Faustino (DEM); o chefe da Casa Civil do Governo do Estado, Jose Megale; o deputado Sidney Rosa (PSB) e a prefeita de Maracanã e presidente do Consórcio Intermunicipal dos Municípios Paraenses - COIMP, professora Dica (PSDB); assim como diversos prefeitos e ex-prefeitos dos municípios do arquipélago do Marajó e até da região metropolitana de Belém, como o prefeito de Ananindeua, Manoel Pioneiro (PSDB).

Além das lideranças políticas, o arcebispo da prelazia do Marajó, Dom Teodoro fez a abertura do evento com uma oração, para, segundo ele, abençoar a nova diretoria da associação, que foi eleita de forma unânime.


Reeleito prefeito de Muaná em 2016, Murilo é eleito por unanimidade para presidir a AMAM por 02 anos. Foto: Joabher Bentes/ASCOM.

Para Murilo, a nova gestão da AMAM foi resultado de uma união dos gestores municipais em prol de uma nova era para o Marajó, o qual tem muita riqueza, mas ao mesmo tempo problemas sociais, econômicos e desafios enormes para serem superados, entre eles a prostituição infantil, o tráfico de drogas, a fraude no seguro-defeso e diversos problemas crônicos da região, como o abastecimento de água potável, internet, luz elétrica, telefonia, serviços bancários e de correios. 

Sidney Rosa (camisa amarela) foi um dos deputados estaduais que prestigiou a posse da nova diretoria da AMAM. Foto: Joabher Bentes/ASCOM.

Por outro lado, Murilo destacou aquilo que define como oportunidades em meio às adversidades: “Precisamos otimizar o potencial turístico e produtivo de nossos municípios, que são vastos e cheios de riquezas, mas que ainda não foram canalizadas para sanar a miséria e mudar o IDH da região. Para tal, precisamos acelerar a implantação dos matadouros e dos aterros sanitários, bem como a construção de terminais hidroviários e a retomada dos projetos e obras do Estadual e Federal.

Os prefeitos presentes foram unanimes em descrever os inúmeros problemas sociais e econômicos existentes no Marajó, considerando o alto custo amazônico, o que aumenta as despesas das prefeituras que arcam com grande parte dos recursos em áreas fundamentais com a saúde e a educação.

“Para se ter ideia do sufoco que atravessamos, posso citar o exemplo da área da educação, pela qual passamos mais de 10 anos recebendo R$ 0,30 centavos por aluno/dia para a merenda escolar e agora tivemos um aumento de apenas R$ 0,6 centavos. No transporte escolar, temos um custo de R$ 12 reais por aluno/mês, o que em grande parte é pago aos contratos de cerca de 100 embarcações”, concluiu Murilo.

O local do evento ficou pequeno para a quantidade de lideranças presentes no ato de posse da nova diretoria da AMAM. Foto: Joabher Bentes/ASCOM. 

O presidente e os demais prefeitos concordaram que a nova AMAM está acima das cores partidárias e que a gestão deverá se pautar na união dos gestores municipais em projetos coletivos e esse comportamento deverá sobrepor os interesses individuais, acumulando força e representatividade para atrair novos investimentos públicos e privados, gerando emprego, renda e consumo para mais de 500 mil marajoaras, distribuídos nos 16 municípios da região.

Para a liderança do Movimento Marajó Forte, Marluth Fialho, o evento retoma a esperança de um processo de reivindicações que a sociedade civil e a classe política tanto lutam para conquistar, como por exemplo, a criação da Universidade Federal do Marajó, um antigo sonho dos estudantes e população em geral que almeja o desenvolvimento pleno da região.

domingo, dezembro 11, 2016

Amazônia: colônia



Os militares se embeveciam quando comparavam a conquista da Amazônia, que eles promoviam com intensidade desde 1966, com a corrida especial entre americanos e russos. Quando os primeiros cosmonautas contornaram a Terra, dizia-se que lá do alto, de uma distância inimaginável até pouco tempo, eles só conseguiam contemplar duas obras humanas: a muralha da China e a Transamazônica.

A estrada, com mais de dois mil quilômetros de extensão na sua primeira fase, era como um novo abrir do mar Vermelho da mitologia bíblica. Rasgando uma linha de terra batida no meio de uma floresta fechada e até então não penetrada pelo homem, que não se aventurava muito além dos cursos d’água, milhares e milhares de brasileiros desfavorecidos pela sorte, teriam acesso, finalmente, ao sonhado pedaço de terra.

Em um lote de mil por mil metros, ele ingressaria na até então inatingível classe média rural. A Amazônia era o Éden, a Terra Prometida, a Bandeira Verde do imaginário do nordestino, o principal dos imigrantes.

Em 1975, porém, a colonização oficial dirigida pelo governo federal, que aproximaria os homens sem terra da região mais pobre do país à terra sem homens da sua maior fronteira, seria substituída por uma nova diretriz. A Amazônia, ocupando dois terços do território brasileiro, podia abrigar quantos parta ela se deslocassem – não mais, porém, com subsídio estatal. O que Brasília queria era fazer da Amazônia uma usina de dólares.

Seus recursos naturais teriam que se converter em dólares, com os quais o regime militar, finalmente, tornaria realidade seu projeto geopolítico do Brasil Grande, salvaguardado pela doutrina de segurança nacional contra estrangeiros ameaçadores e, sobretudo, maus brasileiros – os críticos, os subversivos, os terroristas.

O “modelo de ocupação” foi definido de forma bem clara no II PDA, um plano de desenvolvimento quinquenal, executado com rigor e conforme a letra do texto, um documento colonialista sem qualquer veleidade de pudor e tergiversação. Era um enunciado tão categórico que continua a ser seguido até hoje, 31 anos depois do fim da ditadura, sob sete presidentes da república democraticamente eleitos, de diversas tendências políticas e ideológicas.

Aquele que era o inimigo do regime ditatorial, o líder operário Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, foi o que mais enalteceu o rigor e eficiência do planejamento tecnocrático dos militares – e o que mais fielmente o seguiu. Secundado por sua sucessora, Dilma Rousseff.

Eles se empenharam em realizar obras semelhantes às apoiadas pelos militares, como as hidrelétricas de Jirau, Santo Antônio e Belo Monte, que, juntas, representam investimento de mais de 60 bilhões de reais, passando por cima de críticos e oponentes com uma determinação que deixaria admirado o principal dos formuladores da estratégia dos militares, o general Ernesto Geisel, citado pessoalmente por Lula com certa reverência.

De fato, desde 1975, as exportações da Amazônia se multiplicaram 15 vezes. O Pará se tornou o sétimo maior exportador do Brasil (já foi o 5º, caindo por causa da brutal queda do principal produto de exportação do país, o minério de ferro, do qual é o vice-líder, abaixo apenas de Minas Gerais) e o terceiro que mais fornece divisas (diferença entre o valor do que exporta e do que importa).

São produtos de baixo valor agregado: matérias primas, commodities. Os mais intensivos, porém, em energia, como alumínio, alumina, minério e a própria energia bruta. O II PDA impôs à Amazônia dupla penalidade: o efeito multiplicador dos produtos que exporta vai ocorrer no país que os importa; além disso, a receita tributária é baixa, impedindo a melhor distribuição dos efeitos econômicos da exploração dos seus vastos recursos naturais.

Em 1996, um golpe profundo foi dado pelo deputado federal (de São Paulo) Antonio Kandir, que integrara como ministro o governo Collor e se bandeara para o PSDB. Ele propôs e conseguiu transformar em lei a isenção completa do principal imposto para Estados e municípios, o ICMS das exportações de matérias primas e produtos semi-elaborados. Por acaso, no ano seguinte o governo Fernando Henrique Cardoso privatizaria a antiga Companhia Vale do Rio Doce, a principal beneficiada pela lei Kandir.

Estados e municípios perderam desde então bilhões de reais. A compensação prevista pela lei nunca foi completa. O pior é que a lei sequer foi regulamentada. No final do mês passado, por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal mandou o Congresso Nacional cumprir uma omissão de quase 13 anos.

O descaso do legislativo era – e continua a ser – com a determinação constitucional de editar lei “fixando critérios, prazos e condições nas quais se dará a compensação aos Estados e ao Distrito Federal da isenção de ICMS sobre as exportações de produtos primários e semi-elaborados”.

Para obrigar o Congresso a assumir sua responsabilidade, o governo do Pará ajuizou no STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, que teve a adesão de mais 15 dos 27 Estados da Federação. Por 11 votos a zero, o plenário do Supremo julgou procedente a ação, acolhendo o voto vencedor do relator, Gilmar Mendes.

A corte fixou prazo de 12 meses para que o Congresso editar lei complementar regulamentando os repasses de recursos da União para os Estados e o Distrito federal em decorrência da desoneração das exportações do ICMS.

Até para lhe diminuir o prejuízo, a Amazônia é tratada pelo poder central como é de verdade, retóricas à parte: uma colônia.

sexta-feira, setembro 09, 2016

Amazônia é o novo Eldorado do Brasil e está pedindo socorro

Diariamente a Amazônia é roubada, morrem pessoas e ninguém se percebe dos riscos para o planeta 

Por Raphael Bevilaqua*, via Justificando

Tão perto de Potosi, tão longe do Sudeste. Segundo estimativas extraoficiais, todo mês, entre 100 a 200kg de ouro são extraídos ilegalmente no leito do rio Madeira - uma draga, sozinha, pode conseguir extrair até 1kg de ouro em um dia. Com a cotação do ouro em R$ 138,00 o grama, é possível dizer que, anualmente, entre 150 e 300 milhões de reais são usurpados só no rio Madeira – os cálculos foram feitos com base nos dados levantados nas últimas operações realizadas para combater o garimpo ilegal (http://glo.bo/2c3tTgg).

Já na zona rural do Estado, a grilagem de terras públicas é o crime mais comum. A colonização do Estado foi fatiada em títulos como CATP’s (contratos de alienação de terras públicas) e CPCV (contratos de promessa de compra e venda). Muitos desses contratos eram elaborados com cláusulas resolutivas, ou seja, exigiam um determinado nível de produtividade. Muitas dessas terras foram abandonadas e sobraram os títulos “podres”, comprados por valores irrisórios por empresas principalmente do sudeste do Brasil, as quais tentam, com eles, obter indenizações milionárias do Poder Público – conheço caso de empresa que “comprou” terra por 1 milhão e que, no ano seguinte, conseguiu indenização de mais de 50 milhões. O maior precatório do Brasil, atualmente, é do Estado de Rondônia (quase de 1 bilhão de reais) – autos 94.00.03579-9, em sede de apelação no TRF1.

A Amazônia é uma das maiores reservas biológicas do planeta, se não a maior. Todo ano, centenas de patentes de produtos obtidos das substâncias orgânicas retiradas ilegalmente do nosso país são registrados e geram royalties que, em muitos casos, são cobrados de nós mesmos. Levam tudo o tempo todo: madeira, plantas, animais – até sangue de indígenas já roubaram, nada mais simbólico (http://bbc.in/2cKiIdQ). 

O 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico da Fauna Silvestres, tendo com base os dados oficiais das apreensões realizadas pelo IBAMA no Brasil antes de 2001, estimou que, a cada ano, o comércio ilegal movimenta em torno de 2 bilhões e 500 milhões de reais, o equivalente a aproximadamente 900 milhões de dólares (http://bit.ly/2cvYfHy). Relatório da ONU indica que entre 30 e 100 bilhões de dólares por ano são movimentados com o tráfico ilegal de madeira no mundo – grande parte vem do Brasil (http://bit.ly/2cL6Qta).

Inúmeras queimadas são promovidas para criar enormes plantations de soja e/ou gado – o número de foco de queimadas em Rondônia aumentou 300% nos últimos dois anos (http://glo.bo/2c3uEpC); esse Estado tem 13 milhões de cabeças de gado, praticamente 10 bois para cada habitante (http://bit.ly/2bZ4LZJ); em 2015, aumentou em 20% o volume produzido e a área cultivada de soja (http://bit.ly/2cjbBYM).

As hidrelétricas construídas no rio Madeira desalojaram milhares de famílias, alagaram outras e devastaram florestas e animais. As compensações sociais são pífias. A energia gerada entra no sistema nacional e, basicamente, alimenta o Sudeste. O valor do ICMS da energia elétrica pago pela empresa – ao contrário de todos os demais produtos – vai para o estado consumidor (São Paulo, principalmente), e não para o produtor – art. 155, X, “b”, da CRFB.

Não, senhores, o processo de acumulação primitiva de capital nunca parou nas bandas de cá. A pilhagem e o saque colonial continuam a todo vapor, quando não no movimento América-Europa, no sentido Norte-Sul do Brasil. As veias da América Latina continuam abertas e o sangue continua sendo drenado. Não há dívida histórica, é verdade, mas porque ela nunca fez parte da história, ela está sendo construída e renovada hoje, todo dia, bem debaixo dos nossos narizes e sem qualquer sofisticação econômica. 

Ainda hoje matamos índios, caçamos negros fugidos e roubamos ouro.

O Norte é o novo Eldorado do Brasil, quiçá da humanidade, e está pedindo, desesperadamente, socorro. Lembrem das nossas matas devastadas, do nosso solo vilipendiado, de nossas águas imoladas e mercuriadas, da nossa carne esquartejada e do nosso sangue derramado - ele ainda está em nossas mãos. 

*Raphael Bevilaqua é Procurador da República em Rondônia. 

segunda-feira, maio 09, 2016

A gigante Vale contra o professor no Pará

Mineradora processa professor universitário, que recebe apoio da comunidade acadêmica internacional. Foto: Alexandra Duarte

A Vale chegou à conclusão de que Medeiros era “o líder” do ato que teria “interditado” a ferrovia.


Por  Felipe Milanez, na Carta Capital

Um trilho, um trem, muito minério nas costas e muita gente na frente. Esse é o caminho diário das milhares de toneladas de minério de ferro que a Vale carrega para exportação do interior da Amazônia, no Pará, para o Terminal Marítimo da Ponta da Madeira, em São Luís, no Maranhão. No percurso o trem cruza índio, quilombola, camponês, floresta...

E enfrenta quase diariamente manifestações das comunidades atingidas. No fim do ano passado, o trem cruzou com um protesto, como tantos que ocorrem. E dessa vez, a Vale mirou em um professor para processar e tirar do caminho.

O professor da Faculdade de Educação do Campo da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA), Evandro Medeiros, participou de um ato de protesto em novembro que ocorreu nos trilhos da Vale, junto de professores, técnicos e estudantes da universidade.

O ato era em solidariedade à população vitima do rompimento da barragem da mineradora Samarco, em Mariana (MG), que provocou o maior desastre ambiental da história do Brasil, e não teria chegado a interromper nenhuma composição de trem, sendo considerado apenas simbólico.


A Samarco é de propriedade da Vale e da BHP Billiton, e as duas gigantes se tornaram alvos imediatos de protesto e cobranças públicas de suas responsabilidades no país todo. Como escrevi ano passado aqui na CartaCapital, há motivos de sobra para quem vive no Pará ter medo de que algo parecido venha a ocorrer.

Através de uma investigação privada (portanto, não realizada pela polícia), baseada em fotografias do ato e em comentários nas redes sociais, a Vale chegou à conclusão, que apresenta como de “autoria e materialidade”, de que Medeiros era “o líder” do ato que teria “interditado” a ferrovia, e como tal, nessa visão, caberia a ele responder criminalmente.

Acusa o professor de praticar algo como “justiça pelas próprias mãos”, e de infringir norma legal ao interromper a circulação dos trens. Para a gigante mineradora, o professor teria sido “responsável pela convocação da população em ato preparatório no Campus 1 da UNIFESSPA, reunião que se comprova com o cartaz anexo divulgado pelo líder da manifestação nas redes sociais.

Para além disso, "exerceu liderança durante a interdição ao coordenar o ato, conforme prova documental”. A companhia propôs então uma “queixa crime” contra o professor.

A primeira audiência desse processo criminal ocorreu na última quinta-feira, 5 de maio, e provocou novos protestos da população contra a Vale, em Marabá, que fecharam, dessa vez, a Rodovia Transamazônica.

A Vale compareceu com seus advogados e Medeiros compareceu assistido por advogados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). O Ministério Público propôs um acordo em que o professor pagaria à mineradora um salario mínimo. A advogada da Vale propôs ao professor prestar serviços comunitários por 15 dias.

Medeiros recusou tanto a oferta do MP quanto da Vale, alegando inocência. E justificou: “Tenho uma vida dedicada a ‘serviços comunitários’, como professor e como cidadão, reconhecido por muitos, por isso ocupo um cargo na pró-reitoria de extensão da UNIFESSPA. Não preciso ser forçado pela Justiça a realizar ações em beneficio de comunidades carentes e setores populares. A mineradora Vale sim, e mesmo assim não atende plenamente as reivindicações dessas comunidades.”

Na última semana passou a circular na internet um grande manifesto de apoio ao professor, com a assinatura de pessoas de peso da academia internacional, como o português Boaventura de Sousa Santos, da Universidade de Coimbra, o peruano Aníbal Quijano, da Universidad de San Marcos, a pedagoga Celi Taffarel, da UFBA, a filósofa Déborah Danowski, da PUC Rio, Carlos Vainer e Henri Ascerald, do IPPUR/UFRJ, e intelectuais ativistas como Jean Pierre Leroy, da FASE, Paulo Fonteles Filho, da Comissão Estadual da Verdade do Pará, a psicanalista Maria Rita Kehl, diversos professores e professoras da UNIFESSPA e da UEPA, da Federal do Maranhão, do Oeste do Pará, UFRJ, e do Brasil todo. Inclusive eu, autor dessa coluna e professor da UFRB, subscrevo o manifesto em solidariedade ao colega professor. O manifesto, que está na plataforma Avaaz, já tem mais de 600 assinaturas.

Procurei a Vale para saber o que acontece e a razão pela qual ela, uma gigante mundial, processa o professor do interior da Amazônia. A informação é de que nesses casos de protestos coletivos, sempre que ocorrem, a Vale procura as lideranças para serem responsabilizadas. A Vale diz que o ato no trilho impediu o transporte de cargas e de passageiros, o que coloca em risco seus compromissos profissionais.

E diz ainda que “está obrigada a requerer judicialmente a desocupação da linha e o restabelecimento das condições de segurança ferroviária em caso de bloqueio do tráfego de trens por terceiros”. 

O professor contesta as acusações. Diz que não havia um líder, que o evento foi organizado coletivamente por pessoas que fazem parte da universidade e dos movimentos sociais.

Manifestação contra a Vale


Ato em solidariedade à população vitima do rompimento da barragem da mineradora Samarco Foto: Alexandra Duarte.
E contesta a investigação privada da companhia que tenta individualizar nele a conduta coletiva e criminalizar o protesto político: “Por que eu? Por que eu sou negro? Por que eu sou maior?”, questiona. E afirma, ao contestar a proposta de um acordo e defender a liberdade de protesto:

“Por isso, por dignidade, respeito aos moradores dessas comunidades impactadas, em solidariedade as vítimas de Mariana e às outras pessoas também processadas e investigadas criminalmente a mando da Vale, contando com o apoio de centenas de colegas professores de universidade e comunidade acadêmica de todo País, eu não aceitei a proposta de conciliação para encerrar o processo. Prefiro responder criminalmente e enfrentar a Vale de cabeça erguida, para mostra para a população de Marabá que a ganância de uma empresa não é maior que a dignidade de um cidadão, muito menos de um povo inteiro.”

Medeiros é um professor conhecido pelo comprometimento com a pedagogia do campo, com a pedagogia transformadora da realidade e com as lutas sociais. Entre os muitos alunos e alunas que o admiram, estava a ambientalista popular Maria do Espírito Santo, que foi assassinada ao lado de seu companheiro José Cláudio Ribeiro da Silva em 24 de maio de 2011. Estudante de especialização em pedagogia do campo, ela dedicou a Medeiros um agradecimento especial ao concluir o seu trabalho de final de curso: “Ao coordenador do curso, Evandro Medeiros, que durante estes anos de formação sempre procurou educadores/as que estivessem imbuídos neste processo de mudanças dos sujeitos do campo.”

Medeiros também é produtor e diretor de filmes que documentam a história da região, como “Dezinho: vida sonho e luta” (2006), sobre o assassinato do líder sindical José Dutra da Costa, no Pará, “Araguaia Campo Sagrado” (2010),  e “Escola Quilombo” (2014).

Ele trabalha o cinema como uma ferramenta de educação e de construção da memória e é organizador do festival internacional de cinema, o CINEFRONT, do qual sou curador. Os filmes são mostrados em escolas da região, em aldeias indígenas, em salas de cinema, no acampamento da juventude do MST na Curva do S, e nos diversos campi da UNIFESSPA.

Por isso, ao mirar em Medeiros e colocá-lo no papel de inimigo a ser processado criminalmente na queixa-crime, a Vale tem provocado uma forte reação contrária da população local, como a que foi demonstrada nos protestos durante a audiência nessa semana, nas redes sociais, na enxurrada de apoio e solidariedade ao professor. Diante disso, não parece que essa ação vai diminuir as insatisfações com a Vale e com o crescimento da mineração no Pará.

A Vale chegou no Pará durante a ditadura e foi o carro-chefe, ou melhor, a “locomotiva” do Projeto Grande Carajás (de 1980), que transformou profundamente a região que veio a se tornar a mais desmatada e violenta em toda a Amazônia.

Nos últimos anos, o aumento massivo da extração e exportação de minério de ferro, em estratégia que serve também para enfrentar o baixo preço das commodities, tem aumentando, também, os conflitos.

A Vale atualmente está expandido as atividades com a nova mina S11D, e duplicando a ferrovia. Se no Plano de Mineração Nacional 2030, de 2011, o governo federal tratava a Amazônia como “a fronteira de expansão da mineração no Brasil” e planejava aumentar a exportação de ferro de 231 milhões de toneladas, previstos para 2015, para 797 milhões de toneladas, em 2030, as principais preocupações estão relacionadas justamente aos “conflitos sobre o uso e a ocupação do território”. Essas preocupações são chamadas pela Vale nos seus relatórios anuais de "risco" da população local.

Risco é uma questão de percepção e perspectiva. O risco que a companhia enxerga é, certamente, diferente do risco e da vulnerabilidade a que está exposta e que é percebida pela população local. Vide Mariana, as 19 pessoas mortas e outras milhares com a vida afetada, o rio morto e o apocalipse ecológico, cuja tragédia, o maior crime ambiental da história do país, completou seis meses.

Abaixo, na íntegra, o manifesto de apoio ao professor e a nota da Vale em resposta à CartaCapital.


Manifesto em apoio ao Professor Evandro Medeiros

Em novembro de 2015, estudantes, técnicos e professores da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA) organizaram um ato em solidariedade aos moradores de Mariana (MG), que, no mesmo mês, sofreram com o rompimento da barragem de rejeitos do Fundão da Samarco/Vale, que causou um dos maiores desastres socioambientais ocorridos no mundo.

O ato, por um lado, questionava as perdas humanas que o desastre provocou, além da destruição de residências, das áreas de produção de alimentos, da floresta, do assoreamento da calha do rio Doce, que aumentou os riscos de enchentes e da presença de metais pesados no rio, provocando riscos de proliferação de doenças crônicas.

Por outro lado, a mobilização também questionava a irresponsabilidade da empresa Samarco, que tem sua composição acionária dividida entre Vale (50%) e a BHP Billiton Brasil Ltda (50%), no tratamento do desastre, uma vez que a mesma não possuía os sistemas de alertas sonoros exigidos por lei, que precisariam ser acionados em caso de desastre, nem uma equipe treinada para assessorar a comunidade após o rompimento da barragem.

O ato promoveu intervenções artísticas, debates e colocou em prática um dos princípios fundamentais da Universidade no Brasil, que é a extensão universitária, princípio este definido pelo Fórum de Pró-Reitorias de Extensão das Universidades Públicas brasileiras como um processo interdisciplinar, educativo, cultural, científico e político que promove a interação transformadora entre Universidade e outros setores da sociedade.

Entretanto, a mineradora Vale, na tentativa de criminalizar o ato, abriu uma Queixa Crime contra o professor Evandro Medeiros da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA) em processo número 0099446-03.201.5 da 1ª Vara de Juizado Especial Penal de Marabá, enquadrando-o no artigo 345 do Código Penal de exercício arbitrário de suas próprias razões.

É necessário afirmar que ato foi uma reunião coletiva para reflexão não havendo, portanto, nenhum tipo de ação violenta que justificasse qualquer denúncia de crime. Por isso, esta queixa crime movida pela mineradora Vale não ataca apenas o professor Evandro Medeiros, mas a autonomia universitária de realização do princípio da Extensão Universitária, bem como também ataca o direito de manifestação e de reunião que é um direito constitucionalmente garantido.

Da mesma forma, outros cidadãos como Tiago Cruz, Iara Reis, João Reis, Waldy Gonçalves Neves e alguns moradores do Bairro Alzira Mutran em Marabá, também são alvos de inquéritos da Polícia Civil, a pedido da Vale, por se organizarem para lutar por seus direitos.

Repudiamos, portanto, as tentativas de intimidação à liberdade de expressão, de reunião e de reflexão, pela via do poder judiciário, empreendidas pela empresa Vale a quem se manifesta contra seus interesses, bem como manifestamos total solidariedade ao professor Evandro Medeiros.

A ganância de uma empresa não pode tornar a pesquisa, reflexão e luta pelos direitos humanos um crime.

Nota da Vale, enviada pela assessoria de imprensa na quinta-feira 5:

O professor Evandro Medeiros é réu em ação movida pela Vale por ter obstruído a Estrada de Ferro Carajás, no dia 20 de novembro, no município de Marabá, em uma manifestação contra o desastre com a barragem da Samarco, em Mariana (MG).

O protesto impediu o transporte de cargas e passageiros. Por dia, cerca de 1.300 pessoas utilizam o trem de passageiros da Vale para se locomover entre os estados do Maranhão e Pará. Para muitos dos 27 municípios a ferrovia é o único meio de transporte da população.

Em casos de obstrução da linha férrea, a empresa precisa adotar os procedimentos judicias para preservar o direito de propriedade e a manutenção do transporte de cargas e passageiros, conforme determinado no contrato de concessão celebrado com a União.

Logo, em cumprimento à legislação vigente, a Vale está obrigada a requerer judicialmente a desocupação da linha e o restabelecimento das condições de segurança ferroviária em caso de bloqueio do tráfego de trens por terceiros.

A pessoa que invade ou obstrui a ferrovia será acionada judicialmente e responderá a inquérito policial e ação penal, podendo gerar uma aplicação de multa diária e prisão, de acordo com a decisão judicial.

É importante ressaltar que a ocupação da ferrovia compromete a segurança das operações e, principalmente, da população, dos empregados e dos usuários do trem de passageiros, tendo em vista que as locomotivas transportam grande quantidade de combustível.

Além disso, um trem, quando carregado, precisa de pelo menos dois quilômetros para parar completamente após o acionamento dos freios de emergência e de 500 metros quando não está carregado. Em caso de manifestações onde há queima de pneus ou madeira, por exemplo, o risco de explosão pode se tornar maior.

A Vale respeita e acredita na livre manifestação e destaca que não ingressa na Justiça com o intuito de proibir protestos ou manifestações de qualquer natureza em relação às suas atividades.

Como forma de buscar soluções conjuntas para a gestão de impactos socioculturais, econômicos e ambientais, e, com vistas ao desenvolvimento sustentável, a empresa mantém equipes dedicadas ao contínuo relacionamento com as comunidades vizinhas às suas operações.

terça-feira, fevereiro 16, 2016

Dilma destrava o "Pedral do Lourenço": Uma obra de meio bilhão de reais

A obra visa destruir as rochas que impedem a navegabilidade do rio Tocantins, possibilitando o escoamento de diversos produtos do Pará para o centro-oeste do país, por cerca de 2200 km de distância, entre os municípios de Marabá e Barcarena.

Por Diógenes Brandão

O ministro dos Portos do governo Dilma, Helder Barbalho participou de mais um capítulo da novela que tem como protagonista a obra conhecida como deslocamento do "Pedral do Lorenço"

Espera-se que desta vez, a empresa que concorreu com outras quatro e foi vencedora do edital, que prevê investimentos do governo federal de cerca de R$ 520 milhões de reais, traga a tão sonhada navegabilidade ao rio Tocantins, o que possibilitará entre outros benefícios, a verticalização da produção mineral e o escoamento da produção agrícola e pecuária da região, que daqui há menos de cinco anos poderá finalmente sair de Marabá, até o porto de Vila do Conde, em Barcarena e de lá para qualquer lugar do mundo, através da logística fluvial.

O Pedral tem 43 quilômetros de extensão e está localizado entre a Ilha do Bogéa e o município de Santa Terezinha do Tauri, no Pará. A obra vai viabilizar o tráfego contínuo de embarcações e comboios em um trecho de 500 quilômetros, desde Marabá até a foz do rio.

Em Brasília, comenta-se que a obra, se sair do papel desta vez, será pela forte intervenção de um senador paraense: Jader Barbalho, líder do PMDB no estado do Pará e com trânsito no Planalto Central e forte influência no Congresso Nacional.

Tal como já havia sido dito aqui, o derrocamento do Pedral do Lourenço, vai permitir a navegabilidade do Rio Tocantins durante todos os meses do ano e associada às eclusas de Tucuruí, a obra vai permitir a navegabilidade em toda extensão da Hidrovia Araguaia Tocantins, facilitando o escoamento de produtos pelos portos da região norte o para centro-oeste brasileiro.

A luta para tirar as obras do Pedral do Lourenço do papel vem se arrastando ao longo dos últimos anos. O projeto chegou a ser incluído e depois retirado do Programa de Aceleração do Crescimento.  

Em vídeo gravado logo após a apresentação da empresa vencedora do edital, o Ministro Helder Barbalho manifestou as vantagens com a interligação de regiões do estado através de mais um modal de transporte: O naval.


E o povo da região, sabe para que serve e o quais mudanças a obra de meio bilhão de reais trará para a região impactada?

Veja o vídeo gravado pela TV RBA de Marabá e tire suas conclusões.


quarta-feira, fevereiro 10, 2016

10 anos depois, PMs corruptos são denunciados por serem contratados para agir contra ribeirinhos na Amazônia



Por Diógenes Brandão

Demorou mais de 10 anos para que os PMs paraenses, usados como capangas, acusados de receber cerca de 150 mil reais para agir em favor de um dos maiores grileiros do país, fossem denunciados pelo Ministério Público do Estado do Pará. Leia aqui a matéria.

Prática nefasta, porém costumaz na Amazônia, como aconteceu com a Chacina de Eldorado dos Carajás, quando PMs assassinaram 19 trabalhadores rurais sem terra, os policiais agiram de forma ilegal e violenta contra ribeirinhos, entre os anos de 2014 e 2015. 

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Altamira denunciou que dez famílias de agricultores e ribeirinhos que viviam há mais de 20 anos ao longo do Rio Xingu, haviam sido impedidas de acessar uma área às margens do Rio Xingu e depois foram expulsas por policiais militares e homens fortemente armados que rondavam a região em embarcações. A ação dos PMs foi realizada sem a apresentação de qualquer mandado judicial ou mandato de qualquer autoridade pública.

A poderosa CR Almeida é uma das maiores empresas que praticam grilagem nas terras da Amazônia e já foi denunciada várias vezes, mas nenhum acionista jamais foi preso. Pelo contrário: Em 2012 a empresa conseguiu vencer na justiça paraense, em uma ação que moveu contra o jornalista Lúcio Flávio Pinto, que lhe obrigou a indenizar a família do falecido empresário Cecílio do Rego Almeida. O crime teria sido chamar de “pirata fundiário” o homem que tentou fraudar e se apropriar ilegalmente de quase 5 milhões de hectares de terras públicas, na região paraense do Xingu, denúncia posteriormente comprovada pelo próprio Estado.

A condenação que mobilizou pessoas e organizações, nacionais e estrangeiras, se deu pelo fato do jornalista fazer uma radiografia minuciosa e crítica da região, o que o tornou um dos maiores especialistas em temas amazônicos, e reportar tentativas de fraudes aos cofres públicos, erros e desmandos do poder judiciário local, o jornalista foi alvo de exatos 33 processos desde 1992.

Lúcio Flávio Pinto já sofreu agressões físicas e verbais por causa de seus artigos, sem declinar o direito de veicular informações de interesse público, em seu Jornal Pessoal jornal quinzenal reconhecido pela qualidade do conteúdo em detrimento de uma produção quase artesanal.

Em seu blog, Lúcio Flávio Pinto mantém a esperança de um dia ter a reparação da injustiça pela qual foi vítima, no exercício do seu labor jornalístico, sempre em defesa da Amazônia:

"Acrescento que fui condenado a indenizar Cecílio Rego de Almeida, dono da C. R. Almeida, por tê-lo acusado de ter grilado a enorme área de terras, rica em mogno, minérios e solos férteis, que declarava como sendo de sua propriedade, no vale do Xingu.

Apesar de todas as provas que apresentei, e que serviram de base para a ação do Ministério Público Federal para o cancelamento do registro em nome do empresário, a condenação foi mantida em todas as instâncias da justiça estadual.

Resta agora acompanhar a tramitação da ação do promotor Armando Brasil para verificar se a justiça do Pará vai se manter em contradição. Se reconhecer que os PMs cometeram crime ao dar cobertura à grilagem, a maior da história da apropriação por particulares de terra pública (da história mundial e não só do Brasil), ficará na vexatória posição de ter condenado quem denunciou esse vergonhoso assalto ao patrimônio público.

A história registrará com nódoa os nomes dos magistrados que cometeram esse atentado à verdade e ao interesse do povo do Pará", finaliza o nobre jornalista.

segunda-feira, fevereiro 01, 2016

Barco naufragou quarta-feira no Marajó. Governo Jatene só agiu neste domingo

Embarcação naufragou no Marajó com seis pessoas que eram município de Vigia, região nordeste do Pará.

Sob o título Embarcação naufraga e cinco estão desaparecidos, via Diário OnLine

A embarcação Marinheiro de Vigia naufragou em Soure, no Marajó, no rio Rabo da Onça, na última quarta-feira (27) com seis pessoas a bordo.

Contudo, a Marinha do Brasil, através da Capitania dos Portos da Amazônia Oriental (Cpaor), informou que tomou conhecimento do acidente apenas na noite de ontem (30) e as buscas só foram iniciadas neste domingo (31).

Um helicóptero do Corpo de Bombeiros Militar (CBM), que não havia decolado por questões climáticas, foi enviado para auxiliar nas buscas. As buscas encerraram na noite deste domingo (31) e ninguém foi encontrado. O trabalho para tentar localizar as vítimas retornará na manhã de segunda-feira (1º). 

Moradores e familiares das vítimas chegaram a interditar a rodovia PA-14, neste domingo, que dá acesso ao município de Vigia, reivindicando a demora na localização dos tripulantes. A via foi liberada após o helicóptero do Corpo de Bombeiros Militar chegar no local. 

Em nota, a CPAOR esclareceu que "tomou conhecimento, por volta das 20h do dia 30 de janeiro, do naufrágio de uma embarcação pesqueira de nome 'Marinheiro de Vigia', com seis tripulantes a bordo. O naufrágio teria ocorrido por volta das 5h da manhã do dia 27 de janeiro."

A nota ainda afirma que "um dos tripulantes, que se encontrava flutuando com uma bóia de rede de pesca, foi resgatado por uma embarcação que navegava nas proximidades do Cabo Maguari, próximo à Ilha do Marajó. Os outros cinco tripulantes permanecem desaparecidos." 

Finalmente, "o sobrevivente resgatado chegou a Icoaraci por volta de 00h do dia de hoje (31). Devido ao fato de estar muito debilitado, não resistiu e faleceu na manhã de hoje" e "um Inquérito Administrativo será instaurado, visando apurar as causas do ocorrido."

De acordo com o CBM, todos os ocupantes da embarcação residiam no município de Vigia, no nordeste paraense, localidade de onde a embarcação saiu.

A embarcação, inclusive, já foi localizada, porém, não havia ninguém em seu interior.

Segundo alguns moradores de Vigia, um helicóptero do governo do Estado foi solicitado pela prefeitura do município para dar apoio nas buscas, mas teria sido negado, o que provocou uma manifestação e o bloqueio da entrada do município até a chegada do veículo.

Por telefone, o CBM informou que o helicóptero não decolou por questões climáticas, mas que foi cedido para ajudar no resgate, chegando ao local do acidente durante o período da tarde.

O CBM, juntamente com a Cpaor, continuam na região fazendo as buscas. No entanto, com o avanço da noite, as buscas devem ser encerradas por causa da baixa visibilidade e serão retomadas somente na manhã de segunda-feira (1º).

Ainda não há informações sobre o que pode ter provocado o acidente com a embarcação. 

sexta-feira, janeiro 08, 2016

Favela Amazônia: A SELVA SE URBANIZA


Vencedor do Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo 2015, que distingue trabalhos de defesa da vida e denúncias de violações, o caderno especial "Favela Amazônia, um novo retrato da floresta" foi destacado na categoria reportagem. A premiação é concedida desde 1984 pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Ordem dos Advogados do Brasil, seção Rio Grande do Sul, e Associação dos Repórteres Fotográficos do Brasil. 

O caderno publicado em Julho de 2015, com a escrita de Leonencio Nossa e fotografia de Dida Sampaio, também conquistou o prêmio Esso Regional Sudeste, atual ExxonMobil, e Vladimir Hersog de Anistia e Direitos Humanos. 

O blog AS FALAS DA PÓLIS publicará os 11 capítulos do caderno do Estadão, começando com o primeiro, abaixo:


Do facão caiapó ao robô-metralhadora do grafite

Um terço da população das grandes e médias cidades da Amazônia vive em territórios do tráfico e com violações de direitos humanos. Nas periferias da maior floresta tropical, a qualidade de vida é pior que nos morros e nas favelas de Rio de Janeiro e São Paulo. O Estado encontrou uma nova realidade na Região Norte, onde máfias desviam cartões do Bolsa Família e da Previdência, grupos manipulam relatórios de vacina e mortalidade infantil e milícias tomam o espaço dos antigos pistoleiros. Diante do aumento do êxodo provocado por políticas públicas, a fronteira e a mata perdem moradores e os assassinatos de em-teto nas periferias superam homicídios por disputas de terra. Em defesa de seus direitos, uma nova geração de lideranças sociais desafia poderes paralelos nos centros urbanos amazônicos.

empo de crime, fúria e ódio extremos na floresta. A Amazônia revive a explosão da violência urbana de morros, subúrbios e periferias de Rio de Janeiro e São Paulo dos anos 1980, a “década perdida”. Hoje, 37,4% da população das 62 cidades com mais de 50 mil habitantes da Região Norte mora em áreas ocupadas pelo tráfico de drogas, em que a reportagem teve de pedir autorização para entrar.
Levantamento do Estado confrontou mapas de devastação ambiental, dados de prefeituras, relatórios de secretarias estaduais de segurança pública e depoimentos de autoridades e ativistas sociais. Há um paradoxo. No momento em que está mais conectada, com a expansão do uso do celular e da internet, a floresta se afasta da curva da melhoria de vida do Centro-Oeste, Sudeste, Sul e Nordeste.

A Amazônia que gerou discursos acalorados sobre uma possível internacionalização de seu território é hoje uma “colcha” de áreas onde o Estado brasileiro não entra com seus agentes de segurança, muito menos com os profissionais de saúde e educação.

Ao contrário do que temiam nacionalistas e militares, o território proibido não foi fechado por governos estrangeiros, mas pelos pequenos poderes internos. Por sua dimensão, a floresta resistiu em boa medida e continua de pé em muitos trechos. O homem que vive nela, porém, está sem assistência. Na era da tecnologia e das redes sociais, os brasileiros da “margem da história”, termo usado por Euclides da Cunha durante expedição aos Rios Madeira e Javari no começo do século passado, estão hoje em periferias não menos isoladas. A briga na Amazônia por direitos garantidos há décadas nas outras partes do País continua.

A ausência de uma rede de proteção social forte da sociedade civil e do poder público torna as favelas amazônicas – conhecidas por baixadas, quebradas e invasões – mais distantes dos setores produtivos e empregos que as ocupações urbanas de regiões desenvolvidas do País. As mortes por armas de fogo registradas no Mapa da Violência 2015 não deixam dúvida: a Região Norte teve um aumento de 135,7% nos homicídios de 2002 a 2012, período em que Rio e São Paulo, no Sudeste, apresentaram quedas superiores a 50%. O estudo foi elaborado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), com dados do Ministério da Saúde.

O sistema de produção baseado nas grandes obras de infraestrutura, que rendem empregos em massa, mas temporários, e das commodities da pecuária, da mineração e da soja não garantiu uma economia inclusiva. O mercado de trabalho não cresce no automático em volta dos projetos. Por outro lado, os programas federais de distribuição de renda por meio de transferências diretas nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, que transformaram para melhor o sertão nordestino, não atendem à complexa realidade amazônica.

Na abertura da Belém-Brasília, estrada que liga Anápolis a Marabá, em 1960, a Amazônia Legal, que compreende os Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Roraima, Rondônia, Mato Grosso, Pará, Tocantins e parte do Maranhão, tinha 35% de população urbana. Esse porcentual aumentou para 44% em 1980, 58% na década seguinte e 69% em 2000. Hoje, com 24 milhões de habitantes, essa área tem quase 80% de moradores nas cidades. A ascendência constante da curva mostra que a política para atender a demandas de energia e transporte de outros centros do País iniciada no governo Juscelino Kubitschek se manteve no regime militar e na democracia e, com ela, o êxodo e a concentração de terras.

O Brasil da indústria e do desenvolvimento que começou a ser implementado um pouco antes, pelo presidente Getúlio Vargas, nunca conviveu com a ideia da floresta em pé. A exceção, por mais estranho que possa parecer, ocorreu no curto e tumultuado mandato de Fernando Collor (1990-1992), quando foram demarcadas as maiores áreas indígenas do País.

É preciso esclarecer que as histórias relatadas neste caderno estão visíveis em forma de números nos relatórios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas, embora a Amazônia seja mais urbana que rural há duas décadas, os flagelos de suas cidades costumam ser encobertos pelos problemas do “paraíso verde” desde que a índia Tuíra Caiapó encostou um facão, em 1989, no rosto do então presidente da Eletrobrás, José Antonio Muniz Lopes, num protesto contra uma hidrelétrica no Xingu. Foi bem antes de Gaby Amarantos, uma cantora dos bares e da sacristia da Igreja Católica de Jurunas, quinta maior favela do Brasil, sair de Belém e estourar com Ex Mai Love e Xirley, hits da música tecnobrega.

Na Amazônia, o avanço da urbanização também resultou em encontros ainda que forçados de culturas e tradições. Com um passado recente marcado pelo extermínio de guerrilheiros, sindicalistas rurais, líderes sem-terra e religiosos das bases católicas da esquerda, a região vive um novo momento de mobilizações sociais. É a “cena” de uma geração sem vínculos com entidades nacionais, que se articula nas redes sociais e orbita em volta da cultura em reação à violência e às desigualdades. Grafiteiros desenham robôs-metralhadora nos muros das cidades. Jovens lideranças indígenas tentam tirar a Fundação Nacional do Índio (Funai) do ostracismo. Na nova floresta, uma teia de solidariedade, ainda que frágil, expressa-se por meio das batalhas de rap, do ritmo da dança do “free step”, da música das “aparelhagens” de som, da atuação dos hackers do software livre e do trabalho dos documentaristas independentes. A região que deu novas formas à cultura nacional, com os livros e as viagens de Euclides da Cunha, Mário de Andrade, Raul Bopp e Dalcídio Jurandir, mostra na atualidade uma arte de resistência.

A nova geração de ativistas sociais não usufrui da atenção do exterior para a floresta. Nas últimas duas décadas, a Amazônia perdeu o status de área de preocupação ambiental. A mata tropical enfrenta a concorrência do degelo, do efeito estufa e das mudanças climáticas no debate internacional. Isso ocorre mesmo sendo a região reservatório de 20% de água doce da Terra. Viajar pela floresta, após o “boom” ambientalista do final dos anos 1980 e começo dos 1990, quando o cacique Raoni subia aos palcos com o cantor Sting e Jacques Cousteau surpreendia com suas aventuras nos rios caudalosos, é encontrar um mundo de mazelas conhecidas de quem vive nas metrópoles. A região também deixou de receber recursos na área social de entidades e governos europeus, que, em meio à crise financeira internacional, focam os investimentos na África, deixando o Brasil das conquistas da era de consolidação do real e do governo Lula em segundo plano.

Como foi realizado o levantamento

Os mapas de desmatamento podem revelar o poder do crime nas cidades. O levantamento da influência dos comandos do tráfico de drogas na vida dos moradores da Região Norte usou dados de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Imazon de queimadas, mapas de bairros de prefeituras, relatórios de criminalidade de secretarias estaduais de segurança pública e depoimentos.

Foram utilizados registros de 39 municípios do Pará, oito do Amazonas, sete de Rondônia, três do Tocantins, dois do Amapá, dois do Acre e um de Roraima. Com a lista das cidades mais habitadas, recorremos às prefeituras e ao IBGE para obter nomes de bairros e invasões, tamanhos de área e número de moradores. Em Belém, por exemplo, foram analisados 70 bairros – do Guamá, com 94 mil pessoas, ao Maraú, de apenas cem habitantes. Autoridades da segurança pública, delegados de polícia, ativistas sociais e, nos casos das cidades visitadas, moradores foram ouvidos para falar sobre a situação de cada área do bairro e de manchas urbanas dos municípios. Nos casos dos bairros com mais de 15 mil pessoas, o peso dado aos depoimentos de agentes de segurança foi maior para estipular quantos moradores viviam em trechos de risco.

Não é incomum, especialmente na área metropolitana de Belém, que milícias – grupos de policiais ou ex-policiais que agem por conta própria na segurança de empresas e moradores e em ações de extermínio e venda ilegal de armas e munições – atuem nas áreas do tráfico. Às vezes, ocorre também de o homem da milícia ser um negociante de drogas. Em muitos bairros da capital paraense, não é possível definir o território de traficantes ou milicianos.

Por utilizar depoimentos orais, a pesquisa sugeriu que um número mais exato só é possível em recortes específicos de datas. Campanhas das forças repressivas do Estado podem alterar o mapa de atuação de gangues e traficantes a qualquer momento, muito embora tenham se solidificado nas capitais áreas históricas dominadas pelo crime. É o caso da Estrada Jurunas, com 64 mil pessoas, onde a falta de planejamento urbano e as mazelas sociais isolaram a população de benefícios básicos de atendimento do poder público. O recorte utilizado nesta reportagem foi o mês de maio deste ano. As atualizações começaram assim que os registros foram sendo coletados, a partir de agosto de 2014.

Sem valor e rigidez de uma pesquisa acadêmica ou oficial, esse levantamento é apenas uma sugestão de análise sobre o que ocorre em Manaus, Belém, Ananindeua, Porto Velho, Macapá e Rio Branco, para citar as seis cidades com mais de 400 mil moradores. Em Marabá, de 243 mil pessoas, foi constatado que o tráfico está presente na vida de 43% da população. O prefeito João Salame (PROS) faz uma análise “mais conservadora” e estima que um terço da cidade estaria nessa situação. Ele levanta o porcentual ao mapear a população que está em ocupações irregulares, áreas mais propícias ao crime.

terça-feira, janeiro 05, 2016

Mineração está matando outro grande rio no Pará. Quem liga?


O Rio Tapajós como está hoje, o verde-azul de suas águas vai ficando amarelado por causa da poluição avassaladora dos garimpos ilegais. Desastre econômico, à saúde pública, aos cardumes e ao turismo. (Foto: Nilson Vieira).

Por Manoel Dutra em seu blog, sob o título "A morte anunciada chegou: Adeus Tapajós, adeus encontro das águas, adeus praias, adeus Alter do Chão..." 

De nada adiantou mostrar, pedir, denunciar, publicar carta aberta ao governador do Estado, fazer abaixo-assinado, solicitar a interferência do vice-governador que nasceu às margens do Tapajós, prefeitos, vereadores, deputados. Até mesmo parte da sociedade da região Oeste do Pará parece ter imaginado que isso nunca aconteceria, aliás, que isso nunca se repetiria, como se verificou há quase três décadas: a contaminação de mais de 700 quilômetros de extensão do Rio Tapajós e de seus principais afluentes chegou à sua foz, diante de Santarém.

E agora, como ficará a nascente indústria do turismo que hoje emprega milhares de pessoas ao longo do rio entre Santarém e Itaituba? E a saúde pública, ameaçada pela contaminação dos cardumes por metilmercúrio? E a economia, de modo geral, do Oeste do Estado? E as decantadas belezas daquela região, que atrai os próprios moradores e visitantes de muitas outras partes do Brasil e do exterior? 

Talvez ainda agora, hoje, alguém haverá de negar a realidade que está aí diante dos olhos: a poluição por barro, mercúrio, cianeto, sabões, detergentes, graxas e combustíveis tudo isso está agora chegando à frente de Santarém, matando o o encontro das águas e fazendo desaparecer a coloração verde/azulada cuja beleza sempre foi uma das características da foz do Tapajós, onde o grande rio deságua no Amazonas.

Esta era a cor do Tapajós, na sua foz, até novembro passado, na foz, local em que ele deságua no Amazonas, de cor naturalmente amarelada. (Foto: Nil Vieira).
Hoje de manhã, o engenheiro agrônomo Nilson Vieira, uma voz quase solitária a mostrar a devastação das fontes de vida e beleza do Oeste do Pará, em sua página do Facebook, escreveu o que segue:

"As duas primeiras imagens foram feitas hoje (29/03/15) e mostram o Rio Tapajós com águas sem as cores verde-azuladas que lhe são características. As duas outras foram feitas em um passado bem recente, em agosto e novembro de 2014, apresentando cores bem típicas. Segundo moradores das margens do Tapajós, isso não resulta de um fenômeno natural, sendo consequência da atividade garimpeira no leito do Tapajós e de seus afluentes. Pelo jeito, a mistura de barro, lama e metais pesados chegou à foz do nosso lindo rio azul. E agora, José?" 

Na frente de Itaituba, o Tapajós feito lama, em foto do dia 11 de março passado. Na imagem menor, à direita, o rio como ele foi até pouco tempo atrás. (blog José Parente).
Imagem do Tapajós e do lago de Alter do Chão, de dentro de um avião comercial, em setembro de 2012. À esquerda, a 600 metros de altura, já era possível observar a mudança de cor do Tapajós.

Alter do Chão, em setembro de 2013. Ainda se via a cor natural do rio. E agora, turismo?
Tapajós na frente de Itaituba, em dezembro de 2014. Um mar de lama, sem peixes. Rio morto. (Foto Padre Sidney Canto).

Crise: Edmilson Rodrigues perde seu braço esquerdo no PSOL

Luiz Araújo deixou o PT para fundar o PSOL, onde viveu até então organizando a corrente interna "Primavera Socialista" e supostame...