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sábado, março 17, 2018

Até quando vamos assistir calados a perseguição aos que lutam por justiça e paz?



Por Fidelis Martins Paixão*

Quando 8 garotos foram chacinados na Candelária (Rio) em 1993, nós ouvimos que eram trombadinhas, zé droguinhas. 

Quando Paulo Fonteles, o advogado de posseiros que lutavam pela reforma agrária, foi assassinado em 1987 em Belém (Pará), nós ouvimos que se tratava de um comunista, subversivo e desordeiro. 

Quando Chico Mendes, o seringalista e sindicalista, foi assassinado em 1988 em Xapuri (Acre), nós ouvimos que se tratava de um subversivo, criador de casos. 

Quando João Batista, o deputado do povo, que apoiava o movimento dos sem-terra, foi assassinado também em 1988 em Belém (Pará), nós ouvimos que se tratava de um socialista, desordeiro e subversivo. 

Quando aconteceu o Massacre de Eldorado dos Carajás (Pará) em 1996 com o assassinato de 19 agricultores que lutavam pelo direito a um pedaço de terra para plantar, colher e viver, nós ouvimos que se tratavam de desordeiros e invasores. 

Quando a missionária irmã Dorothy Stang foi assassinada em 2005 em Anapu (Pará), nós ouvimos que se tratava de uma freira subversiva que apoiava vagabundos. 

Quando o ambientalista Dionísio Ribeiro foi assassinado em 2005, por fazer denúncias de uso irregular da Reserva Biológica do Tinguá (Rio), nós ouvimos que se tratava de um lunático que vivia no meio do mato criando caso. 

Quando Raimundo Santos, agricultor e ambientalista, foi assassinado em 2015 em Buriticupu (Maranhão), por denunciar uso irregular da Rebio Gurupi, nós ouvimos que se tratava de um loteador e criador de casos. 

Agora que Marielle Franco foi assassinada no Rio de Janeiro, estamos ouvindo que se trata de “comoção seletiva”. 

E aqui eu citei apenas nove dos inúmeros heróis e heroínas que lutam no dia-a-dia defendendo os pobres, os excluídos, o meio ambiente, vozes daqueles que estão sem voz! Até quando os veremos clamar no deserto, como o outro João Batista, decapitado por incomodar a realeza, a elite e o sistema da sua terra? 

O mesmo espírito que justificou a morte, que desdenhou, que menosprezou o assassinato de cada um deles, desde séculos imemoriais, continua atuando em nosso meio, por isso não podemos nos calar, nem perder a fé comprometida daqueles que lutam sim, por um mundo melhor, por justiça e paz. 

Não a paz fictícia que emudece os vencidos, mas a paz que se concretiza na solidariedade, que vence a injustiça na construção de um mundo melhor!

*Fidelis Martins Paixão é advogado, ambientalista, conselheiro nacional do meio ambiente (CONAMA) e pesquisador no Programa Interdisciplinar Trópico em Movimento (UFPA).

segunda-feira, janeiro 08, 2018

A foto do dia



Por Diógenes Brandão

Agora em Porto Alegre (RS), em frente ao TRF4 foi estendida uma faixa de 40 metros, com cada letra de 1,30m por 1,04m. Confeccionada manualmente por 04 artesãs e mais 20 pessoas, a mensagem é direcionada aos magistrados que julgarão o recurso da defesa de Lula, onde pedem a nulidade da condenação proferida pelo juiz Sérgio Moro, que estabeleceu 9 anos de prisão ao ex-presidente do Brasil.

terça-feira, agosto 08, 2017

Urgente: Justiça manda soltar policiais acusados do Massacre de Pau D’Arco



Por Diógenes Brandão, com informações da assessoria jurídica das famílias das vítimas

A assessoria jurídica dos familiares das vítimas do Massacre de Pau D'Arco denuncia ao blog AS FALAS DA PÓLIS, que as testemunhas que presenciaram o ato de violência extrema no acampamento e os parentes dos dez trabalhadores rurais mortos, estão com medo e sob grande risco de vida.

O motivo seria a decisão do juiz substituto Jun Kubota, tomada hoje, de conceder a liberdade aos 13 policiais acusados do crime. A prisão temporária havia sido pedida há um mês, mas o Ministério Público solicitou a prorrogação ontem (9), enquanto conclui o inquérito no qual apresentará a denúncia formal contra os acusados. A reclusão era exatamente uma estratégia para assegurar que as investigações seguissem sem interferência, assim como para resguardar todas as pessoas envolvidas no caso.

A liberação dos acusados se torna ainda mais estranha por ter ido em uma direção completamente oposta da tomada pelo juiz titular da vara, Haroldo Fonseca; Kubota assumiu o caso por causa das férias dele. O promotor Leonardo Jorge Lima Caldas lamenta a decisão e deixa claro que ela afetará as investigações. “Temos diversas testemunhas que apenas falaram após a prisão temporária. As investigações caminharam muito após isso. A soltura dos acusados certamente afetará o nosso trabalho”, afirma o promotor, que é um dos três que cuidam da investigação.

Leia a decisão do juiz substituto Jun Kubota




domingo, julho 30, 2017

Justiça suspende ação contra Samarco/VALE e prova que o dinheiro compra tudo

A decisão da justiça de MG é inacreditável e deixa o Brasil em situação vexatória

Por Diógenes Brandão

Em publicação no Facebook, o GreenPeace revela: "Justiça mineira suspende ação civil pública contra Samarco movida pela procuradoria. A justiça de Minas mostra que está ao lado de Vale e BHP e não concede indenizações pelo maior desastre socioambiental do Brasil". 

Ou seja, a justiça mineira nos prova, que de fato, o dinheiro compra tudo. No país, onde milhares de pessoas são presas por roubar comida, empresas responsáveis por prejuízos incalculáveis, conseguem driblar as leis e zombar da razão.

A Folha de São Paulo trouxe a informação abaixo e este blog que existe há mais de dez anos, demorou a acreditar, mas é verdade.

Leia e comente se for capaz: 

A Justiça suspendeu por prazo indeterminado a ação civil pública movida pelo MPF (Ministério Público Federal) contra a Samarco no processo relacionado ao rompimento da barragem de Fundão. 

A informação foi divulgada em comunicado da Vale nesta terça-feira (18). O MPF não foi localizado para comentar.  

Na ação, de maio de 2016, procuradores pediram indenizações de R$ 155 bilhões como reparação pelo desastre ambiental gerado após a ruptura da barragem em Mariana (MG), em novembro de 2015. 

Os valores seriam usados para reparação dos danos sociais, econômicos e ambientais causados pelo rompimento da barragem de Fundão. Inicialmente, seriam depositados R$ 7,7 bilhões. A decisão é da 12ª Vara Federal Cível/Agrária de MG, de segunda-feira (17).  

A Vale é sócia da BHP Billiton na Samarco, e informou que está mantida decisão judicial anterior que prorroga até 30 de outubro acordo final sobre as indenizações relativas ao caso. A reportagem tentou contato com o Ministério Público Federal no final desta terça, sem sucesso.

sexta-feira, janeiro 27, 2017

Lula: Por que querem me condenar



Em mais de 40 anos de atuação pública, minha vida pessoal foi permanentemente vasculhada -pelos órgãos de segurança, pelos adversários políticos, pela imprensa. Por lutar pela liberdade de organização dos trabalhadores, cheguei a ser preso, condenado como subversivo pela infame Lei de Segurança Nacional da ditadura. Mas jamais encontraram um ato desonesto de minha parte.

Sei o que fiz antes, durante e depois de ter sido presidente. Nunca fiz nada ilegal, nada que pudesse manchar a minha história. Governei o Brasil com seriedade e dedicação, porque sabia que um trabalhador não podia falhar na Presidência. As falsas acusações que me lançaram não visavam exatamente a minha pessoa, mas o projeto político que sempre representei: de um Brasil mais justo, com oportunidades para todos.

Às vésperas de completar 71 anos, vejo meu nome no centro de uma verdadeira caçada judicial. Devassaram minhas contas pessoais, as de minha esposa e de meus filhos; grampearam meus telefonemas e divulgaram o conteúdo; invadiram minha casa e conduziram-me à força para depor, sem motivo razoável e sem base legal. Estão à procura de um crime, para me acusar, mas não encontraram e nem vão encontrar.

Desde que essa caçada começou, na campanha presidencial de 2014, percorro os caminhos da Justiça sem abrir mão de minha agenda. Continuo viajando pelo país, ao encontro dos sindicatos, dos movimentos sociais, dos partidos, para debater e defender o projeto de transformação do Brasil. Não parei para me lamentar e nem desisti da luta por igualdade e justiça social.

Nestes encontros renovo minha fé no povo brasileiro e no futuro do país. Constato que está viva na memória de nossa gente cada conquista alcançada nos governos do PT: o Bolsa Família, o Luz Para Todos, o Minha Casa, Minha Vida, o novo Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), o Programa de Aquisição de Alimentos, a valorização dos salários -em conjunto, proporcionaram a maior ascensão social de todos os tempos.

Nossa gente não esquecerá dos milhões de jovens pobres e negros que tiveram acesso ao ensino superior. Vai resistir aos retrocessos porque o Brasil quer mais, e não menos direitos.

Não posso me calar, porém, diante dos abusos cometidos por agentes do Estado que usam a lei como instrumento de perseguição política. Basta observar a reta final das eleições municipais para constatar a caçada ao PT: a aceitação de uma denúncia contra mim, cinco dias depois de apresentada, e a prisão de dois ex-ministros de meu governo foram episódios espetaculosos que certamente interferiram no resultado do pleito.

Jamais pratiquei, autorizei ou me beneficiei de atos ilícitos na Petrobras ou em qualquer outro setor do governo. Desde a campanha eleitoral de 2014, trabalha-se a narrativa de ser o PT não mais partido, mas uma "organização criminosa", e eu o chefe dessa organização. Essa ideia foi martelada sem descanso por manchetes, capas de revista, rádio e televisão. Precisa ser provada à força, já que "não há fatos, mas convicções".

Não descarto que meus acusadores acreditem nessa tese maliciosa, talvez julgando os demais por seu próprio código moral. Mas salta aos olhos até mesmo a desproporção entre os bilionários desvios investigados e o que apontam como suposto butim do "chefe", evidenciando a falácia do enredo.

Percebo, também, uma perigosa ignorância de agentes da lei quanto ao funcionamento do governo e das instituições. Cheguei a essa conclusão nos depoimentos que prestei a delegados e promotores que não sabiam como funciona um governo de coalizão, como tramita uma medida provisória, como se procede numa licitação, como se dá a análise e aprovação, colegiada e técnica, de financiamentos em um banco público, como o BNDES.

De resto, nesses depoimentos, nada se perguntou de objetivo sobre as hipóteses da acusação. Tenho mesmo a impressão de que não passaram de ritos burocráticos vazios, para cumprir etapas e atender às formalidades do processo. Definitivamente, não serviram ao exercício concreto do direito de defesa.

Passados dois anos de operações, sempre vazadas com estardalhaço, não conseguiram encontrar nada capaz de vincular meu nome aos desvios investigados. Nenhum centavo não declarado em minhas contas, nenhuma empresa de fachada, nenhuma conta secreta.

Há 20 anos moro no mesmo apartamento em São Bernardo. Entre as dezenas de réus delatores, nenhum disse que tratou de algo ilegal ou desonesto comigo, a despeito da insistência dos agentes públicos para que o façam, até mesmo como condição para obter benefícios.

A leviandade, a desproporção e a falta de base legal das denúncias surpreendem e causam indignação, bem como a sofreguidão com que são processadas em juízo. Não mais se importam com fatos, provas, normas do processo. Denunciam e processam por mera convicção -é grave que as instâncias superiores e os órgãos de controle funcional não tomem providências contra os abusos.

Acusam-me, por exemplo, de ter ganho ilicitamente um apartamento que nunca me pertenceu -e não pertenceu pela simples razão de que não quis comprá-lo quando me foi oferecida a oportunidade, nem mesmo depois das reformas que, obviamente, seriam acrescentadas ao preço. Como é impossível demonstrar que a propriedade seria minha, pois nunca foi, acusam-me então de ocultá-la, num enredo surreal.

Acusam-me de corrupção por ter proferido palestras para empresas investigadas na Operação Lava Jato. Como posso ser acusado de corrupção, se não sou mais agente público desde 2011, quando comecei a dar palestras? E que relação pode haver entre os desvios da Petrobras e as apresentações, todas documentadas, que fiz para 42 empresas e organizações de diversos setores, não apenas as cinco investigadas, cobrando preço fixo e recolhendo impostos?

Meus acusadores sabem que não roubei, não fui corrompido nem tentei obstruir a Justiça, mas não podem admitir. Não podem recuar depois do massacre que promoveram na mídia. Tornaram-se prisioneiros das mentiras que criaram, na maioria das vezes a partir de reportagens facciosas e mal apuradas. Estão condenados a condenar e devem avaliar que, se não me prenderem, serão eles os desmoralizados perante a opinião pública.

Tento compreender esta caçada como parte da disputa política, muito embora seja um método repugnante de luta. Não é o Lula que pretendem condenar: é o projeto político que represento junto com milhões de brasileiros. Na tentativa de destruir uma corrente de pensamento, estão destruindo os fundamentos da democracia no Brasil.

É necessário frisar que nós, do PT, sempre apoiamos a investigação, o julgamento e a punição de quem desvia dinheiro do povo. Não é uma afirmação retórica: nós combatemos a corrupção na prática.

Ninguém atuou tanto para criar mecanismos de transparência e controle de verbas públicas, para fortalecer a Polícia Federal, a Receita e o Ministério Público, para aprovar no Congresso leis mais eficazes contra a corrupção e o crime organizado. Isso é reconhecido até mesmo pelos procuradores que nos acusam.

Tenho a consciência tranquila e o reconhecimento do povo. Confio que cedo ou tarde a Justiça e a verdade prevalecerão, nem que seja nos livros de história. O que me preocupa, e a todos os democratas, são as contínuas violações ao Estado de Direito. É a sombra do estado de exceção que vem se erguendo sobre o país.

quinta-feira, janeiro 19, 2017

Deputados americanos criticam Moro e defendem Lula em carta pública


Na Folha

Um grupo de 12 deputados do Partido Democrata dos Estados Unidos vai divulgar nesta quarta-feira (18) uma carta pública em defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que acusa o juiz Sergio Moro de persegui-lo por meio de decisões "arbitrárias".

A carta, obtida pela Folha, é endereçada ao embaixador do Brasil em Washington, Sergio Amaral, e afirma que o ex-presidente está sendo "perseguido". "Estamos especialmente preocupados com a perseguição do ex-presidente Lula da Silva, que viola as normas de tratados internacionais que garantem o direito da defesa para todos os indivíduos."

"Exortamos as autoridades federais do Brasil a fazer todo o possível para proteger os direitos dos manifestantes, líderes de movimentos sociais e líderes da oposição, como o ex-presidente Lula", diz a missiva.

Segundo o texto, o governo de Michel Temer tem agido "para proteger figuras políticas corruptas, para impor uma série de políticas que nunca seriam apoiadas em uma eleição nacional e pressionar adversários nos movimentos sociais e nos partidos de oposição."

Na carta do grupo liderado pelo deputado democrata John Conyers, os legisladores afirmam que "Lula se mantém como uma das figuras políticas mais populares no Brasil de hoje e é visto como uma série ameaça nas urnas por seus oponentes políticos".

"Nos últimos meses, ele tem sido alvo de uma campanha de calúnias e acusações não comprovadas de corrupção pelos grandes veículos privados de mídia alinhados com as elites do país."

Também assinam a missiva alguns sindicatos e think tanks americanos, entre eles a central sindical AFL-CIO, que tem mais de 12 milhões de membros.

"Lula tem sido alvo de um juiz, Sergio Moro, cujas ações parciais e arbitrárias tem ameaçado seu direito de defesa. Por exemplo, o juiz ordenou a prisão arbitrária [a condução coercitiva, em março de 2016] do ex-presidente só para servir de intimação, embora não houvesse nenhuma indicação de que o ex-presidente não quisesse depor na Justiça. "

O texto critica também a PEC do teto de gastos do governo Temer, dizendo que "vai reverter anos de avanços econômicos e sociais", além de atacar o impeachment de Dilma Rousseff.

Em julho, um grupo de deputados havia publicado uma carta contra o processo de impeachment, assinada por 39 deputados democratas e 20 organizações. 

sábado, janeiro 14, 2017

O mimimi do "ministro da justiça": por que xingar não é melhor que argumentar ou calar

Temer escolheu para o Ministério da Justiça, o ex-advogado do PCC e que com Alckmim agiu com truculência em SP.

Esconder um erro com uma mentira é o mesmo que
substituir uma mancha por um buraco (Aristóteles)

Via Conversa Afiada

Meu sucessor, que a convenção - uma mera convenção, nada mais - manda chamar "ministro da justiça", costuma ser homem de muita lábia - que, no seu caso, não é sábia. Afinal, sua retórica até hoje não foi nada convincente. Inúmeras são suas iniciativas que ultrapassam o limite da prudência e do bom-senso, quando não beiram o mais tosco populismo. Vãs e voláteis são suas palavras, "dust in the wind". Uma vez ditas, não resolvem o problema, mas geram uma pletora de novos problemas, constrangendo seu autor à exposição continuada e à defesa do indefensável.

Ao mesmo tempo, o Sr. Alexandre de Moraes (esse é seu nome, para quem compreensivelmente não consegue vinculá-lo ao cargo) é pessoa de posições duras. Não foge do uso da força bruta contra democratas que desafiam a autoridade de seu grupo. Tout court: as palavras são ocas, mas o cassetete é maciço e de uso frequente.

Isso é muito comum em indivíduos adestrados ("educados" aqui talvez não caiba) com violência física. Crianças que apanham dos pais costumam ser violentas com amiguinhos e até com estranhos. A surra é uma linguagem primitiva: na falta de argumentos convincentes, parte-se para a "porrada", o argumento baculino. Eis a mensagem que muitos pais passam aos filhos, que seguem e transmitem-na como um atavismo pela vida afora.

Ontem fui surpreendido por uma dessas mensagens. O Sr. Moraes, que em menino deve ter levado muita palmada no bumbum, andou espalhando que me processaria para eu "aprender a calar a boca" (secundado, claro, por certo sítio de pornografia política, que na esteira do livro de Diogo Mainardi, um dos seus criadores, mais mereceria o nome de "A Anta onanista").

Inicialmente pensei em lhe escrever mais uma dessas cartas abertas. Depois pensei: para quê jogar pérolas aos... ops, a quem não as merece? Cartas escrevemos aos que possam ter profundas divergências conosco, mas que animam o discurso horizontal direto. Ao Dr. Janot e ao colega Dallagnol, por exemplo. Embora discorde do seu modo de agir, busco publicamente o diálogo, sem deixar de me colocar como vitrine, possível alvo de alguma iniciativa mineral, mas que possa abrir um debate transparente. Nele, a regra é: vença quem convença! Os destinatários são pessoas, cada uma com sua visão institucional. Posso sugerir que baixem a bola, que ajam mais discretamente para fazer o que tenham de fazer. Mas essas pessoas fazem. Gostemos delas ou não, elas são atores centrais do momento político - e merecem, mesmo na saudável divergência, nossa reverência. Cartas são, portanto, uma manifestação de deferência.

Com o Sr. Moraes é diferente. Ele até agora não fez e só é ator se o tal "ministério" que presume dirigir for confundido com um picadeiro. Dizem os repórteres investigativos que é campeão em usar voos da FAB para ir a São Paulo, sua casa; que gosta de despachar mais lá do que cá. Visitou em Curitiba um juiz federal à frente de um complexo de investigações que atinge em cheio vários cúmplices do "governo" por ele integrado. Fez salamaleques ao magistrado, não condizentes com a divisão dos poderes, prevista na Constituição Federal, nem com a estatura que o cargo de ministro de Estado lhe exigiria, pressuposta a seriedade e legitimidade da investidura. As conversas nessa visita não foram públicas. Ensejaram ilações sobre conteúdos nada republicanos.

Depois, em São Paulo, reuniu-se com policiais federais que atuam em operações do mesmo complexo investigativo de Curitiba, também sem qualquer esclarecimento convincente sobre o convescote. A seguir, foi fazer campanha para o candidato de seu partido a prefeito em Ribeirão Preto, terra do ex-ministro Palocci, onde, em diálogo com militantes locais do MBL, anunciou, para a semana em curso, impactante operação. O Sr. Moraes, que se recusa a fazer media training por se achar muito sagaz no trato com os meios de comunicação, chegou a gabar-se: "Teve [operação] [n]a semana passada e esta semana vai ter mais, podem ficar tranquilos. Quando vocês virem esta semana, vão se lembrar de mim”. Não deu outra: naquela semana realizou-se a operação policial lá mesmo, a culminar na prisão de Palocci, adversário político do prefeito apoiado pelo "ministro". Foi um desastre comunicativo, para dizer o mínimo.

Claro, como sugeriria o ministro Gilmar Mendes, mera coincidência! Não teria sido nada mais do que uma previsão do tempo! Haja cinismo! Em verdade, é mais do que legítimo vislumbrar-se no episódio uma politiqueira violação de sigilo funcional para fins de promoção pessoal. E as desculpas que se sucederam não foram nada convincentes.

Hilário foi filmete viralizado na rede, em que o Sr. Moraes, que não deve ser muito afeito a facões (também não sou, mas não poso com elas), capina pés de maconha na fronteira do Paraguai. Lá se vê, sob um sol escaldante, o burocrático lavrador, calvície à mostra, um típico egghead, como diriam os ingleses, cheio de determinação para acabar com a nociva diamba! (Deveria usar um chapéu de palha, para se proteger). Num momento em que o país vive profunda crise de credibilidade das instituições e das autoridades, em que prevalece perplexidade sobre a falta de agenda positiva do que a convenção antes mencionada denomina "governo Temer", o Sr. Moraes brinda a sociedade com populismo barato e investe com desajeitado denodo contra o cultivo da maconha, cujo consumo está prestes a ser liberado por maioria significativa dos ministros do STF. Como diriam os jovens: "sem noção"!

Mas as estripulias não param por aí. O Sr. Moraes tem sido intensamente criticado na mídia por promover uma gestão de ação violenta da polícia e pelo tipo de advocacia a que se dedicou nos intervalos de sua vida pública. Do insuspeito Jornal Extra, do grupo Globo, extrai-se:

"Eduardo Cunha, PCC (Primeiro Comando da Capital) e ocupação estudantil: o que estas três esferas têm em comum? A resposta está em Alexandre de Moraes, escolhido por Michel Temer para ser o novo ministro da Justiça. À sua pasta serão incorporadas as secretarias da Mulher, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Sendo assim, Alexandre comandará o Ministério da Justiça e Cidadania.
Em dezembro de 2014, ele assumiu a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, prometendo o fortalecimento da legislação estadual no setor. No entanto, sua passagem como secretário foi colocada em xeque diversas vezes por conta da violência supostamente excessiva diante de protestos e atos políticos, como, por exemplo, as ocupações estudantis das escolas estaduais, que vêm ocorrendo desde o ano passado.
Em janeiro deste ano, um protesto realizado pelo MPL (Movimento Passe Livre) contra aumento de tarifas foi reprimido de forma ostensiva, o que reservou ao papel de Alexandre uma repercussão negativa diante da opinião pública. Sob sua gestão na secretaria foram utilizados, pela primeira vez, blindados israelenses para enfrentar manifestações. De acordo com dados levantados pela TV Globo, a Polícia Militar foi responsável pela morte de uma em cada quatro pessoas assassinadas no estado paulista em 2015.
Ainda em 2015, reportagem do “Estado de S. Paulo” afirmou que Alexandre constava no Tribunal de Justiça de São Paulo como advogado em pelo menos 123 processos da área civil da Transcooper. A cooperativa é uma das cinco empresas e associações que está presente em uma investigação que trilha movimentações de lavagem de dinheiro e corrupção engendrado pela organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). À época, Alexandre disse, por meio de nota, que “renunciou a todos os processos que atuava como um dos sócios do escritório de advocacia” e que estava de licença da OAB durante o período investigado.
No fim de 2014, pouco antes de assumir a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, o novo ministro da Justiça pouco defendeu Eduardo Cunha, presidente afastado da Câmara dos Deputados, em uma ação sobre uso de documento falso em que conseguiu a absolvição do peemedebista."

Com efeito, na condição de Secretário de Segurança Publica do Estado de São Paulo tornou-se notório defensor do uso desproporcional da força pela polícia que dirigia. Foi nesse período que se deu a violentíssima repressão às manifestações do movimento pelo passe livre. Numa delas, perdeu a vista, atingido no olho por bala de borracha, o midiatista Victor Araújo, que estava, em 7 de setembro de 2013, filmando a repressão policial a movimento de rua em São Paulo. Não se ouviu nenhuma palavra de satisfação ou desculpa. Pelo contrário, a violência excessiva era estimulada pela Secretaria de Segurança Pública dirigida pelo Sr. Moraes. E foram os excessos em São Paulo que espalharam os protestos Brasil afora naquele ano. Mas o autor de "Direitos Humanos Fundamentais" (1ª ed. 1997, 11ª ed. 2016) não se incomodou. Sabe que a teoria na prática é outra. Continuou na linha de ação prepotente de desrespeito aos mais comezinhos direitos fundamentais, ao direito de manifestação e ao direito à integridade física e moral. E viu-se apoiado pela população, quando até a imprensa conservadora tecia ácidas críticas à sua administração. Da igualmente insuspeita Folha de São Paulo de 13 de janeiro do ano passado colhe-se o seguinte:

"O MPL (Movimento Passe Livre) criticou nesta quarta-feira (13) a ação policial que reprimiu o protesto contra o aumento da tarifa nos transportes da capital realizado nesta terça.
Em nota publicada nas redes sociais, o movimento afirmou: "A violência da polícia, que deixou mais de dez presos e dezenas de feridos, mostra a verdadeira política de Alckmin e Haddad: defender o lucro dos empresários a qualquer custo."
"Da mesma forma, defenderemos nosso direito à cidade e à manifestação. Se a polícia aumenta a repressão, aumentamos a resistência", afirmou o grupo.
O segundo ato expressivo contra a alta das tarifas de transporte foi marcado pela nova estratégia da polícia, que reprimiu a passeata com mais intensidade antes mesmo dela começar e de haver confronto com "black blocs".
O secretário de Segurança de São Paulo, Alexandre de Moraes, disse nesta quarta ter recebido "só elogios à atuação da polícia" para conter o protesto. Ele disse ainda que o governador Geraldo Alckmin (PSDB) achou "ótima a alteração da estratégia" para conter os manifestantes.
O secretário afirmou que a polícia continuará a tipificar as prisões de manifestantes como dano ao patrimônio público, como agressões e, em se tratando de "black blocs", o "manifestante será tipificado como organização criminosa".
Segundo Moraes, desde 2013 a polícia dispõe de imagens, de dados da internet das manifestações que vão ajudar a "constituir em uma organização criminosa que quer o vandalismo, que quer depredar e atacar a polícia".
A polícia decidiu bloquear a avenida Paulista e revistar manifestantes antes do começo do protesto e impedir que eles avançassem pela avenida Rebouças. Após empurra-empurra, lançou bombas de gás, o que acabou dividindo os grupos por diferentes ruas e provocando correria. Questionado sobre críticas a seu trabalho, Moraes afirmou: "Até agora, por parte da população, só elogios à atuação da polícia"."

Para quem é apoiado por sítio de pornografia política, dá para imaginar quem são esses indivíduos que lhe fizeram os tais "elogios à atuação da polícia"!

Não só a autocrítica não parece ser o forte de nosso Narciso, ora ministro. Tem-se em alta conta. A última bolacha do pacote. E muito mais haveria de contar a respeito, para mostrar cabalmente sua falta de vocação para o serviço público, sua pequenez diante das exigências das funções que lhe foram temerariamente cometidas. Se quisesse estender o assunto, bastaria cavar no Google.

Ao que tudo indica, administrar o dia-a-dia da pasta não é com ele. Em agosto suspendeu todas as ações do ministério por noventa dias e em dezembro prorrogou a suspensão por mais noventa dias, até março de 2017. Refugiados? - Tanto faz. Consumidor? - Sossega o facho! Cooperação jurídica internacional? - Deixa isso com o MPF! Entorpecentes? - Vamos capinar maconha! Estrangeiros? como é que é? Anistiados? - Deixemos esse assunto morrer! Polícia federal? - Opa, vamos conversar! Arquivo nacional? - O que? Você queria dizer “salas-cofre”? Sistema penitenciário...? Ah, o sistema penitenciário!

O derradeiro episódio protagonizado pelo Sr. Moraes parece ser a gota d'água. Nele, o "ministro" deu com os burros n'água.

É sempre bom lembrar que crises penitenciárias no Brasil escravocrata são recorrentes. Essa não é culpa do Sr. Moraes. É culpa de nossa mentalidade retrógrada, que vê no preso o lixo da sociedade, a merda a ser decantada num reservatório de estação de tratamento de esgoto. Somos incapazes de ver no outro mais fraco, por mais que erre, nosso par e concidadão. Constituímos uma sociedade cada vez mais despida de empatia.

Direitos humanos? Não para bandidos! Só para nós. O Brasil torna-se um país em que o filho pródigo não é acolhido pelo pai. É depositado por seus pais e irmãos desnaturados nas masmorras ou entregue aos esquadrões da morte. Não temos compaixão nem pela família do errante! O errante paga contribuição social que garante a seus entes queridos pensão em caso de morte e em caso de incapacitação para o trabalho, aí incluída a hipótese da sua prisão. Mas nossos escribas e fariseus querem que a família morra de fome, ignorando preceito constitucional que veda ultrapasse a pena a pessoa do inculpado. Esquecem-se que o pagamento da pensão não é favor, mas obrigação pactuada ex lege.

Claro que numa sociedade há séculos governada, quase sempre, pelos escribas e fariseus o massacre do lixo humano não tem nada de mais. "Não tem nenhum santo" entre os massacrados, disse o governador do Amazonas sobre os concidadãos trucidados na sua penitenciária.

Os governos dos últimos 13 anos antes do golpe de 2016 fizeram uma diferença, sim. Mas nunca conseguiram aplacar a ira dos fariseus e escribas, que promoveram, contra seus agentes, perseguição implacável, seja pela mídia, seja pela justiça, seja pelo estamento político. Não se conformaram com a subida dos que consideravam "pecadores" ao poder. Fariseus e escribas sempre viveram no self-understanding de que pecar é algo que só se faz ao abrigo de suas leis. E estas são as leis da hipocrisia, do disfarce, do engodo e, quando necessária para garantir seu status quo, da violência também.

Foram os governos dos últimos 13 anos que nos trouxeram a política mais inclusiva desde o "descobrimento" do Brasil, cheia de falhas e, muitas vezes, sob severas limitações de sua impotência. Mas esses governos construíram cinco penitenciárias federais para abrigar líderes de facções sob regime de segurança diferenciado. Repassaram rios de dinheiro aos estados para o aumento de vagas no sistema. Passamos a ter nacionalmente um índice relativamente baixo de 1,67 de superpopulação carcerária, o que significa que a cada vaga correspondem 1,67 apenados. Esse índice nos coloca mundialmente em 38° lugar em superpopulação carcerária - distantes do ideal, mas igualmente distantes da posição de lanterninha.

O que o Sr. Moraes não se deu ao trabalho de estudar é que o problema central do sistema nem é tanto de vagas, mas de excesso de demora em investigações e instrução criminal que faz com que 40% dos nossos presos não tenham ainda condenação transitada em julgado. Em muitos rincões do país a prisão pré-processual é regra e não exceção, sobretudo quando se lida com os mais fracos e desassistidos. Para eles, a presunção de inocência não vale nada. A prisão preventiva passa a ser a forma de antecipação da pena numa justiça que não merece esse nome, porque tarda e falha por seletividade.

Ademais, temos um sério problema de gestão penitenciária. Desde sempre. A sociedade não gosta de investir no "lixo" social. Acha que é dinheiro jogado fora. Há autoridades que gostam de apontar para o truísmo de que um preso custa 13 vezes mais do que um aluno no ensino público. A comparação é demagógica. É como dizer que o Brasil não devesse estar no Haiti, porque lá gasta em ação humanitária mais do que na segurança pública de muita cidade grande conflagrada. É uma mania de ficar comparando hélice de navio com piano de cauda, âncora com berimbau ou trilho com picolé! São ações que tem entre si tanto em comum quanto os glúteos com as calças.

Em qualquer país do mundo, preso é mais caro que aluno, assim como uma âncora de petroleiro é mais cara que um berimbau de roda de capoeira. Se o sistema leva a sério sua missão, o apenado é um aluno em condições especialíssimas, num curso de re-viver. E gastamos pouco com eles, porque em Pindorama se convencionou que prisão é só um amontoado de tijolos, cimento e ferragens. Lá se soca gente até não caber mais. É como fazer a mala jogando infinitas roupas e utensílios nela e depois, para fechar, pular na tampa, deixando à mostra, nas bordas, partes de meias, cuecas e calcinhas.

Prisão, na contemporaneidade, é muito mais que uma masmorra. É, nas nações civilizadas, um conceito complexo. A pena não expia. Não se trata de retribuir o mal pelo mal. A retribuição, diria o penalista alemão de saudosa memória, Winfried Hassemer, é como dar um chute num móvel que nos causou dor quando nele esbarramos. O móvel continuará lá. Imóvel, se não inamovível. Por isso, punir só faz sentido olhando para o futuro. Fala-se, então, em funções preventiva geral e preventiva especial do direito penal. O escopo é buscar que o crime não se repita. Por isso, estatui-se um exemplo para a sociedade (o efeito dissuasório, em alemão Abschreckung), de eficiência do aparato persecutório, deixando clara a mensagem de que quem delinqüe paga. Já no campo individual, esforça-se o Estado por ensinar ao apenado a levar uma vida digna. Reabilita-o, cuida de suas feridas n'alma e procura dar-lhe uma nova chance. Estar privado de liberdade é a punição maior. Entrega, o apenado, parcela do seu tempo de vida ao Estado, como diria Foucault, para que seja bem aproveitado em favor da inclusão social. Estigmatizar não ajuda em nada esse processo, porque causa resistências à sua implementação.

Por isso os países mais adiantados nessa agenda garantem acomodações individuais a quem tem mais de um ano de pena a cumprir. Lá, o preso recebe roupa limpa, de cama e pessoal, e é estimulado ao asseio. Em muitas penitenciárias costuma-se entregar-lhe um cartão magnético que permite a circulação limitada no estabelecimento, de acordo com seu grau de progressão disciplinar. Ocorrendo um motim, todos os cartões são instantaneamente cancelados e o preso fica onde está, mapeado por sistema de rastreamento feito pelo cartão. Isso, é evidente, facilita táticas antimotim.

Mas, no nosso Brasil, estamos longe disso. Temos toda a tecnologia, mas achamos que gastar com ela não é prioridade. Não temos cursos de arquitetura penitenciária nem escola de gestão de estabelecimentos prisionais. Construímos prisões novas, de padrão velho. Algumas ficam baldias, pois os estados estão sem dinheiro para realizar concurso, contratação e treinamento de agentes penitenciários. Por isso sugeri a criação de uma Escola Nacional de Gestão Penitenciária e de um sistema único de distribuição de vagas, para equilibrar a lotação nos estabelecimentos. Infelizmente não foi possível levar a ideia adiante. O golpe não deixou.

Transferir recursos para construção de novas penitenciárias é uma solução simplória. Talvez o Sr. Moraes devesse ler o relatório do INFOPEN 2014, obra da dedicada equipe do Doutor Renato Vito, publicada na minha gestão. Tem dados que demonstram claramente o que foi dito aqui. Mas, quando se glorifica a violência e se recusa a compaixão com as brasileiras e os brasileiros que perderam seus entes queridos num massacre quando estavam sob a custódia do Estado, e quando se mente para fugir da responsabilidade, falar e mostrar o que pode resolver não basta. É preciso gritar para ser ouvido.

Por isso, Sr. Moraes, saiba que não me fará calar. Tenho responsabilidade para com nossa sociedade como derradeiro Ministro da Justiça de um governo legítimo, derrubado por um arrastão de trombadinhas que queriam reimpor a política ímpia dos escribas e dos fariseus. Na próxima comichão insopitável de me intimidar e cassar a palavra dita no livre direito de crítica e manifestação, pense três vezes. Responda com argumentos ou se recolha. A "porrada" aqui não cola, pois papai e mamãe, que nunca precisaram me dar palmadas no bumbum, me ensinaram que quem usa a inteligência usa a boca, e quem dela é desprovida usa o punho.

quarta-feira, novembro 23, 2016

Jurista que “puxou a orelha” de Moro em audiência é sumidade entre criminalistas



O “puxão de orelha” que recentemente viralizou nas redes sociais como a mais tensa audiência da Lava Jato encabeçada pelo Juiz Sérgio Moro trouxe ao conhecimento do público um respeitado conhecido do Direito Penal no país: Juarez Cirino dos Santos.

Professor Titular de Direito Penal da Universidade Federal do Paraná, Cirino destaca-se como pioneiro e maior nome da Criminologia Radical, a qual relaciona o crime e controle do Estado como processos estruturais e institucionais decorrentes do capitalismo e a relação entre explorador e explorado. Seu livro “Curso de Direito Penal” é aclamado pela academia como uma das grandes obras já produzidas pela intelectualidade brasileira.

“O melhor Curso de Direito Penal já escrito. Sim, de todos os tempos. Sim, em todo o mundo. “O” livro que você precisa, mas pode chamar de bíblia dos criminalistas críticos. É antes/depois de Cirino (aC/dC)” – exaltou nas redes sociais o Professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo, Maurício Stegemann Dieter, sobre o livro escrito por Cirino sobre o Direito Penal Crítico.

Cirino representa o ex-presidente Lula, ao lado dos advogados Cristiano Zanin Martins e José Roberto Batochio, na ação que discute o apartamento no Guarujá. Os outros dois advogados também tiveram falas de destaque na discussão com o magistrado.

Ao fim da discussão, meio jurídico exalta Cirino

A discussão entre Cirino e o Juiz Federal foi sobre as perguntas do magistrado às testemunhas que iam além da acusação. No Processo Penal, tanto acusação, quanto a magistratura estão limitados aos fatos descritos na denúncia, que é um documento processual que descreve do que a pessoa está sendo acusada. A restrição à acusação inicial é conhecida como princípio da correlação.

Ao ser interpelado por Cirino pela “fuga” do tema, Moro apenas retrucava dizendo que poderia sair da correlação pois “há um contexto”. “Mas qual é o contexto? Só existe na cabeça de vossa excelência. O contexto, para nós, é a denúncia” – retrucou o Professor e Advogado.

“O que houve é que ele não se limitava a esclarecer as perguntas feitas às testemunhas, mas queria trazer fatos novos, que não tinham sido objeto de denúncia ou de depoimentos e, por isso, ele violava os princípios do contraditório e da ampla defesa” – explicou Cirino na saída do julgamento. 

O episódio circulou nas redes sociais e foi muito bem recebido pelo meio jurídico. Uma aula de resistência ao autoritarismo, afirmou o Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Salo de Carvalho.

Já o Professor da PUC/RS, Aury Lopes Júnior, também destacou o trabalho de Cristiano Zanin e Batochio ao lado de Cirino – “três grande advogados e reconhecido juristas em ação: Cristiano Zanin Martins, Juarez Cirino Dos Santos e José Roberto Batochio. Mostrando como ser combativo, sem perder a postura e a dignidade, e não pactuar com a prepotência. Pena que quando falta autoridade no argumento, sobram argumentos de autoridade, culminando com um corte do microfone. Mas nada disso cala uma defesa competente”.

Coluna no Justificando

Cirino assina uma coluna no Justificando, onde publica artigos sobre direito criminal e atualidades. No seu último artigo, o Professor destacou a transferência da política tradicional para a Vara Federal de Curitiba onde ele travou o caloroso debate:

A estratégia política das classes dominantes, percebida como alternativa real de reconquista do Poder Executivo, é a novidade da luta de classes na sociedade brasileira: a possibilidade de deslocar o cenário de campanha política das praças públicas para alguns órgãos da justiça criminal brasileira – ou melhor, a transferência dos tradicionais comícios populares em palanques públicos para o espaço judicial monocrático da 13ª Vara Federal Criminal do Juiz Sérgio Moro, de Curitiba – escreveu.

quarta-feira, maio 04, 2016

Para quem reclama do Bolsa Família, mas se cala sobre o auxílio-moradia

Com protesto ao lado, morador de rua dorme na Praça dos Martírios, em Maceió, no dia 12/11/2015. Foto: Karina Dantas/G1.

Dica do Jornal GGN.

Dois defensores públicos federais de Porto Alegre ajuizaram uma ação que pede auxílio-moradia para a população de rua de todo o país, alegando que o custo financeiro seria igual ao valor destinado para o mesmo propósito para membros dos poderes da República. "Se o Estado tem condições de dar moradia para quem já tem casa, por que se omite para quem não tem?", afirma Géorgio Carneiro, um dos autores da ação.

Segundo o defensor, o custo estimado para garantir moradia para as 48.620 pessoas que vivem em situação de rua no país seria de cerca de R$ 438 milhões ao ano. Em comparação, o crédito liberado para custear o auxílio-moradia a juízes estaduais e federais, desembargadores, ministros, membros do Ministério Público federal e estadual, além de membros do Legislativo, ultrapassa os R$ 419 milhões.

"Já existe uma lei federal prevista, de 2005, que garantiria um subsídio para quem não tem capacidade de pagamento de moradia, mas essa legislação nunca foi cumprida", diz Carneiro. Na proposta, seria ofertado um valor de R$ 750 mensais por meio de um cartão cidadão, a exemplo do Bolsa Família. Leia mais abaixo:

Do Zero Hora

Defensores públicos pedem auxílio-moradia a todos moradores de rua do país 

Ação sustenta que o custo para a União seria semelhante ao pago para o mesmo propósito a membros dos poderes da República 

Uma ação ajuizada por dois defensores públicos federais de Porto Alegre há poucos dias tem causado grande repercussão dentro e fora do meio judiciário. A ação pede auxílio-moradia à população de rua de todo o país, sustentando que o custo financeiro seria similar ao valor pago para o mesmo propósito a membros dos poderes da República.

— Se o Estado tem condições de dar moradia para quem já tem casa, por que se omite para quem não tem? — questiona um dos autores da ação, o defensor público federal Geórgio Endrigo Carneiro.
Na inicial, são réus a União, o Estado do Rio Grande do Sul e o município de Porto Alegre. Conforme Carneiro, o custo calculado para "garantir um bem fundamental à população" seria relativamente baixo. Ele estima que, para dar moradia às 48.620 pessoas que vivem nas ruas do país seria necessário a União gastar cerca de R$ 438 milhões por ano. 

O crédito liberado para o pagamento de auxílio-moradia a juízes estaduais e federais, desembargadores, ministros, membros do Ministério Público federal e estadual, além de membros do Poder Legislativo, conforme medida aprovada em janeiro deste ano, é superior a R$ 419 milhões.

— Já existe uma lei federal prevista, de 2005, que garantiria um subsídio para quem não tem capacidade de pagamento de moradia, mas essa legislação nunca foi cumprida. Se tivesse sido, talvez esse problema não existisse ou não fosse tão grave — explica Carneiro.

Na proposta, seria ofertado um valor de R$ 750 mensais por meio de um cartão cidadão, a exemplo do Bolsa Família, condicionado à matrícula e à frequência escolar e à prestação de horas semanais de serviços à comunidade. Além dessas condicionantes, a medida sugere a apresentação mensal dos recibos de pagamento pelo serviço de moradia, para monitorar e fiscalizar o uso dos recursos.

Números defasados

A quantidade de moradores de rua utilizada para o cálculo da ação é baseado em um cadastro único de pessoas em situação de rua do site do Ministério do Desenvolvimento Social, explica Carneiro. São aqueles que hoje acessam algum serviço de assistência social e que se autodeclaram "em situação de rua". Esses números, entretanto, podem estar defasados, já que parte desta população não busca esse tipo de serviço.

Em Porto Alegre, o último censo dos moradores de rua da Capital, feito por coleta de dados, foi concluído em 2011. O novo está sendo realizado neste ano, mas só deve apresentar os resultados no final do segundo semestre.

O sociólogo Ivaldo Gehlen, um dos dois professores da UFRGS responsáveis pelo novo levantamento, explica que, há cinco anos, havia 1.347 adultos morando na rua em Porto Alegre, mas que provavelmente esse número aumentou significativamente. Gehlen vê com bons olhos a medida proposta, mas também com cautela:

— Este é um tema muito polêmico, pois essa população tem diferentes interesses, histórias. Alguns estão há pouco tempo na rua, outros há mais de duas décadas. Não é uma população amorfa, tem lideranças, é ativa. Muitos deles não querem morar em casas como as nossas — explica.

É o que defende também o presidente da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), Marcelo Soares, que destaca ainda a necessidade de uma discussão sobre quem irá bancar os custos de uma medida como essa:

— Se tivermos por parte do governo federal subsídios para implementar essa ação, iremos avançar muito. Enquanto política pública, a questão habitacional é fundamental no processo de mudança e construção de um novo cenário. Mas não podemos deixar de lado a importância de reforçar o acompanhamento a essa população. Só entregar uma chave de casa não é a saída.

Para Carneiro, a preocupação imediata é dar as condições básicas para a população que vive, hoje, em extrema pobreza:

— Também acho que não é sustentável dar somente moradia a essa população. Eles precisam ir ganhando autonomia com o tempo. Mas acredito que este seria um primeiro passo, um passo inicial para uma série de mudanças.

Questionado sobre a disponibilidade de moradias a esta população, Carneiro afirma que, em levantamento preliminar feito em Porto Alegre, foram identificadas mais de 2 mil unidades para locação na faixa dos valores propostos:

— Sem falar que nas comunidades há pessoas que locam peças das casas, então acredito que este não seria um problema nem aqui nem em outras cidades. Este seria, sim, o início de uma solução — finaliza.

Outras ações

Medidas semelhantes já foram tomadas tanto a nível municipal como estadual em diversas regiões do país, mas esta é a primeira vez que uma ação pede o auxílio em âmbito nacional. Em Belo Horizonte, por exemplo, o programa Bolsa-Moradia, que concede um benefício mensal de R$ 500, está disponível para cerca de 16% da população de rua.

Já em Porto Alegre, desde o ano passado, o programa Atenção Pop Rua passou a fornecer, entre outras medidas, 50 cotas mensais de aluguel social no valor de R$ 500. Esse contingente beneficia, entretanto, menos de 4% da população de rua da Capital. Além disso, hoje 3% das unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida são destinadas à moradores de rua na Capital.

Nesta nova ação, consta o pedido para que as partes rés, em especial a União, se posicionem no prazo máximo de 20 dias.

O Ministério das Cidades, responsável pela questão habitacional, afirmou, por meio da assessoria de imprensa, que só irá se manifestar quando tomar conhecimento da ação. 

segunda-feira, novembro 09, 2015

Ajude: Blogueiro foi condenado a pagar multa de R$200 mil por divulgar uma pesquisa eleitoral



Manifesto Nacional dos Blogueiros, Comunicadores e Internautas “Eu Tarso pela Democracia”

A Constituição Federal de 1988 assegura a liberdade de expressão e a proibição de confisco por parte do Estado. Mesmo assim, o Poder Judiciário eleitoral aplicou duas multas no valor total de R$ 106.410,00 ao advogado, professor universitário e blogueiro, Tarso Cabral Violin, pela publicação no seu Blog do Tarso de duas simples enquetes durante as eleições para prefeito de Curitiba em 2012. Já em Dívida Ativa da União e em processo judicial de execução, Tarso terá que pagar aproximadamente o valor atualizado com juros e multas de R$ 200 mil nos próximos dias. Mais informações no site “Eu Tarso pela Democracia”.

Independentemente das posições jurídicas, políticas e ideológicas de Tarso, entendemos que essas multas são totalmente desarrazoadas para uma pessoa física que não se utiliza de seu blog para fins financeiros, mas apenas como um espaço de cidadania e discussão sobre a Política, o Direito e a Administração Pública, para exercer o controle popular do Estado e lutar pela liberdade de expressão e democratização dos meios de comunicação.

Tarso Cabral Violin é advogado em Curitiba, professor de Direito Administrativo e palestrante em diversas instituições, mestre em Direito do Estado e doutorando em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Paraná, autor do livro “Terceiro Setor e as Parcerias na Administração Pública: uma análise crítica”, já na 3ª edição (Fórum, 2015), é membro da Comissão de Estudos Constitucionais e da Comissão de Gestão Pública e Controle da Administração da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Paraná, Vice-Coordenador do Núcleo de Pesquisa em Direito do Terceiro Setor da UFPR, ex-presidente do Centro Acadêmico Sobral Pinto (Direito PUCPR), presidente da Associação dos Blogueiros e Ativistas Digitais do Paraná – ParanáBlogs e autor do Blog do Tarso. Veja seu currículo Lattes aqui.

Assinamos o presente manifesto em apoio à liberdade de expressão e à Democracia, com o intuito de convocar todos os colegas blogueiros, comunicadores, internautas, ativistas digitais, professores e estudantes a contribuírem financeiramente e divulgarem o financiamento coletivo “crowdfunding” (clique aqui) para arrecadação dos fundos para pagamento dessas multas. Caso haja sobras, após a campanha, o dinheiro será investido na defesa da liberdade de expressão e da Democracia.


terça-feira, setembro 22, 2015

Assassinos condenados ano passado já querem liberdade. A justiça paraense vai permitir?



A Amazônia brasileira é a região mais violenta do mundo contra ambientalistas, defensores do meio ambiente e contra quem luta pela reforma agrária, segundo um relatório recente da organização Global Witness. E o Pará, principalmente o Sul e Sudeste do Estado, os maiores focos de violência. A lista de assassinatos de lideranças políticas é longa, e praticamente toda marcada pela impunidade. 

Em Maio de 2014, dois mandantes dos assassinatos de cinco trabalhadores rurais, no caso que ficou conhecido como ‘Chacina da Fazenda Princesa’, foram condenados e a pena fixada para cada réu foi de 130 anos de reclusão.

O crime aconteceu em 1985 e o caso ficou muito conhecido pela brutalidade das mortes. Os camponeses foram sequestrados, torturados, assassinados e seus corpos amarrados em pedras para serem jogados no fundo do Rio Itacaiunas, próximo da cidade de Marabá, no Estado do Pará.

As torturas levaram mais de dois dias, antes de serem desferidos vários tiros. Os corpos mortos foram amarrados uns aos outros, e em pedras no fundo do rio. Crueldade semelhante dos pistoleiros que mataram Sebastião Pereira e seu filho Clésio, de apenas três anos, na cidade de Jacundá, também no Estado do Pará, ambos com um tiro na cabeça, na frente da família, na mesma época. 

Ou o pistoleiro que retirou o capacete de Zé Cláudio para, com uma faca de cozinha, cortar-lhe a orelha enquanto ainda respirava. Ou os seis tiros desferidos contra irmã Dorothy Stang, em Anapu-PA, também por ali, na Transamazônica

Nesses crimes brutais não se trata apenas de eliminar aqueles que são empecilhos para se ganhar dinheiro destruindo a Amazônia, mas em praticar o crime com extrema crueldade e violência, para que sirvam de exemplo em um ambiente de terror.

Pela conhecida e nefasta lentidão da justiça paraense, um dos fazendeiros responsáveis pelo massacre, passou 20 anos foragido e só foi preso em 2013, porque tentou fugir do país e precisou passar na Polícia Federal para tirar seu passaporte. Em 2006, o criminoso já havia sido preso pela mesma PF, em São Paulo, com nome falso. 

Marlon, ficou 4 anos e 8 meses em reclusão até que, em agosto de 2011, o STJ mandou soltá-lo, alegando demora da Justiça Paraense em levá-lo a julgamento. 

Com isso, a defesa dos assassinos entrou com recursos e o caso enfrentou 4 anos nas gavetas do Tribunal de Justiça do Pará. Uma demora sem qualquer justificativa. Era o argumento que a defesa de Marlon esperava e precisava para pedir sua liberdade com fundamento no "excesso de prazo de sua prisão."

"A impunidade é como uma licença para matar", diz o advogado da Comissão Pastoral da Terra em Marabá, José Batista Afonso. Batista é um nome de destaque na defesa dos direitos humanos no Brasil, e ele coordena as investigações para tirar das gavetas e levar a julgamento os principais crimes que as autoridades locais tentam esquecer da lei, mas utilizar para produzir um clima de terror", revelou a reportagem de Felipe Milanez, na Revista Carta Capital, à época do julgamento, que acabou condenando os dois mandantes da "Chacina da Fazenda Princesa".

No entanto, a defesa dos acusados recorreu em apelação ao TJE/Pa, contra a condenação e hoje (22), a partir das 08:30h, haverá o julgamento na sala de sessões da 1ª Câmara Criminal Isolada daquele tribunal e a SDDH, através do advogado Marco Apolo Leão, na condição de advogado representante das famílias dos trabalhadores rurais, acompanhará e sustentando a condenação legitimamente feita pelo Tribunal do Juri, aqui em Belém, no ano passado tentará manter a condenação dos bandidos.

A relatora da Apelação é a desembargadora Vânia Lucia Silveira e a revisora, a Desembargadora Maria Edwiges de Miranda Lobato.

A sociedade paraense está convidada a participar e impedir que a impunidade vença mais essa luta contra a violência no campo. 

Com informações da  advogada e coordenadora do PAJ/SDDHAnna Lins e de Felipe Milanez, da revista Carta Capital.

quinta-feira, julho 16, 2015

Polícia Federal admite que não consegue provar o que é propina e o que é doação de campanha



Por Paulo Moreira Leite, no Brasil 247.

O ponto essencial da Lava Jato ainda está para ser esclarecido, informa editorial da Folha intitulado "Doação ou Propina," publicado há dois dias.

Questão essencial numa investigação que teve início em 2006, o problema é tentar distinguir quem agiu dentro da lei e quem cometeu crimes. Não se sabe disso, ainda – nove anos depois das primeiras investigações da Lava Jato.

Não sou eu quem diz. Nem a Folha. É a Polícia Federal.  E é um fato tão surpreendente que permite entender porque, na falta de elementos reais para sustentar o que diz, a acusação já esteja apelando para a velha teoria do domínio do fato, conforme denuncia Renato Mello Jorge da Silveira, que é somente vice-diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

Vamos por partes. O jornal reconhece no editorial  que "em relatórios enviados ao Supremo Tribunal Federal, a Polícia Federal diz que, em alguns casos, dispõe de "elementos iniciais" a indicar que a doação eleitoral foi utilizada como forma de corrupção."

Além de reconhecer essa dúvida crucial, o jornal lembra  que a própria PF "ressalta a necessidade de aprofundar as análises."

Pois é assim, meus amigos.

Embora a oposição faça força para colocar o impeachment na agenda política – não conseguiu, mas não custa tentar – na vida real, quando é preciso encarar os fatos e as provas, a Polícia Federal não consegue sustentar uma denúncia. Fala que é preciso "aprofundar as análises."

Imagine quantas análises poderiam ser "aprofundadas"  sobre quaquer coisa: o PSDB, a Polícia Federal...

Há dúvidas, sim.

E você, que pensava que, na dúvida, a Justiça beneficia o réu. 

Nada disso.

"Prende-se primeiro para apurar depois," já observou, com amargura crescente, o ministro Marco Aurélio Mello.

Pois o jogo é este, ainda que seja um escândalo na consciência de toda pessoa que aprendeu que toda pessoa é inocente até que se prove o contrário.

Teria sido correto, do ponto de vista das pessoas acusadas e também do interesse do país, apurar e investigar em segredo, até que tudo estivesse esclarecido, certo? Não é isso o que se espera numa sociedade democrática?

Claro que não haveria o carnaval, nem seria sido possível usar denúncias da Lava Jato como um balão de oxigênio para uma candidatura geneticamente raquítica, vamos combinar.  

A dificuldade para distinguir o certo do errado, o legal do ilegal,  consiste em saber aonde se encontra a fronteira entre uma coisa e outra  quando se trata de financiamento de campanha de empresas privadas.

A realidade é que estamos falando de um universo promíscuo que prevê e autoriza a mistura interesses públicos e privados.

Embora o assunto seja uma eleição, o ponto essencial não é preferencia política, muito menos ideologia. Mas dinheiro.

É essa a legislação em vigor no Brasil em 2014, em 2010, em 2006 – e ela acaba de ser confirmada pelo Congresso, não é mesmo?

Chego a achar graça quando leio a transcrição de diálogos – reconstituídos pela memória ativada de quem passou meses de cadeia que podem transformar-se em décadas em caso de pena integral – em tom dramático, que procuram incriminar quem pede e inocentar quem paga.

Estamos falando de quem negocia bilhões de reais, para cá e para lá. Dinheiro puro, sem ideologia. Vamos falar em cortesia e boas maneiras?  

O jogo sempre foi este e é para ser este: pedir e prometer, pagar e esperar. É assim na campanha. Depois da contagem dos votos, a situação se inverte. Quem pagou se faz de difícil e ameaça atrasar a obra diante de qualquer dificuldade – que pode ser inventada. Quem está no governo precisa se virar para não perder prazos nem ser denunciado como suspeito.

Eu acho errado, do ponto de vista político. Implica em negar a democracia como aquele regime no qual um homem=um voto. Também é absurdo, quando se pensa na imensa força que grandes grupos econômicos adquirem nos assuntos de Estado. Mas é o jogo, a lei.  Ela não veio para esclarecer, mas para confundir.

É assim nos Estados Unidos, onde vigora a legislação que serve de modelo à brasileira. Lá, e aqui, o que se quer  é construir um toma-lá-dá-cá autorizado.

É uma conversa que pode ser tão perigosa e constrangedora que, nas convenções partidárias dos partidos políticos norte-americanos, grandes empresas pagam dezenas de milhares de dólares só pelo direito de sentar-se, num ambiente a meia-luz, no qual não é possível reconhecer quem senta-se a mesa ao lado, apenas para falar de contribuições eleitorais e investimentos de campanha.

Nessa situação, onde é difícil provar o que se diz, não surpreende que tenha surgido, na Lava Jato, uma versão da conhecida teoria do "domínio do fato", que serviu para justificar condenações sem prova na Ação Penal 470.

Quem explica é Renato Mello Jorge Silveira, professor titular de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade de S. Paulo, vice-diretor daquela instituição.

"O fim, que nunca justifica os meios, agora se equivoca também em suas premissas," escreve o professor, num texto obrigatório, intitulado O Ilegítimo e o Ilegal, onde sustenta que as duas qualificações cabem à Lava Jato.

O professor mostra que as acusações contra empresários não se sustentam sem a cumplicidade de quem ouve o argumento, pois faltam provas consistentes para sustentar o que se diz. Diz o professor que, para sustentar uma acusação contra executivos e sócios de empresas denunciadas, "basta afirmar que não tomaram "qualquer providência" no sentido de que impedir o resultado supostamente criminoso, o que já seria  " indicativo do envolvimento da cúpula diretiva."  Citando documentos da acusação, observa que chega-se a dizer que "parece inviável" que o esquema criminoso "fosse desconhecido pelos presidentes das duas empreiteiras".

A suposição lastreada, em tese, no papel dos dirigentes presume um dever de vigilância que beira um Direito Penal da omissão, o qual se mostra para além do ilegítimo. Enfim, parece pretender-se utilizar, na busca de uma punição antecipada, recursos que, sozinhos, são carecedores de legitimidade."

MP pede quebra de sigilo bancário e fiscal do prefeito de Ananindeua

O blog recebeu o processo de número  0810605-68.2024.8.14.0000,  que tramita no Tribunal de Justiça do Esado do Pará e se encontra em sigilo...