O dado impacta: já há mais de 2 bilhões de pessoas conectadas  às redes sociais eletrônicas, quase um em cada três habitantes do  planeta. A cada minuto, milhares de novos internautas ingressam no  circuito tecnológico da informação, enquanto a assinatura de telefones  celulares já passa da marca de 5 bilhões. O mundo está plugado.
O  fenômeno suscita estudos, debates e análises nas frentes de pesquisas  sobre comportamento social, mas um aspecto chama a atenção pela  importância que passa a ter para o desenvolvimento político das Nações.
A  questão assim pode ser posta: a Era da Informação Total, caracterizada  pela interligação das comunidades mundiais, por meio das infovias da  web, contribuirá para o aperfeiçoamento da democracia?
Ou, se  quisermos puxar a questão para o território brasileiro, o que significa a  existência no país de 45 milhões de internautas, numero que lhe confere  posição destacada no mapa mundial das redes?
Poderemos contar com  a melhoria dos padrões políticos, na hipótese de que parcela acentuada  do eleitorado começa a socar os primeiros tijolos de uma democracia  participativa plugada na eletrônica?
Vale recordar, de início, que  a política, desde eras remotas, acompanha os fios da comunicação. Um  ente se agarra ao outro, na extraordinária simbiose que amalgama o poder  da palavra e a força das ideias.
Na antiguidade, os ideários  fluíam pelo gogó e gestual dos governantes, rito de que são ícones Demóstenes (384-322 A C.), político que venceu a gagueira forçando-se a  falar com seixos na boca, tornando-se o maior orador grego, e Cícero  (106-43 A.C.), advogado e mestre de civismo, famoso também pelo discurso  contra o conspirador Catilina e considerado o maior orador romano.
Da  Ágora, a praça central de Atenas, e do Fórum romano, o discurso  político avolumou-se, saindo do Estado-Cidade para o Estado-Nação, e  agregando força na esteira dos ciclos históricos da comunicação: a era  Gutenberg no século XV (a descoberta da imprensa, 1440/1550), a Galáxia  Marconi (a invenção do rádio, em 1896), que impulsionou a escalada de  demagogos como Hitler e Mussolini, até chegarmos ao Estado-Espetáculo,  adornado com as luzes televisivas, a partir dos anos 60 e com a imagem  esbelta de John Kennedy.
Nesse ciclo, a estética se impõe à  semântica e os atores políticos passam a incorporar elementos dramáticos  ao desempenho, redundando não raro em performances mirabolantes com a  finalidade de cativar e mobilizar as massas.
A política no Estado  Moderno ganha operacionalidade com a implantação do governo  representativo pela constituição francesa de 1791 (“os representantes  são o corpo legislativo e o rei”) e o corpo social faz-se representar  por um grupo de pessoas que passam a agir de acordo com a “vontade  geral”.
O modelo, porém, começa a receber questionamentos. A  crítica era de que o sufrágio universal não teria sido capaz de melhorar  a condição de vida de milhões de pessoas. Lançava-se ali a semente da  representação de grupos específicos, derivando daí a democracia de  grupos e facções, de que são exemplo, na atualidade, os Estados Unidos.  Aí, o voto enraíza-se nas localidades, servindo de escudo de grupos e  setores.
É também de Bobbio a crítica de que a democracia não tem  cumprido suas promessas, entre elas, a educação para a cidadania,  justiça para todos e segurança social. Não sem razão, a democracia  representativa atravessa tempos continuados de crise, com o  desvanecimento de partidos e doutrinas, arrefecimento das bases,  declínio dos parlamentos, fatores que, em contraponto, contribuem para  fortalecer o Poder Executivo.
É dentro dessa moldura que se  encaixa a “civilização eletrônica”. No vazio entre o universo político e  a esfera social, emergem novos pólos de poder, a partir das entidades  de intermediação social, e ultimamente, das redes sociais.
O  portentoso aglomerado que navega na internet é um caleidoscópio do  pensamento social, particularmente de segmentos que trafegam no meio da  pirâmide (ou do losango, como já se descreve o formato da geometria  social brasileira). Encaixa-se na metáfora da pedra jogada no meio do  lago, criando marolas que se desdobram até as margens.
Não se nega  que a “sociedade eletrônica” vive a infância, época das primeiras  descobertas e da curiosidade. Banha-se de águas lúdicas. Daí não se  poder ainda falar de democracia participativa, eis que milhares de  internautas se valem das redes para enviar mensagens pessoais, postar  fotos, divulgar vídeos, baixar músicas, instalar aplicativos e até  namorar.
A matéria política, que aparece em conta gotas, indica  que o revigoramento do espírito público tem muito caminho pela frente.  Por enquanto não dá para apostar no “potencial revolucionário” das  tecnologias modernas da informação.
Se o engajamento político da  sociedade não adere à dinâmica das redes é porque a esfera  representativa também não tem sabido delas se utilizar. O forte da  tecnologia eletrônica é a capacidade de gerar interação entre elos do  sistema, políticos e eleitores. O que se observa, pelo menos no caso  brasileiro, é o uso da web para veiculação unilateral de mensagens, a  maioria de caráter autopromocional, a revelar o “chapabranquismo” de  nossa política.
Quando o sistema for usado em prol do jogo  interativo, poder-se-á acreditar numa base social envolvida com a  política. Essa, aliás, parece ter sido a intenção de José Serra ao criar  seu site. O tucano dispõe de tempo livre para fustigar as frentes do  governo. O risco é o de ficar confinado à gaiola individualista, que,  pelo menos até o momento, tem caracterizado a ação dos políticos  conectados ao sistema.
Dito isso, vamos à resposta para a questão  inicial: as redes sociais podem, sim, vir a melhorar os padrões da  política brasileira na medida em que seus participantes façam a lição de  casa. A começar pela maneira de entender e operar a tecnologia da  informação. Deitar nelas apenas para cochilar, pouco adiantará.
Gaudêncio Torquato, 
jornalista, é professor titular da USP e consultor político e de comunicação. Twitter @gaudtorquato